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Aramis

Aqueles filmes que nunca foram vistos

Mesmo com toda atividade cultural da Cinemateca do Museu Guido Viaro e entusiasmo de seu criador, Valêncio Xavier - transmitido ao ex-seminarista Francisco Alves dos Santos, que o sucedeu - pelo cinema brasileiro, existe quase uma centena de filmes produzidos nos últimos 20 anos que nunca chegaram a ter exibição em Curitiba. Alguns nem sequer em sessões especiais. É o chamado cinema dos malditos, o marginal intelectualmente assumido e que fica restrito a círculos esotéricos de público. Jairo Ferreira, 41 anos, jornalista, cinemaníaco há 38 anos (diz que começou a ir ao cinema aos 3 anos), ex-crítico da "Folha de São Paulo", hoje assessor da Embrafilmes [Embrafilme], prefere chamá-lo de "Cinema de Invenção" - título que deu a um dos mais interessantes livros lançados nos últimos tempos (Embrafilmes/Editora Max Limonad, 304 páginas). Com uma linguagem clara e didática - mas mostrando profunda erudição, a partir das próprias epígrafes e citações - Jairo fala de filmes & cineastas que raras vezes tiveram seus filmes exibidos em circuitos normais e, embora eventualmente premiados, permanecem marginalizados, pobres - esquecidos dos meios de comunicação (exceto alguns críticos e jornalistas, mais sensíveis a propostas avançadas). Descobre, entretanto, em filmes de Ozualdo Candeiras, Rogério Sganzerla, Carlão Reichenbach, José Mojica Marins, Julinho Bressane e tantos outros, o sentido de invenção e ousadia - como diz Cláudio Willer na introdução, lembrando que o texto de Jairo Ferreira em diversos momentos está mais próximo da poesia que do ensaio. xxx Da filmografia incluída ao final do livro, pelo menos 60% dos títulos permanecem inéditos - e assim deverão continuar, já que a não ser em ciclos muito especiais, dificilmente terão condições de serem exibidos, sendo que muitos destes filmes já nem mais existem: as raras cópias perderam-se e dos negativos não se tem notícia. O que, aliás, não é de estranhar, já que até mesmo premiados e badalados filmes de Glauber Rocha só foram restaurados há dois anos graças a um esforço imenso da Embrafilmes e o patrocínio generoso do Banco Nacional. Quem, por exemplo, viu "O Abismo", que o catarinense (de Blumenau), Rogério Sganzerla realizou há 8 anos, com Norma Benguel e José Mojica Marins? Da imensa filmografia de Júlio Bressane, pouquíssimas fitas chegaram aos cinemas - apesar de hoje o seu vanguardismo ser reconhecido, ao ponto de sua alucinante revisão de "Brás Cubas", baseado livremente em Machado de Assis, ter representado o Brasil no II Fest-Rio e agora ter sido um dos 10 selecionados para o XIV Festival de Cinema de Gramado (7 a 13 de abril). Até hoje, nunca os filmes de Andrea Tonacci ("Bangue Bangue", 71; "Blá Blá Blá", 1968) saíram dos circuitos de cineclubes e salas especiais - e nem chegaram a Curitiba. Ozualdo Candeias, outro rebelde, já sexagenário, entre trabalhos de sobrevivência na área do cinema erótico (chegando até o pornográfico), tem também uma filmografia curtida pelos intelectuais. E como ele muitos outros cineastas de idade que vão de 20 a 60 anos, revistos e devidamente valorizados por Jairo Ferreira em seu "cinema de Invenção". xxx Ao mesmo tempo que vem fazendo de "Cinemin", em sua quinta fase, uma das mais completas revistas de informação - especialmente sobre cinema americano, Fernando Alberin, cinemaníaco apaixonado e diretor industrial da Ebal, estimula seus colaboradores a ampliarem as pesquisas para livros básicos sobre grandes cineastas. O primeiro lançamento é o volume dedicado a três mestres do cinema americano - John Huston, Ernst Lubitsch e Fred Zinnemann. A.C. Gomes de Mattos e Sérgio Leemann, os autores, são pesquisadores dos mais organizados, donos de fantásticos acervos de informação e que oferecem, de forma cronológica, organizada e didática, o máximo de informações sobre estes cineastas, com filmografias completas (incluindo os títulos em português), biografias, dados curiosos etc. Com 120 páginas, Cz$ 100,00, esta edição que abre uma prometida coleção que abordará outros cineastas, é indispensável a quem se interessa em conhecer um pouco sobre os grandes mestres do cinema. xxx A propósito, Fred Zinnemann, 81 anos, nascido em Viena (onde se formou em Direito), em Hollywood desde 1929, diretor a partir de 1934, nos últimos anos tem trabalhado vagarosamente. Depois de "O Homem Que Não Vendeu Sua Alma" (1968, 5 Oscars, inclusive de direção) realizou apenas "O Dia do Chacal" (1973), "Júlia" (1977) e "Cinco Dias de Um Verão/Five Days One Summer", de 1982, que neste sábado, às 24 horas - e domingo, às dez horas, terá reprise no cine Groff. Uma oportunidade de rever o trabalho de um dos grandes mestres do cinema, numa história romântica, com Sean Connery e Jennifer Hilary.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
13
04/04/1986

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