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Aramis

A boa casa de Gemba

O universo denso e pesado - mas profundamente lúcido em termos políticos - do poeta Garcia Lorca (1898-1936) encontrou em Oracy Gemba um diretor sensível nesta montagem de "A Casa de Bernarda Alba" (auditório Salvador de Ferrante, até domingo, 21 horas). Aquilo que Gemba vem perseguindo em quase 10 anos de atividades - um teatro consciente e comunicativo - é alcançado nesta vigorosa montagem de um dos mais belos textos do poeta espanhol. Se "Matat/Sade", apesar de bem acabado, perdia-se na falta de uma comunicação maior com o público e "Maria Bueno", este com texto do próprio Gemba, também pecava pela falta de simplicidade, neste "Bernarda Alba", Gemba deixa o espetáculo fluir naturalmente, sem acrescentar nada de "inventivo" ao texto de Lorca, que por si só já é suficiente. E o resultado é uma peça da maior dimensão, proporcionando a um grupo de atrizes tupiniquins - entre jovens já experientes (Silvia Chamecki, Lota Moncada, Tonica, Elizabeth Destefanis, Angela Wogel), atrizes maduras (Luciana Cherobim, Maria Cecilia Monteiro e Yara Sarmento) ao lado de estreantes (Dulce Mara Gao, Vera Eifler, Tania Rezende, Regina Bastos) - a oportunidade de mostrar muita gara numa montagem que só foge ao convencional, pela idéia de utilizar um ator (Sansores França) no papel título. E Bernarda Alba não é transvertida, como está na moda no teatro brasileiro. Ao contrário, Sansores dá interpretação máscula, firme e viril - marcando ainda mais a caricatura política (o generalíssimo Franco) que Lorca pretendeu dar ao seu personagem. O arquiteto Ronaldo Leão Rego criou um cenário despojado e perfeito: algumas poltronas e uma mesa, que somadas à bonita iluminação de Luiz Roberto Bruel, dão a ambientação perfeita ao espetáculo. As atrizes, em seu guarda-roupa pesado (criação do Luiz Afonso Burigo), adequado ao clima da peça, movimentam-se com agilidade. E na música de Luis Antonio Karam, um dos pontos altos do espetáculo. Sem interferir nos diálogos, mostrando um amadurecimento em relação aos seus estridentes trabalhos anteriores, o Karam músico fêz uma sound-track que oscila dos mais quentes ritmos espanhóis até sons quase eletrônicos, num clima de sugestivo science-ficction para algumas passagens. Bemba, diretor polêmico, com o qual não poucas vezes divergimos, pode perceber nesta montagem que a simplicidade é ainda um caminho bem mais seguro e válido do que a glamorização de langejoulas que já prejudicou muitos de seus trabalhos anteriores.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
4
15/04/1974

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