Login do usuário

Aramis

Acertos e zebras na premiação do FestRio

Em absoluto, não pode-se dizer que o resultado foi zebra total: desde quinta feira, 26, quando "Out of Rosenhein" foi exibido na sessão para a imprensa, o filme alemão conquistou corações e mentes da imprensa - testemunhada pelos aplausos ao final. Igual reação ocorreu na sessão das 18 horas e a partir daí se passou a ter o filme dirigido por Percy Adlon como o grande favorito do IV Festival Internacional de Cinema, Televisão e Vídeo do Rio de Janeiro. No sábado, à tarde, confirmava-se: o filme que representou a República Federal da Alemanha foi o escolhido pelo júri oficial, como o melhor longa-metragem. Os outros favoritos - o israelense "Bouba" ("Boneca"), de Zeey Revah - além de diretor, cotado também para o Tucano de melhor ator -, e o espanhol "A Lei do Desejo", de Pedro Almodóvar, além do brasileiro "Sonho de Valsa", de Ana Carolina - tiveram que contentar-se com premiações menores. Almodóvar, que pela segunda vez consecutiva disputou o FestRio (no ano passado com "O Matador", malhado pela crítica), este ano conseguiu a simpatia de parte da imprensa e do público, que, insistiam em descobrir valores em seu dramalhão envolvendo gays numa história brega e com um final dramático. A sua escolha como melhor diretor, teve, assim, aplausos entusiásticos. Zebras mesmo foram as premiações de melhor ator e atriz - Denes Dobrei, pelo filme "Tolerância", da Hungria, e Wendy Hughes, do australiano "Um Vagaroso Trem Numa Noite Quente". Ausentes do festival, nem sequer tiveram suas fotos enviadas a tempo para constar do belo catálogo que o jornalista João Luís de Albuquerque coordenou e que, neste ano, saiu já no segundo dia do evento (no ano passado, só circulou no encerramento). "Warm nights on a slow moving train", contrariando o próprio regulamento do festival, foi exibido em versão original, sem legendas, o que mereceu protesto oficial de Roberto Farias, presidente do júri. Já "Tolerância" (Gondviselés), de Pal Erdoss, 40 anos, mostrando os problemas de um jovem desajustado, condenado à prisão devido a furtos - e as consequências disto em sua vida familiar, havia passado despercebidamente no último dia da competição, sexta feira, 27. Também na catálogo sequer constava na ficha técnica o nome do ator principal - Denes Dobrei, que acabou ficando com o Tucano de Prata Para o prêmio de melhor atriz havia muitas favoritas. Nacionalisticamente, um lobby com simpatia da imprensa foi armado em favor de Xuxa Lopes, pela interpretação da neurótica personagem de "Sonho de Valsa". As duas atrizes de "Longe de Rosenheim" poderiam até dividir o Tucano: a comunicativa preta Carol Christine Punder - que, artisticamente, prefere a abreviada forma de CCh (pronunciar-se cicieidje) Pounder, uma das presenças mais esfuziantes do festival e a alemã Marianne Saegebrecht, gorda, fellineana em seu tipo - mas extremamente humana na personagem Jasmin Munchgstettner, que como uma espécie de Anjo Conciliador (ao contrário do personagem central de "Teorema") traz a felicidade para um grupo de pessoas deslocadas que vive num motel numa distante localidade chamada Bagda, às margens de uma rodovia secundária num deserto americano. Zeev Revah, 47 anos, outra das personalidades mais simpáticas que vieram ao FestRio, também pintava como candidato tanto a melhor diretor como ator, pelo seu emocionante "Bouba", representando Israel. Com uma longa carreira no cinema (12 filmes, entre ator e diretor) e teatro, Zeev inspirou-se na história de um amigo ferido na guerra do Yon Kippur, há 14 anos, para contar a história de Bouba, um inválido de guerra, abandonado pela família, e que vive sozinho num ônibus abandonado num distante posto de gasolina. Em sua solidão, busca o entendimento e o amor - fazendo do encontro com Raquel, uma garota desempregada que sonha vencer um concurso de danças, sua última esperança. "Bouba" tocou os espectadores pelos seus personagens simples e um clima felliniano, merecendo, para alguns críticos, comparação a "Estrada da Vida". Portanto, a exclusão de "Bouba" na premiação oficial surpreendeu. Felizmente, o júri da Federação Internacional da Imprensa Cinematográfica, após muitas discussões entre seus membros - o brasileiro José Carlos Avellar (ex-diretor da Embrafilmes[Embrafime], crítico do "Jornal do Brasil"), o belga Marcelo Smeets, o suíço Félix Berger e o francês Robert Grellier premiou "Bouba", concedendo menção especial para "Out of Rosenheim". xxx Felizmente, há várias premiações paralelas ao júri oficial, de forma que sempre sobra premiações para quem não consegue os Tucanos. Ana Carolina, por exemplo, compensou sua frustração de perder na grande premiação ao receber o troféu "Pierre Kast", criado justamente para destacar o melhor filme nacional em competição. Já os jornalistas, através da Associação de Críticos Cinematográficos do Rio de Janeiro premiam o melhor dos filmes nacionais exibidos em qualquer das mostras realizadas durante o FestRio. E a escolha foi para "Ele, o Boto", de Walter Lima Jr. (já visto em Curitiba), enquanto a Associação Brasileira de Cineastas premiou com uma gravura do artista Hélio Oiticica a Paulo Sérgio Almeida, diretor de "Banana Split" - exibido na mostra "Panorama do Cinema Brasileiro" -, um filme nostálgico sobre as jovens do início dos anos 60. Também estas duas premiações foram discutidas: afinal refletiram mais uma vez, a divisão entre Rio-São Paulo, já que competiam para estas láureas obras bem mais sólidas em termos políticos, como "Fronteira das Almas", de Hermano Penna e "O País dos Tenentes", de João Batista de Andrade - cineastas radicados em São Paulo. xxx Buscando sempre valorizar os filmes que tragam temas e mensagens humanas e sociais, o júri da Associação Católica Internacional de Cinema premiou a "O Anjo da Guarda" (Andjeo Cuvar) filme húngaro no qual o diretor Goran Paskaljevic denuncia um grave problema existente na Europa: a venda de crianças ciganas para serem exploradas por marginais na Itália (hoje existem cerca de 20 mil crianças nesta situação). Sincero e humano, "Anjo da Guarda" tinha defensores inclusive para a premiação principal e ficou além do troféu da OCIC (que concedeu também menções honrosas ao checo "Paisagem Com Mobília" e a "Out of Rosenheim", também com o prêmio do Centro Internacional do Filme para a Infância e Juventude, que entre os curtas distinguiu a modesta mas tocante produção de Moçambique "Não Mataram o Sonho do Patrício", de Camilo de Sousa e Ismael Vuvo. Com apenas 5 minutos, em preto e branco, este curta, vindo de um dos países mais pobres da África mas que busca implantar uma indústria cinematográfica, relata a coragem do menino Patrício, que vítima de bandidos, perdeu os dois braços mas continua assistindo as aulas. xxx "Out of Rosenheim" ganhou ainda mais um prêmio: o troféu "Dom Quixote", da Federação Internacional de Cineclubes. Vaias demoradas foram dadas tanto aos convidados para entregar os prêmios especiais do júri - os presidentes do Banco Nacional e, especialmente o diretor-geral da Embrafilmes [Embrafilme] - como as escolhas feitas pelo júri oficial nesta categoria especial: para a produção russa "Kin-dzadza", de Gueorgui Danelia e o representante da China Comunista, "A Última Imperatriz", de Chen Jilian e Sun Qungguo (este dando, uma visão limitada ao mesmo personagem que Bernardo Bertolucci focalizou no magnífico "O Último Imperador", o filme que encerrou o FestRio). xxx Outra menção especial do júri foi bem recebida: "Memória Viva", longa-metragem de Octávio Bezerra - em nossa opinião o mais importante filme exibido no FestRio e que comentaremos no final da semana. Para os curtas, também houve justiça, com a premiação ex-aecquo do canadense "A Hora dos Anjos" e do brasileiro "Cidadão Jatobá", de Maria Luiza Aboim. Mas sobre estes - e mais os premiados em vídeo e televisão - amanhã tem mais.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
01/12/1987

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br