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Aramis

68, o ano que não acabou, numa visão dos húngaros

Há dois anos, quando Airto Moreira e Flora Purim fizeram uma tournée pelo Brasil, veio junto o produtor Dale Djerassi, que com dois câmeras filmou as apresentações do casal em várias capitais - especialmente em Curitiba, documentando inclusive o encontro de Airto com sua mãe, dona Zelinda, a irmã Maria, cunhado Douglas Godoy e os sobrinhos. O material destina-se a um longa metragem que Djerassi está produzindo conforme registramos, com exclusividade, na ocasião. Dale Djerassi aproveitou aquela visita ao Brasil para tentar comercializar, no circuito de 35mm, a sua produção "1968", realizada em 1987 e lançada em 1988 nos Estados Unidos com simpatia da crítica. Infelizmente, as negociações para a venda do filme no circuito não chegaram a bom termo mas a Look Vídeo, de São Paulo, comprou os seus direitos e lançou em vídeo selado, já há meses - mas sem aproveitar o potencial deste filme que foca a visão de um jovem imigrante nos Estados Unidos em 1968, "o ano que não terminou" como chamou o jornalista Zuenir Ventura em seu esplêndido best-seller (edição Nova Fronteira um dos livros mais vendidos nos últimos anos). Com o chamado "espírito de 68" - presente em filmes marcantes como "Zabriskie Point" de Antonione (rodado nos EUA), "A Chinesa" de Jean Luc Godard (no qual já antecipava os conflitos estudantis) e "Sem Destino" de Dennis Hopper - sem falar nas referências que "A Insustentável Leveza do Ser", de Philip Kauffmann, trouxe do romance de Milan Kundera, em relação a "Primavera de Praga" de 22 anos passados, o filme de Steven Kovacz, é uma produção mais modesta do que as outras citadas. Ex-integrante da equipe de Roger Corman - um dos mais ativos produtores-diretores na década de 60 - Kovacz alterna cenas de documentários com a ficção para localizar o seu personagem central. Zoltran Szabo, um imigrante húngaro com valores do Velho Mundo, em sua nova vida na América. O passado de Szabo na Budapest é lembrado por cenas da invasão da Hungria em 1956 por tropas do pacto de Varsóvia, com cenas de documentários - passando, a seguir para, 12 anos depois, em San Francisco, na época a cidade-templo da contracultura hippie. Ali, o casal de imigrantes tem uma ponte com os novos tempos através dos filhos Sandy e Peter. A primeira tem um namoro com um garoto que também é filho de imigrantes, mas sendo assim como ele, procura fugir do convívio exclusivo da "colônia húngara". Com Peter as coisas não são diferentes: estuda direito em Berkeley onde a mobilização estudantil é grande. Participa da política, faz campanha para Bob Kennedy e se envolve com grupos hippies que rondam a cidade. O roteiro - do próprio Kovacz - é repleto de elementos interessantes e referenciais a uma época que ainda necessita de muitas revisões. A trilha sonora, obviamente, utiliza hits da época como "Don't you need somebody to love?" (Jefferson Starship), "The Wind Cries Mary" (Jimmy Hendrix), "For What it's Worth" (Buffalo Springfield) e "The Midnight Hour" Wilson Pickett). Neil Young - nome famoso na época - participa numa ponta como Westy, o dono da oficina e revendedora de motos onde Peter trabalha e na qual são proibidas manifestações políticas ("Nossos fregueses só gostam de rock). Numa cena aparece um cineasta tcheco, Jan Nemec, mas que a exemplo dos atores centrais (Eric Larson, Robert Locke, Sandor Tecsi, Terra Vandergaw, Donna Pecora etc), é desconhecido no Brasil. O filme vale a pena ser visto. Especialmente para quem tem mais de 40 anos.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Nenhum
2
16/09/1990

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