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Aramis

CDs do ano - A volta de Luís Bonfá, em sua melhor forma e estilo

Afinal, neste final de ano, chega um dos álbuns mais aguardados: o retorno de Luís Bonfá, que há 18 anos não tinha um novo disco lançado no Brasil ("Jaracandá" aqui saiu em 1973 pela RGE), embora sua discografia chegue a 50 títulos nos Estados Unidos. Reconhecido como um dos influenciadores da Bossa Nova, compositor, violinista e mesmo cantor eventualmente, com uma obra internacionalmente reconhecida, Bonfá é, para a geração idiotizada pelas FMs que colonizam corações & bolsos, um ilustre desconhecido. Todas as palmas à Arnaldo Solteiro, amigo e produtor de Bonfá e a Peter Klan, dono da Caju, que entendeu a importância deste artista e deu condições para "The Bonfá Magic", gravado no Rio de Janeiro e posteriormente remixado no Duplex Studios Sound Studios, em Nova Iorque, em maio de 1991, se realizasse como um álbum perfeito. O mercado internacional para esta produção é tamanho que a edição (em CD) traz o encarte com o texto do crítico Marketing Holston, da revista "Jazzie", em inglês. Bonfá é merecedor de toda uma literatura, pela sua permanência na música popular, desde que aos 12 anos começou a tocar violão. Carioca, 69 anos completados no último dia 17 de outubro, Luís Floriano Bonfá tem mais de 50 anos de vida artística - desde seus tempos de garoto prodígio dos programas "A Hora do Guri", na Tupi do Rio de Janeiro. Profissional desde 1945, quando foi morar em São Paulo, no ano seguinte já era levado por Augusto Sardinha (Garoto, 1915-1955) para a Rádio Nacional, fazendo então sua primeira gravação ("Uma Prece" e "Pescaria em Paquetá", ambas de sua autoria, Continental). Em 1947, passava a fazer parte de um histórico grupo vocal - os "Quitandinhas Serenaders" - ao lado dos gaúchos Luís Telles, Francisco Pacheco e Alberto Ruschel (*), grupo que se dissolveria em 52. A década de 50 foi marcante: em 53, Dick Farney gravou suas composições como "Ranchinho de Palha", "Perdidos de Amor", "Sem Esse Céu" e "Canção do Vaqueiro". Foi o violinista na primeira encenação, no Teatro Municipal, em São Paulo, de "Orfeu da Conceição", de Vinícius de Moraes (gravado em elepê pela Odeon) e excursionou pelos EUA, por 2 vezes, com a cantriz Mary Martin, ganhando aplausos e sentindo as possibilidades para ali se estabelecer - o que faria a partir de 1962, depois de ter participado do festival de Bossa Nova no Carnegie Hall. Nestas alturas já havia composto "Samba do Orfeu" e "Manhã do Carnaval" (ambas com Antônio Maria) para o filme "Orfeu do Carnaval" - baseado na peça de Vinícius e dirigido pelo cineasta francês Marcel Camus (1912-1982) e tinha acrescentado a sua obra inúmeros sucessos - como "De Cigarro em Cigarro" (que virou prefixo da grande Nora Ney), além de ter escrito também música para "Chico Viola não Morreu" (1955, de Roman Vignoly), numa aproximação com o cinema que, nos EUA, o levaria a fazer inúmeras sound tracks. Durante 25 anos, Bonfá residiu nos Estados Unidos, só retornando há pouco tempo - mas assim mesmo mantendo as ligações com aquele país - onde continuou a produzir. No Brasil, recolhido em sua mansão na Barra da Tijuca, recebendo poucos amigos, dedicando-se a sua coleção de carros antigos - uma das maiores do Brasil - Bonfá preferiu nem tentar fazer shows ou gravar discos. Só a consideração que o projeto levado pelos seus amigos Klan e Solteiro, o animava a fazer um novo álbum, com lançamento simultâneo no Brasil e Estados Unidos, que, sem favor nenhum, ganhará destaque como um dos melhores do ano. O Disco - São 6 faixas, em sua maioria composições inéditas - algumas delas criadas no estúdio, pouco antes da gravação. Como lembra a atenciosa Graça Veiga, da Caju, são temas que vão do lirismo da toada "Rio Acima" ao envolvente balanço de "Subtele Samba", passando pela complexidade melódico-harmoniosa de "Space Adventure" (com arranjo assinado pelo sobrinho, Távio Bonfá) e "Missael" (em duo com Sônia Burnier, no sintetizador), duas peças semi-clássicas. "Almost in Love", um hit criado por Bonfá para Elvis Presley, utilizado na trilha do filme "Live a Little, Love a Little", reaparece em clima de Bossa Nova, enquanto um irresistível swing jazzístico envolve aquela que é uma das obras-primas da Bossa Nova, "Menina Flor", enriquecida por solos de Jota Moraes no piano e Gene Bentoncini no violão. Márcio Montarroyos recria, no "flugelhorn", o seu maior êxito - "Manhã de Carnaval", que correu mundo na trilha de "Black Orpheus" - e que algumas vezes é tida como composição de Antônio Carlos Jobim. Mostrando sua maestria como violonista, a virtuosidade de Bonfá se faz presente em "Ruth's Waltz", "Smooth Dreams" e "Samba Variations", com o suporte do baixista Nilson Matta, que mora em Nova Iorque, onde toca com Gato Barbieri e Paquito D'Riviera e que veio ao Rio especialmente para a gravação - e o baterista Pascoal Meireles, incrementando faixas como o sambão "Batukada" - na qual Arnaldo Solteiro, além de bom produtor, mostra também suas habilidades de percussionista, numa faixa que tem ainda a parte eletrônica pilotada por Eumir Deodato. "Fat Tuesday's Theme" foi composta por Luiz, durante uma temporada no clube de jazz "Fat Tuesday" em 1987. O encerramento é especial - com a única faixa que não é de sua autoria: a antológica "April in Paris" (Cole Porter), que ele, confirmando seu bom gosto, diz ter dedicados aos seios ("os mais lindos que já vi", garante) da atriz Catherine Deneuve, a quem foi apresentado por Ava Gardner num set de filmagens em Paris, nos anos 60. Com toda razão, Bonfá destila lirismo e dá ao standard de Porter uma performance tão bela quanto a atriz francesa. Trabalhando com músicos notáveis - além dos já citados, também participou Thiago de Mello, percussionista, filho do poeta de "Faz Escuro mas Eu Canto", Bonfá realizou um CD que integra talentos do compositor (harmonias sofisticadas, linhas melódicas de cativante lirismo e bases rítmicas sedutoras) com as qualidades do violinista, sempre admirado pela sua técnica preciosa. Enfim, um disco como não se fazia há muito tempo, merecedor da maior atenção e que se constitui em presente ideal para as pessoas realmente de gosto refinado. Nota (*) Alberto Ruschel seria um dos mais famosos atores brasileiros nos anos 50, após sua interpretação em "O Cangaceiro", 1952, de Lima Barreto. Hoje vive no interior de Goiás e por ocasião do Festival de Cinema de Brasília (maio/91) foi entrevistado para matéria a ser divulgada em breve, na qual fala sobre a sua experiência de cantor. LEGENDA FOTO - Luiz Bonfá, 69 anos, quebrando um jejum de gravações no Brasil, volta com o CD do ano; em lançamento da Caju.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
4
24/11/1991
Muito bom o site, procurava saber alguma coisa da vida de Luiz Bonfá e achei aqui. Gosto de ler artigos sobre musica. Um abraço. Jerry Valiente Porto Alegre - rs - Brasil

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