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Artes e amores de Violeta, a rebelde

Se o programa editorial deslanchado na administração dotteana na Secretaria da Cultura tiver prosseguimento sob a competente orientação de Regina Benitez, um livro que deveria ser reeditado é o tratado paranista que aborda a geologia e tribos indígenas paranaenses, escrita há mais de 50 anos pelo geólogo Paulino Franco de Carvalho. Pelo menos, o secretário da Administração, advogado Luiz Gastão de Alencar Franco de Carvalho e sua irmã, a pintora Violeta Franco, ficariam felizes. É que esta obra de seu pai se constitui hoje numa raridade, da qual existem pouquíssimos exemplares - um deles cuidadosamente preservado na biblioteca paranista do jornalista Samuel Guimarães Costa. Em emotivo depoimento gravado para o projeto Memória História do Paraná, a pintora Violeta Franco - que inaugura nesta quarta-feira, 3 de abril, uma nova individual na galeria de arte do Banestado (Rua Marechal Deodoro, 333), falou longamente de uma importante época das artes plásticas no Paraná, entrecruzando com recordações de seus tempos de menina na Avenida Iguaçu - onde passou sua infância na mansão de seus avós maternos, Manoel Vieira Barreto de Alencar, de raízes mineiras, que foi um dos fundadores da Universidade Federal do Paraná, professor e advogado dos mais conhecidos e que chegou a ser um dos próceres do Partido da Representação Popular. "Assim, em minha infância, acostumei-me a ver líderes integralistas como Gustavo Barroso e Plínio Salgado conviverem com a minha família", diz Violeta que, ao lado de sua avó, estava na noite em que uma conferência de Plínio Salgado no Cine Avenida foi interrompida por comunistas que transformaram a Avenida Luiz Xavier num campo de batalha. - "Lembro-me que enquanto muitos fugiam procurando escapar, meu avô continuava imperturbável, procurando manter a calma dos presentes. O que era, penso hoje, quase impossível". xxx Personalidade rebelde, a menina Violeta passou "por quase todos os colégios religiosos da cidade, sendo expulsa sempre", diz, com um sorriso de sua juventude de "angry young girl". Se o ensino convencional não a entusiasmava, as artes sempre a atraíram e, numa época em que ninguém falava em escritores como o checo Franz Kafka, já lia os seus romances. Gostava de teatro e sonhava em ser atriz, "mas nem pensar nisto, naqueles idos dos anos 40, de sociedade repressora...". De seu tio Alarico Vieira de Alencar, um advogado bonachão, temperamento boêmio, de muitas estórias no folclore romântico curitibano, Violeta guarda as melhores lembranças. - "Eu sempre tive o seu apoio, a sua compreensão e a sua ternura nas horas difíceis". Outro de seus tios era o médico João Vieira de Alencar, professor e médico, fundador da Casa de Saúde São Vicente, que ao morrer deixou um dos maiores patrimônios imobiliários da cidade - que veio tornar ainda mais rico o seu irmão, Luiz Gastão - o seu principal herdeiro. Um terceiro tio, Gastão Alencar, fez carreira política, chegando a deputado pelo PTB. Aos 14 anos, um dia quando passeava com o seu avô, Manoel, pela Rua XV de Novembro, conheceu o pintor Guido Viaro - então o grande nome de nossas artes plásticas. Mas seria com Poty Lazarotto, num improvisado e pioneiro centro de gravuras que Violeta começaria a desenvolver seu lado de artista. Intuitiva, sempre com muita personalidade, viria a criar um espaço artístico-doméstico que entraria na crônica das artes do Paraná - a famosa "garaginha", na mansão de seu avô. Ali, houve um importante núcleo de criatividade artística no final dos anos 40 e parte da década de 50. xxx O casamento com um advogado que se transformaria num dos grandes pintores brasileiros, Loio Pérsio, marcaria uma outra fase na vida de Violeta. Foi uma época em que havia um sopro de inovação nas artes do Paraná, com os ventos do Centenário, o governo de Bento Munhoz da Rocha Neto, a Cocaco - primeira galeria de artes plásticas do Paraná - um fervilhar literário, e do qual Violeta e Loio eram um dos eixos culturais. Em seu apartamento, reuniam-se jovens intelectuais, arquitetos, poetas, etc.: "Entre eles - lembra a pintora - o paulista Abel Barros Lima e os ingleses Norman e Michel que viriam a desenvolver em Curitiba a primeira fábrica de móveis modulados, com um designer avançado - a "Forma", que mais tarde seria levado para São Paulo e Rio de Janeiro. O casamento com Loio Pérsio acabou em 1957, e, com seus três filhos, Violeta, corajosamente, foi para São Paulo. Uma nova cidade, novos desafios. Com Miriam Xavier Fragoso, dona de uma avançada escola de arte, desenvolveria um trabalho importante no campo da arte na educação, com idéias avançadas e que, posteriormente, tentou aplicar no Centro de Criatividade de Curitiba, quando retornou a Curitiba. Entre duas longas permanências em São Paulo - onde fez suas primeiras exposições individuais, Violeta atravessou várias fases em sua pintura. Uma mulher assumida, sempre pronta a novas experiências - lembra-se, sorrindo, que logo após ter se separado de Loio Pérsio, aceitou o convite de uma amiga, Marisa Camargo, dona da boutique "Vogue", e desfilou como modelo num lançamento de moda de inverno no Graciosa Country Club. - "O que hoje é corriqueiro, na época era chocante: desquitada e modelo! Mas ao meu lado, dando a maior força, estava minha avó, Ismenia, toda orgulhosa de sua neta". A arte de Violeta renova-se sempre. Na exposição que inaugura agora, traz 20 telas produzidas nos últimos meses, com cores brilhantes, explicadas por seu amigo Aroldo Murá no catálogo, como "pinturas que a revelam com o seu primeiro e inarredável compromisso, o de ficar como ser humano". Mas Violeta já trabalha em novas telas, voltando-se ao mais paranaense dos símbolos, porém com um novo olhar". - "Afinal, não quero ser, como tantos pintores já foram, mais um gigolô de nossos pinheiros".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
20
02/04/1991

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