Login do usuário

Aramis

AQUI, JAZZ

Gato Barbieri é uma figura já lendária nos meios jazzisticos brasileiros, sem que muitos o conheçam: argentino como seu ilustre colega Lala Schiffrin, Barbieri por várias vezes esteve na Guanabara, participando inclusive de memoráveis sessões do Clube do Jazz e da Bossa (1) e, mais recentemente, fazendo a trilha sonora do frustrado filme "Minha Namorada" (2). Descrito pelo critico Michael Cuscune como "um artista e um musico que na verdade é um cidadão do mundo". Gato tem como "base" a cidade de Nova Iorque, mas continuadamente está na Europa Ocidental, Brasil e na sua pátria, e Argentina. Afinal, é um eclético, intenso e expressivo criador musical, um dos maiores talentos do jazz nos anos sessenta. Em Buenos Aires (3), Gato teve seu aprendizado com uma forte influencia de Dizzy Gillespie a Sonny Rollins, entre outros. Formando o seu próprio grupo, esteve em várias cidades argentinas e na Guanabara por volta de 1961-62. Neste ano ele foi aos Estados Unidos, trabalhando com Jean Hall e mais tarde, seguindo para Paris, onde, em 1965, associou-se a Don Gherry, com a qual fez dois Lps na Blue Note, aparecendo, a seguir, oportunidade de integrar a Jazz Composers Orchestra com a qual fez uma tornée pela Europa e Estados Unidos. Durante este período, fez o seu primeiro álbum como solista, na ESP Records. A partir de 1969, voltando-se para o chamado "jazz do Terceiro Mundo", Barbieri passou a preocupar-se com o aproveitamento de instrumentos e temas dos países sul-americanos, em especial no Brasil, em sua música, agora mais do que nunca numa fase pessoal. Praticamente sem nenhum disco lançado comercialmente no Brasil - gravadoras-fantasmas como a Quartim ou a Stylo parece que lançaram um de seus álbuns, infelizmente restrito às lojas de Copacabana-Ipanema e imediações - Gato Barbieri pode agora ser apreciado, em toda sua explosiva genialidade, em "Fenix" (Phonogram Philips, 6369409, dezembro-72), gravado nos estúdios da Atlantic Recording, em Nova Iorque, em 27 e 28 de abril de 197l, numa produção de Bob Thiele para a Flying Dutchmsan Recording... Para "introduzir" Gato Barbieri no mercado brasileiro não poderia a Phonogram escolher melhor álbum: sem abrir mão de sua improvisação-criação jazzistica, Barbieri sola neste álbum nada menos que dois conhecidíssimos sambas - "Falsa Baiana", de Geraldo Pereira (1918-1955) e "Bahia" (Na Baixa do Sapateiro), ao lado de um dos mais conhecidos êxitos de Carlos Gardel (1887-1935): "El Dia Que Me Queiras". Com estes três faixas, Barbieri propõe uma didática lição: o jazz pode ser absorvido mesmo pelo público menos informado, desde que se ofereçam notas conhecidas, de um tema tradicional. Esta revisitação de "hits" de Pereira, Barroco e Gardel também pode justificar o título do álbum (Fenix) e a enciclopédica nota que Virginie Scott escreveu na contracapa de álbum, a propósito de lenda egípcia do pássaro Fenix, sacrificado em honra e Re, deus do Sol e que renascia das próprias cinzas. Como não existe no álbum nenhuma faixa com o título de "Fênix", uma "hipótese para explicar o nome de álbum está no fato de Barbieri praticamente ressuscitar temas antigos, com as notas marcantes de seu sax-tenor - num estilo único, mostrando que as influencias de Rollins, Ornette, Chery, Shepp e Coltrane ficaram no passado. Duas outras faixas do álbum são de autores desconhecidos - "Carnavalito" (E. P. Zaldivar, 9'10") e "El Arriero" (D. Cerro YE Yupangui, 7'24") enquanto que somente a faixa de abertura do álbum, "Tupac" (4'13") é de sua autoria). Ao lado dos solos suaves e harmoniosos de Barbieri, o sentido didático das faixas - uma espécie de aula inicial de jazz para latino-americano, "Fênix" tem outra inovação: a participação do músico brasileiro Na Ná com berimbau & conga - cremos que este é o primeiro disco de jazz com solos de berimbau, um Instrumento que aos poucos começa a ser disputado pêlos mais sofisticados músicos. O grupo de instrumentistas que participou do álbum é formado por Gene Golden (também na conga, bongo e bateria), Lennie White, Ill (bateria), Joe Beck (guitarra elétrica), Ron Carter (contrabaixo elétrico) e Lonnie Linston Smith (piano e piano elétrico). "Fênix" com Gato Barbieri não é só o primeiro grande lançamento jazzistico a aparecer este ano, mas também um disco expressivo e criativo, como o seu próprio solista principal. Um álbum indispensável a quem "curte" o bom jazz. O NOVO JAZZ DE JOHN MAYALL Enquanto as gravadoras continuam a sonegar do público brasileiro os jazzmen que se vem destacando nos últimos anos (4), uma das poucas revelações jazzisticas em 1972 foi o grupo de John Mayali, que em "Jazz Blues Fuzion" (Polydor-Phonogram, 2301032, agosto-72), revelava as possibilidades de fusão de elementos da musica pop (guitarra elétrica) e melhor improvisação jazzistica num caminho que Miles Davis - monstro segredo do jazz a partir da década de 50 - havia iniciado a partir de sua participação no festival da Ilha Whight, em 1969. Com 5 músicos e amparando em seus solos na harmonia-guitarra-piano, - o pistonista Blue Mitchell, o saxofonista Clifford Solomon, o guitarrista Larry Taylor e o percussionista Ron Selico oferecia em "Jazz Blues Fusion", sete temas inéditos, inclusive um pretensioso ensaio de 8 minutos chamado "exercise in C. major for harmônica, bass & shufflers". E quem soube apreciar as propostas novas de Mayall, tem agora chance de confirmar suas esperanças, num trabalho mais amplo e pretensioso: "Moving On" (Phonogram/ Polydor, 2391047, dezembro-72), gravado em julho do ano passado nos estúdios Mobile, em Los Angeles e também no Whiskey A Go-Go, em Los Angeles ("Jazz Blues Fusion" também havia sido gravado em sessões diversas e ao vivo, em Boston e Nova Iorque). Aqui, Mayal ampliou sua banda, agora com nove integrantes - e intercalando os solos individuais, com vocais apropriados. Assim temos Freddy Robinson na guitarra e Larry taylor na guitarra-base, Clifford Solomon, sax-tenor, dos músicos do primeiro álbum. E, reforçando, Blue Mitchell no pistão, Victor Gaskin no contrabaixo, Charles Owens, no sax-tenor e flauta (que se destaca em solos principalmente em "Chrismas 71", uma nova proposição em termos de música natalina e "Keep Our Country Green) Ernie Watts no sax-tenor, finalmente, Keep Hartley na bateria. Como no "Jazz Blues Fusion", exclusivamente temas próprios: no lado "A", após uma "brief introduction" do produtor Bill Cosbb, temos "Worreied Mind", "Keep Our Country Green", "Chrismas 71" e "Things Go Wrong". No lado 2, "Do It", "Moving On" (com um expressivo solo do pistonista Blue Mitchell), "Red Sky", "Reasons" e "High Pressure Living". Autor de todas as faixas, líder do grupo Mayall foi ainda o responsável pelo planejamento gráfico da capa/contracapa do álbum, com expressivas informações. Sem dúvida, o jazz não morreu como afirmam muitos coveiros e uma prova está na presença robusta do grupo de John Mayall com este extraordinário álbum chamado "Moving On". BLUES DO KING Demorou muitos anos para do Blues Boy, ou B. B. fosque B. B. Kinv (R. ley chama-se revelado no Brasil. Isto aconteceu no ano passado, com um bom álbum lançado pela Fermata, ao qual vem somar-se agora este suave, original e inédito "L. ª Midnght" (Probe Records/Odeon, 15034, dezembro/72). Cantor e guitarrista americano (Indianola, Misissipi, 1925), Ritley King a partir de 1945 começou a acompanhar grupos de Gospel (3): Spirit of Memphis e, mais tarde, Fairfeld Four. A partir de 1950 começou a cantar como solista e, em 1958, instalou-se na Costa Oeste, mas tem passado o maior tempo de sua vida em tournees com um pequeno grupo de Rhythm and blues. Influenciado inicialmente por ig Boy Broonzy (William Lee Conley - 1893-1958) e Tampa Red, especializou-se no chamado Blues urbano, adotando a guitarra elétrica nos últimos anos e aproximando-se, vocalmente, do estilo de Ray Charles. Seu primeiro álbum, "B. B. Blues", gravado em 1952, foi saudado com entusiasmo pelo estilo e personalidade. Hoje já nas paradas de sucesso, Blues Boy King divide seu trabalho com um grande conjunto instrumental - três guitarristas, o pistonista Bobby Bryant, o sax-tenor Red Holloway, o pianista Victor Feldman, o contrabaixista Ron Brown (não confundir com o extraordinário Ray Brown, durante anos do trio de Oscar Peterson), entre outros. E nesta formação instrumental bem mais sofisticada, B. B. King escolheu sete temas próprios, mas sem a tristeza do Blues tradicional - uma espécie de Blues sem fossa, de consumo bem amplo: "I Get Some Help I Dont Need" (540 minutos), "Help The Poor" (3,30), "Can't You Hear Me Talking To You?" (3,19), "Midnight" (8'14), "Sweet Sixteen" (q'01') "(I Be lieve) I've Been Blue To Long" (4'50) e "Lucille's Granny (7,53). OSIBISA HEADS Pela terceira vez registramos o lançamento de um disco do grupo afro-americano Osibisa na página "Aqui, Jazz". Não que este conjunto seja perfeitamente jazzistico, mas é que pelas suas raízes (Negras/ África) e os solos em algumas faixas de seus discos, aproximam-se mais a chamada música (originária de Nova Orleans, do que a musica pop de loiras origens anglo-americanas. Osibisa significa homens do ritmo. Foi o nome escolhido por 7 músicos negros - 4 da África e 3 da Índia Ocidental, que acima de preconceitos raciais/musicais, juntaram o cerebralismo oriental (que tanto influenciou os Beatles a partir de 64), o balanço afro e algumas lições (comerciais) elétricas do pop. Resultado: já com o primeiro álbum na Decca Records Norte-americana. Osibisa - Ritmos que explodem com Felicidade", subiram nas paradas. A banda é formada por Teddy Osei, natural de Ghana, que toca sax tenor, flauta, tambores africanos e vocal; Sol Amarfio, de Ghana, baterista; Mac Tonton, também de Ghana, pistão e cabaça; Spartacus R. de Grenada; guitarra baixo, percussão; Wendel Richardson, da Antigua, guitarra líder e vocal; Robert Bailey, de Trindad, órgão, piano, timbales e Loughty Amao, da Nigéria; sax tenor, sax barítono e congas. Osibias não venceu apenas pelo som excêntrico, pelo fato de terem raízes africanas/indianas. Seu ritmo a originalidade de suas canções e, é claro um bom esquema promocional garantido por uma série de programas com o produtor Tommy Webber, auxiliaram bastante. Agora, em seu terceiro álbum editado no Brasil ("Osibisa Heads, Decca-MCA 600034, Continental) - que a partir da capa já lembra as origens do conjunto, uma seleção de novos temas próprios - alguns com títulos fieis as origens ("Kokorokoo", "Wango Wango", "So So Mi La So" "Ye Tie Wo", "Che Che Kule"), outros já fazendo concessão ao sucesso e a um novo público: "Sweet América" "Do You Now" e "Sweet Sounds". RORY GALLAGHER Embora agradando ao público pop, um novo instrumentista pode merecer a atenção dos mais exigentes, mesmo do jazz maníacos abertos ao novo som: Rory Gallagher. "Live! In Europe" (Polydor / Phonogram, 2383112, dezembro-72), gravado ao vivo durante as apresentações de Gallagher e seu trio na Europa nos meses de fevereiro e março do ano passado, permite observar a sua versatilidade, alternando no vocal, guitarra, harmônica e um instrumento chamado mandolin. Coadjuvado por Wilgar Campbell na bateria e Gerry McAvoy no contrabaixo, Rory oferece solos marcantes, em composições próprias: "Messin With" The Kid", "Laundromat", "I Could've Had Religion", "Pistol Slapper Blues", "Going To My Home Town", "In Your Town" e "Bullfrog Blues". NOTAS (1) Clube do Jazz e da Bossa, fundado em 1962, por um grupo de estudiosos de como Sérgio Porto Stanislaw Ponte Preta), Ricardo Cravo Albim, Jorge Guinle e outros. Funcionava aos domingos (16 às 21 horas), no Little Clube, no Beco das Garrafas, na Guanabara. (2) "Minha Namorada", de Zelito Viana/ Arman da Costa, 1971, roteiro inspirado na musica de Vinícius de Moraes - Carlos Lyra. (3) Buenos Aires é, na América Latina, a cidade de maior desenvolvimento jazzistico, com vários conjuntos e intensa atividade fonografica. (4) Um exemplo: Gary Burton, desde 1965, presente no "Jazz Poll" de "Down Beat", ainda não teve nenhum disco lançado em nosso País. (5) A denominação "Gospel Song" ou "Canto do Evangelho" surgiu a partir dos anos 30 para designar uma forma de canto religioso no Norte dos Estados Unidos, que se desenvolveu principalmente nas Igrejas. Ao contrario do "Spiritual" (canto coletivo, mesmo fora das igrejas) . o "Gospel" teve sempre um sentido religioso mesmo quando levado as apresentações públicas. Uma das maiores interpretes no estilo "Gospel" foi Mahalia Jackson (1911-1972), extraordinária interprete jazzistica que nunca teve um disco editado no Brasil. LEGENDA FOTO 1- B. B. King.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Nenhum
20
04/02/1973

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br