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Aramis

Cecília, o anarquismo, nos 100 anos do Guaíra

A data já está marcada 28 de setembro, que marca os 100 anos do Teatro Guaíra (antigo São Theodoro) - o diretor (Adhermar Guerra) está contratado (e desde sábado novamente na cidade) e já foram feitos os testes para selecionar o elenco da grande produção do Teatro de Comédia do Paraná. O que falta até agora é o texto. Adhemar Guerra, profissional competente, curriculum dos mais ilustres, aparenta calma. Iara Silveira, coordenadora do TCP também não há sinais de nervosismo. Entretanto não deixa de ser curioso que a grande peça para comemorar o centenário de nosso teatro ainda não esteja pronta. Não há nem título definitivo - chama-se apenas de Projeto Cecília. xxx A idéia de fazer uma peça tendo por tema a experiência da colonização de uma região do Paraná, entre 1889/1895, por imigrantes italianos anarquistas, não poderia ser das mais oportunas. Afinal trata-se de um episódio fascinante mas pouquíssimo conhecido, embora já tenha motivado dois livros e um filme francês - este nunca exibido no Brasil. Assim como em 1979, quando Aldo Almeida Jr., e Luis Esmanhoto dirigiam a Fundação Teatro Guaíra, o TCP se voltou a outro episódio de nossa história - a guerra do Contestado, encenando a peça do catarinense Romario Borelli, a proposta de levar ao palco a história da Colônia Cecília é interessantíssima - pois poderá estimular toda uma revisão de um fato histórico até hoje insuficientemente discutido e analisado - e que mesmo nos cursos de história é pouco aprofundado. Como não há nenhum texto teatral a respeito, a Fundação Teatro Guaíra procurou as pessoas que direta ou indiretamente se interessaram em pesquisar o assunto: Valêncio Xavier (que traduziu o diário do líder da colônia, Giovani Rossi), Valmor Marcelino e Newton Stadler de Souza, autor de "Anarquismo da Colônia Cecília" (Editora Civilização Brasileira, 1969). Entretanto havia necessidade de um tratamento da história em forma de dramaturgia, num texto seguro e para isto Iara Silveira lembrou de sua amiga Renata Pallotini, que há alguns meses esteve em Curitiba orientando um seminário de dramaturgia. Renata, que acaba de concluir um texto sobre a imigração italiana no Brasil, interessou-se e mesmo sem ainda ter pesquisado o aspecto histórico, teria já elaborado um primeiro tratamento da peça. A questão agora é se a sua visão será livremente inspirada no fato histórico, ou se pretende realmente realizar uma peça-documentário. Neste caso, necessitará aprofundar-se um pouco mais nas pesquisas existentes, conversar com quem estudou o assunto, enfim, ter alguma vivência a respeito. xxx Giovanni Rossi, agrônomo italiano, nascido em Pisa, 1860, veio para o Brasil em 1889, liderando algumas dezenas de famílias italianas, atendendo a um convite do próprio imperador D. Pedro ll. A experiência da colonização na região de Palmeira, próximo onde hoje existe a colônia Santa Bárbara, estendeu-se por seis anos, mas fracassou por várias razões. Rossi, antes de retornar à Itália, residiu algum tempo em Santa Catarina - datando daí sua aproximação a outro pioneiro da imigração italiana, Esmembergo Pelizzeti (1873-1947), fundador do cooperativismo rural na região, e chegou a trabalhar como professor em Blumenau. Teria falecido em Roma, em 1907 - não havendo precisão com relação a esta data. Há 44 anos o escritor Afonso Schmidt (1890-1964) romanceou os fatos em "Colonia Cecília - Uma Aventura Anarquista na América" (Editora Anchieta, 1940), ilustrado com mapas e alguns dados imprecisos - inclusive dando o ano de 1893 como o fim da colônia. Estudando o assunto mais a fundo, Newton Stadler de Souza, 55 anos, ex-jornalista (foi presidente duas vezes do Sindicato e em 1964 presidia a Federação Nacional dos Jornalistas), hoje dedicando-se apenas o magistério na Universidade Católica e a sua banca de advocacia, publicou há 15 anos um livro mais profundo a respeito. Uma obra hoje rara, cuja reedição poderia ser agora patrocinada pelo governo do Estado. Em 1975, movido não se sabe por que cargas d''agua, um cineasta francês, Jean-Louis Comolli, rodou nos arredores de Paris o filme "La Cecília/ Une Commune Anarchista Au Brasil em 1890". Apesar de citar os livros de Schmidt e Stadler como fontes de pesquisa para o roteiro. Comolli nunca oficializou a utilização destes trabalhos. Newton recebeu apenas uma carta da produção, mas jamais conseguiu ver o filme. Em 1979, uma cópia foi trazida ao Brasil pela Unifrance, mas teve apenas exibições privadas no Rio e Brasília, na Maisom de France. Nenhuma empresa distribuidora se interessou em lançar comercialmente este filme, projetado com relativo êxito em alguns países europeus e, mais tarde, apresentado também na televisão francesa e inglesa. Agora, Iara Silveira está tentando sensibilizar a Embaixada da França a conseguir uma fonte de referência a produção teatral. Alguns poucos curitibanos assistiram ao filme em Paris, entre os quais a professora Oksana Borussenko, do Departamento de História da UFP, que considerou válido e honesto o filme em termos históricos, ëmbora, naturalmente, uma visão totalmente francesa". Inexistindo ainda o texto teatral definitivo, desconhecendo-se a visão que Renata Palotini e Adhemar Guerra pretendem dar ao espetáculo, a encenação da peça - "Colônia Cecília" (nome provisório, é claro), torna-se uma grande incógnita. O resultado de um tema amplo e polêmico como este, no palco, se terá dentro de dois meses, quando uma produção cara - "mas que não ultrapassará os Cr$ 50 milhões", garante Iara Silveira - estréia no auditório Salvador de Ferrante.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
20
14/08/1984

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