Login do usuário

Aramis

A Amazônia em tela e na tela

Estréia hoje, no cine Ritz às 20h, o longa-metragem Fronteira das Almas, de Hermano Penna, que estará presente para coordenar um debate sobre os problemas da Amazônia (enfocados no filme). A sessão especial é uma promoção da Embrafilme, Cine Documento, Instituto de Estudos Amazônicos e Fundação Cultural de Curitiba. Do instituto participam dos debates sua presidente Mari Alegretti, Karin Follador e Paulo Chinesa. Fronteira das Almas chega a Curitiba (entra em circuito normal amanhã, no mesmo cinema) com premiações do III RioCine Festival, XX Festival de Cinema de Brasília e Festival Internacional do 1o Encontro Cultural das Amazônias: melhor filme, melhor direção, melhor roteiro, melhor som, melhor montagem e Prêmio Especial do Júri. Com o aposto "esperança e conflito na Amazônia em Chamas", Fronteira das Almas foi inteiramente filmado em Rondônia com atores de diversos estados, como Antonio Leite, Marcélia Cartaxo (prêmio melhor coadjuvante), Fernando Bezerra, Suzana Gonçalves, Joel Barcelos e participações especiais de Cláudio Mamberti e Ilva Niño. O jornalista Murilo Carvalho, co-roteirista do filme ao lado do próprio Hermano Penna (premiadíssimo também em Sargento Getúlio), observa que Fronteira das Almas "não é um documentário, nem é apenas a história individual deste ou daquele homem; é, na verdade, a reflexão sobre uma metade exilada do povo brasileiro, que anda solta, sem destino pelas estradas do país, à procura de um canto onde se fixar, trabalhar e criar seus filhos. Uma história que nunca foi possível contar direito, com a emoção que eu sentia, nas páginas dos jornais e revistas que trabalhei e que, agora, emocionado, vejo refletida nas imagens deste filme". Sobre o filme, Hermano Penna faz um depoimento que é um pungente convite à reflexão, pois a Amazônia não deve ser um tema apenas na tela. E, sim, em tela: Diz Hermano: "Este filme nasceu de um longo contato com a realidade. Muitas foram as andanças, minhas e de Murilo, pelos inviezados caminhos da Amazônia antiga como atual". Murilo transformou estas andanças em reportagens históricas, as primeiras a denunciar a extrema violência com que o povo sofria no inferno fundiário do Bico do Papagaio, Sul do Pará. Escreveu livros. Fez o que pôde para a nação ficar sabendo da loucura sangüinária que se cometia em nome do famoso "milagre". De minha parte, desde 1966, a Amazônia tem sido um caminhar constante. Razões de vida e profissionais, impediram de me tornar um viajante ligeiro ou um turista aprendiz. Acompanhei com meus sentidos e minha câmara, todas violentas transformações pelas quais tem passado a região outrora mística. Explico o outrora, quando a conhecia ela ainda pulsava os mistérios da floresta impenetrável que agastava e acabava por domar o homem. Da invasão desordenada, alucinada, que começaria nos anos 70, só alguns bolsões nas margens da Belém-Brasília. Era suficiente para imaginar o que viria. A estrada mostra que a floresta não é invencível. Os rios, antes vias de penetração, lentamente se transformam em paisagem. A estrada traz o homem, a comida, o tempo novo. Foi essa Amazônia que começava a ser violentada que descrevi no argumento de Iracema (se o dia for de honestidade intelectual perguntem ao Jorge e ao Orlando). Era o começo da invasão tocada ao ritmo dos tambores do "milagre", o fácil dinheiro dos incentivos fiscais. No meio disso tudo, a secular solução da elite brasileira para o problema fundiário, ampliar as fronteiras de ocupação. Pela Trasamazônica viriam os exércitos de despossuídos do Nordeste. Ao Sul pela BR-364, a multidão dos sem-terra dos estados do Sul. As levas e levas de errantes agrários. Corporações grandes, médias e pequenas. A febre das riquezas metálicas. O comércio das madeiras. Aventureiros do lucro fácil. Todos descobrem que até mesmo, uma boa foice uma caixa de fósforos são o suficiente para fazer ruir o mito de uma entidade ciclópica e invencível, a floresta. Não há passado, nem lendas, nem cidades perdidas, não se reconhecem os direitos dos índios, todo e qualquer mito se exorciza com o fogo imenso que fazem. Fronteira das Almas é uma ficção trabalhada pelas memórias, minha e de Murilo, do que vimos e vivemos nos caminhos das muitas amazônias. Fazê-lo era uma dívida para a minha compreensão do mundo e para o meu coração. LEGENDA FOTO - Marcélia em Fronteira das Almas: pré-estréia hoje com debates
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Nenhum
1
15/02/1989

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br