Login do usuário

Aramis

Aldo Laval, o último dos idealistas

Se idealismo, coerência e vontade de servir podem sintetizar a vida de um político, Aldo Laval, 85 anos completados na quarta-feira, 28 - é um exemplo maior. Um dos 9 sobreviventes da Constituinte de 1946, Laval é aquilo que se pode chamar de o último dos idealistas, capaz de, com seus (poucos) recursos pessoais manter uma instituição que criou há quatro décadas - a Fundação Casa do Trabalhador - ou, ainda acreditando na justiça, não esmorecer perante tantos pareceres contrários e buscar ainda recursos para restituir a Cooperativa Mista dos Servidores do Estado um valioso patrimônio que, mesmo com toda sua luta, foi encampada pelo Estado há quase 30 anos. Gravando um depoimento para série Memória Histórica do Paraná, patrocinada pelo Bamerindus, Aldo Laval, uma energia e lucidez que o faz diariamente cumprir um expediente na Fundação Casa do Trabalhador (Rua XV de Novembro, 570), cuja sobrevivência deve-se exclusivamente ao seu sacrifício pessoal - mantendo-a com recursos próprios uma instituição criada pela lei 603 de 27 de janeiro de 1951, reclamou que com exceção dos governadores Moyses Lupion e Bento Munhoz da Rocha Neto, nunca obteve qualquer apoio oficial, "apesar do muito que fez - e que poderia continuar a fazer, se houvesse a mínima compreensão". xxx Paranaense de Ponta Grossa, órfão ainda criança, criado pela avó materna, Aldo Laval começou a trabalhar em seus verdes anos. Recorda que uma notável professora, Esther Ferreira Ribas, foi fundamental em sua educação, ajudando-o a suprir a falta de cursos regulares para tornar-se um contador provisionado, profissão com a qual manteve sua família por mais de 40 anos. Integrado a lutas classistas, seria um dos fundadores do Centro Operário Cívico dos Trabalhadores de Ponta Grossa, fazendo parte também do ativíssimo Centro Operário Leon Trotski. Assim, quando houve a redemocratização em 1945, seu nome surgiu espontaneamente como o mais forte candidato a representar a região de Ponta Grossa na Constituinte. Mesmo sendo um homem humilde, sem maiores recursos, encontrou um apoio tão grande nos vários círculos em que atuava que foi o segundo deputado mais votado pelo PTB - com 1.271 votos, apenas 293 a menos do que Aldo Silva (1914-1977), e ajudando a José Daru, também de Ponta Grossa, a integrar a bancada de seis petebistas na Constituinte. Em sua ação na Constituinte, Laval se preocupou, pioneiramente, com um problema que somente seria objeto de maior atenção dos governantes nas décadas seguintes: a habitação popular. Assim é que foi o autor da lei que criou em julho de 1950 a Caixa de Habitação Popular do Estado. Durante 15 anos - até o surgimento do Banco Nacional de Habitação - Caixa desenvolve um programa que permitiu milhares de trabalhadores construírem sua sonhadas casas, não apenas em conjuntos habitacionais (como os de Santa Quitéria, Jardim das Américas e Guabirotuba, em Curitiba), mas também isoladamente, quando o interessado dispunha de seu terreno. Uma integração de casas populares em bairros diversos, dentro de uma política que, muitos anos depois, seria defendida por urbanistas de visão, preocupados com os verdadeiros guetos que o BNH transformou a construção de imensos núcleos residenciais. Até hoje, Aldo Laval não perdoa ao fato de o BNH - com sua política estatizante, "desumana e cruel", ter sacrificado programas como o da Caixa de Habitação Popular do Paraná - cujo exemplo, inclusive, espalhou-se para outros Estados. Outra de suas lutas foi pela criação da Fundação Casa do Trabalhador, cuja sobrevivência ele mantém - "e manterei, até a minha morte"- por acreditar que mesmo com as modificações sofridas na área de previdência social, o exemplo desenvolvido pela instituição, no período em que a mesma teve recursos, foi modelar. Hoje, uma parte de sua aposentadoria como Constituinte - vantagem que os parlamentares de 1947, ainda vivos - só passaram a ter a partir do ano passado, graças a proposta apresentada pelo deputado Caito Quintana - é aplicada para o pagamento do aluguel e gastos administrativos da Fundação, "que, ao longo destes 40 anos, tem sido sempre esquecida pelos governos, que tudo fizeram para extinguí-la - o que só não conseguiram graças a minha resistência". Outra batalha que não esmorece Aldo Laval e o faz ainda a ter esperanças na Justiça refere-se ao patrimônio da Cooperativa Mista dos Servidores do Estado, uma instituição fundada em 1943 e que ganhou do então interventor Manoel Ribas, uma excelente sede própria na Travessa da Lapa. Uma sede tão valiosa que, há 25 anos, atraiu a cupidez do Estado e foi "comprada" pela então nascente Café do Paraná, numa operação com a qual Aldo Laval, na época integrante da diretoria da Associação dos Servidores Civis do Paraná, não concordou e o fez iniciar, ao lado de Manassés Inocêncio de Miranda, uma batalha jurídica que, em seu entendimento, "ainda não acabou". Apesar da primeira ação ter sido derrotada no Supremo Tribunal Federal, "buscamos outras razões para retornar ao campo de batalha jurídico, assessorados pelo Dr. Mozart de Quadros". xxx Outra idealística proposta que Laval levantou em sua legislatura voltava-se a um problema que só se agravou com os anos: o transporte coletivo. Em 1949, já propunha um sistema em que houvesse um fundo especial para subsidiar "o custo cada vez maior das passagens". Como não foi reeleito em 1951, Laval não esmoreceu. Através de outros deputados voltou a insistir no projeto, finalmente aprovado, no nível da Assembléia pela proposta do deputado Ezequias Losso. - Infelizmente, ao chegar ao Palácio Iguaçu o então governador José Richa o vetou. xxx Casado há 60 anos com dona Luiza, três filhos - Libera, Elisabeth e Deusdith, 12 netos e 5 bisnetos, - Aldo se mantém otimista e explica o segredo de sua juventude espiritual: - É acreditar sempre que há algo a fazer pelo próximo. LEGENDA FOTO - Aldo Laval: aos 85 anos, ainda em ação.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
30/03/1990

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br