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Aramis

Apocalipse na tela (III)

Em Curitiba, na quinta-feira, 19, 4.400 pessoas lotaram as 4 sessões do Cine Vitória, deixando na bilheteria exatamente Cr$ 3.400.000,00. Pagando meia entrada (Cr$ 700,00), enquanto em São Paulo, o ingresso está sendo vendido a Cr$ 3 mil. As rádios AM e FM - estão insistindo em rodar "Eva", na qual o grupo de rock Radiotáxi fala do final do mundo e de uma nova raça nascendo. Esquecem, entretanto, os nossos alienados programadores radiofônicos de que há três anos, um persistente grupo curitibano, o Blindagem, no belo e ecológico elepê que fez na Continental, incluiu o emocionante "Oração de um Suicida", composição dos irmãos Pedro e Paulo Leminski, com letra do segundo, que acima transcrevemos. "O Dia Seguinte" estreou no Brasil (e também em outros países,inclusive a França) no dia 19, com a maior carga promocional já dada aum filme. Uma publicidade que não está custando nada ao feliz editor Alvaro Pacheco, que em maio, no festival de Cannes, apostou no escuro e comprou da ABC os direitos para exibição em cinemas de "The Day After". Resultado: vai ganhar ainda mais do que quando conseguiu liberar e aqui lançar, há 3 anos, "O Império dos Sentidos" de Nashima Oshima. O público que foi ver "The Day After" na sua estréia saiu chocado. Evitando fazer comentários, sérios, após assistir as imagens dilacerentes de um mundo destruído pelas exlosões atòmicas. Norton Morozowicz, 37 anos - completados na sexta-feira, maestro e flautista, retornando de férias na Lapa, foi ao Cine Vitória e diz que se arrependeu: - "Nem consegui dormir direito. As imagens ficam na minha retina!" "Vejo nos teus olhos/ tão profundo as durezas/ que esse mundo/ te deu pra carregar/ Vejo também/ que sentes que tem amor pra dar / perdi-me navida achei-me no sonho / a vida que levo não é a que quero/ não quero mais nada quando a terra se acabar/ você vai chorar não adianta mais / vendo esta terra não compensa rezando na presença / de um gigante cogumelo teu retrato é poeira / luminosa nebulosa brilha tanto / e ninguém vê era um mundo tão bonito caprichado de milagres / Deus gostava de florir" (Paulo Leminski, "Oração de um Suicida") Como Norton, centenas de outras pessoas sensíveis se emocionam, se chocam com este filme que na noite de 20 de novembro do ano passado foi transmitida pela rede de televisão ABC, nos Estados Unidos, atingindo mais de 100 milhões de espectadores. Um tratamento de choque, justamente coincidindo na época em que o governo americano, numa escalada armamentista da administração Reagan, decidia a instalação dos mísseis Pershing II na República Federal da Alemanha, apesar dos protestos internacionais de grupos pacifistas. Se o cinema deve ser antes de tudo um veículo de comunicação para denunciar e alertar dos perigos que a humanidade corre, nenhum filme seria mais oportuno do que este "The Day After" - assino como o é, mesmo que uma forma ainda mais ficcional (mas nem por isto menos alarmente), "Jogos de Guerra" (cine Condor, 2o semana, 5 sessões). Muito mais do que um mero disaster movie, como alguns críticos o classificaram, após assistir, apressadamente, exibições em cópias de vído-cassete piratas (de mediocre qualidade técnica), "O Dia Seguinte" é, como bem disse o seu diretor, Nicholas Meyer, um filme que presta real serviço de utilidade pública, na proporção que faz com que o púlico se conscientize de que os riscos de uma catástrofe nuclear não são distantes quando muitos ingênuos pensam - e que mesmo não sendo o Brasil um país de importância estratégica num conflito de mísseis atômicos, nem por isto deixaríamos de ser atingidos pelas conseqüências. "O Dia Seguinte estreou também, agora, nos cinemas do Japão - país que sofreu, há 39 anos, em agosto de 1945, as explosões das bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki. Conforme "O Estado de São Paulo", este filme está sendo muito visto pelos membros da elite comunista nos países da Cortina de Ferro. Várias cópias já estão circulando por países como a Hungria, Polônia, Romênia, Checoslováquia e Bulgária, de forma discreta, em sessões privadas, ou em umas poucas exibições promovidas pelos institutos culturais ligados às Embixadas dos EUA e do Canadá. Segundo diplomatas norte-americanos, o filme chegou ao bloco soviético pouco depois de ter sido mostrado pela rede de TV ABC em novembro/83. Os checos, segundo um diplomata acharam que o filme minimiza muito os efeitos de uma guerra nuclear. O escritor polonês Wislaw Myliwski disse que o filme "irrita especialmente por sua infantilidade, seus personagens de características cômicas e sua falta de lógica". E Stanislaw Glabinski, diretor da Interpress, agência polonesa de notícias, afirmou que "O Dia Seguinte" é digno de se ver, porque mostra que os Estados Unidos estão começando a temer seriamente uma guerra nuclear".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
22/01/1984

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