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Aramis

Chorô (II)

A velha lei do mercado funciona: da quantidade acaba saindo a qualidade. O que é bom permanece, o que é supérfluo é esquecido. Assim como os compositores e interpretes do samba autêntico resistem aos modismos, ao marketing do sambão-jóias, também os verdadeiros talentos do Choro vão resistir à inglação do gênero, que ao lado de seus aspectos positivos, provocam o aparecimento de muito material de melhor qualidade. E os bons registros do choro autêntico aparecendo. A multinacional WEA, ao lado de um dos melhores álbuns do ano, "Choro na Praça", gravação ao vivo no Teatro João Caetano, em junho último, está lançando agora as 12 finalistas do I Festival Nacional do Choro "Brasileirinho", realizado no Anhembi, em São Paulo, em outubro último. Promoção das mais importantes, destinada a estimular o aparecimento de novos choros - pois a constante regravação dos temas clássicos acaba cansando - o Festival revelou novos autores e confirmou o talento de outros. O resultado está neste disco documental, importantíssimo, sem dúvida um dos melhores do ano. Todos os choros finalistas da promoção de Roberto de Oliveira são ótimos mas um dos quais mais no emocionou foi "Choro do Tião" de Jonas Borges, com Jonas e seu Regional. Veteranos participaram da promoção como Sivuca ("Músicos e Poetas"), acompanhado do regional de Evandro, mas a maioria dos grupos é formado por gente moça, inclusive garotos. O que já faz deste evento ser um momento de esperança. Outros choros: "Meu Pensamento" (José Silva) com Lenha da Casa (solo de Flauta: Plauto Cruz), "Espírito Infantil" (Maurício Carvalho) com o grupo A Cor do Som, "Homenagem a Época de Ouro" (José Luís de Jesus) com Os Ingênuos: "Ansiedade" (Rossini Ferreira) com o conjunto Amigos do Choro e o autor no solo de Bandolim; "Chorinho Triste" (João Carrasqueiro) com o conjunto Bachorando e João Carrasqueira em solo de flauta; "Pó de Mico" (Alexandre Dantes do Amaral) com o grupo Banzo; "Bauru" (José Rubens Lopes) com autor; "Chora Craviola" (Vivaldo Medeiros) com Medeiros Júnior e regional "Guarani" (Carmino Pedro Romano) e Trio D`Angelo e um curioso "Choro Cromático" (Benjamim Silva Araújo) na execução do ex-instrumentista da Bossa Nova, pianista Hamilton Godoy, do Zimbo Trio. Primeira produção de João Lara Mesquita, realizada nos estudios Eldorado, "Nos Bons Tempos do Chorinho" (Continental. 1-40-404-001, novembro/77), está sem dúvida nenhuma, entre os melhores discos do ano. Com o flautista Carlos Poyares como solista, acompanhado por Carlos Mafesoli Filho (acordeon), Bernardo Cascareli Júnior (Chicha) no cavaco; Júlio Mesquita Pinto (carioca) no violão de 7 cordas; Domingos Rodrigues (russinho) no surdo; José dos Santos Pereira (Zezinha) no pandeiro; Carlos Poyares também no ganzá, trata-se de um elepê pensando e repensado, registrado entre maio/junho/77, com todos os cuidados. Cada uma das 12 faixas foi planejado, unindo-se a qualidade técnica do Eldorado - talvez o melhor estúdio de som do Brasil - o máximo de interpretação. O resultado é um elepê perfeito, capa dupla, texto inteligente e informativo, que credencia João Lara Mesquita, da família tradicionalmente ligada ao jornalismo ("O Estado de São Paulo") a ser considerado um das revelações do ano como produtor. Faixas: "Choro Serenata" (Sivuca, inédito); "Variações sobre o Urubu Malandro" (Onorino Lopes), "Um Chorinho para Elizeth" (Pixinguinha), "Gingando" (Herendino Silva, cachoto); "Cinco Companheiros" (Pixinguinha), "Encabulado" (José Menezes/Luís Bittencourt); "Ingênuo" (Pixinguinha), "Flor Amorosa" (Catulo da Paixão Cearense/Calado), "Entardecendo" (Sivuca), "Brejeiro" (Ernesto Nazareth), "Um Chorinho Diferente" (Gaucho/Ivone Rabelo) e "3 Estrelinhas" ( Anacleto de Medeiros"). *** Antes que pudesse ficar prejudicado com o excesso de reedições de trabalhos feitos há muitos anos, representativos de outra fase de sua vida artística, com Waldir Azevedo, um dos grandes executantes da cavaquinho no Brasil, que permaneceu quase uma década afastada da vida artística (6 anos em Brasília, onde sofreu acidente num dos dedos), Waldir retornou à vida artística no ano passado e neste período já fez várias gravações. Mas agora, tem, finalmente, um elepê à altura de seu imenso talento (Continental, 1-01-701-176, novembro/77). Como contamos nesta página, há algumas semanas, Waldir gravou "magoado", um choro do violonista Dilermando Reis, que o desafiou originalmente pra violão. Pena que Dilermano não esteja vivo para ouvir a gravação. Temos certeza que se emocionaria. "Flor do Cerrado", incluído no disco, é a mais recente composição de Waldir: foi feita no dia 20/9/77, no avião que levava Waldir de Brasília a São Paulo. Em "Cavaquinho seresteiro", o solo de violão é feito por Hamilton Costa, parceiro de Waldir em "Contraste" e autor do bonito choro "Pra Esquecer", também incluído neste disco. As outras faixas são de músicas conhecidas - mas grandemente valorizadas pela sensibilidade de Waldir: "É do Que Há" (Luiz Americano), "Chão de Estrelas" (Orestes Barbosa/Silvio Caldas), "Vassourinhas" (Mathias da Rocha/Joana Ramos), "Choro Negro" (Paulinho da Viola/Fernando Costa). "Brejeiro" (Ernesto Nazareth), "Flor do Acabate" (Álvaro Sandim) e "São Paulo Quatrocentão" (garoto-Chiquinho). A valorização que o boom do choro trouxe aos instrumentistas é um dos aspectos mais saudáveis deste acontecimento musical que marcou 1977. Instrumentistas como Evandro, que apesar de há alguns anos ter gravado um belo elepê em homenagem a Jacob do Bandolim, só teve em Marcus Pereira o produtor que lhe deu chance de fazer um novo disco, com o seu grupo - atração todas as noites do Jorgal. Agora, com as gravadoras buscando todos os músicos que executam choro, Evandro tem um elepê, feito há doze anos, reeditado na Chantecler; "Meu bandolim no Choro". Um disco que mostra um grande executante de bandolim, acompanhado por afinado conjunto - cujos nomes dos integrantes são omitidos na contracapa, sem qualquer informação - apresentando quatro composições do próprio Evandro ("Meu Bandolim no Choro", "Não te metas", "No tempo do Rapé" e "Manhoso") e outros autores, além da presença de "ben-te-vi atrevido" de Lino Pesce. "Ainda Me Recordo" (pixinguinha-Benedito Lacerda) e (Ernesto Nazareth). Ernesto Nazareth). Válido, muito válido, este reaparecimento de Evandro. E que lhe dêem agora chance de fazer um novo, pois por certo deve ter material inédito... E para que o choro não feneça devido a idade de seus executantes, os jovens também estão integrando-se ao movimento. Há mais de uma dezena de grupo de choro no Rio, cujos integrantes são garoto de 13 a 25 anos (Os Carioquinhas, A Fina Flor, Êramos Felizes etc). Agora, um novo grupo. A Cor do Som, formado por Armandinho, Um, Dadi e Gustavo, são lançados pela WEA (Atlantic, BR 20.027, novembro/77), com grande força promocional. Fazem um som brasileiro, fundindo várias influências, mas numa linguagem meio eletricificada, de acordo com sua idade. A Cor do Som esteve, em Curitiba, no final de novembro, fazendo a primeira parte do espetáculo do grupo pop Liverpool Express - que a WEA e Vasglo trouxeram no Brasil, para uma frustada tournée. Mas o som colorido de Armandinho. Um Dadi e Gustavo não tem nada em comum com o supérfluo pop inglês, aos quais acompanharam. Muito pelo contrário são brasileiríssimo, recriado um clássico de Ernesto Nazareth ("Odeon"), dando um tratamento todo especial a "Tigreza" (Caetano Veloso (e, principalmente, mostrando suas próprias composições: "Arpoador", "Na Onda do Rio", "Espírito Infantil", "Conversando é Que a Gente Se Entende", "Pique Esconde", além de músicas inéditas de amigos-colegas, como o ex-Novo Baiano Morais ("De Tarde na Liberdade"), Tulio Mourão ("Budoque") e Pepeu ("Sambavishnu"). Uma ótima estréia essa d`A Cor do Som. FOTO LEGENDA- As 12 finalistas I Festival Nacional do Choro BRASILEIRINHO FOTO LEGENDA1- Gino Vannelli
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Jornal da Música
1
04/12/1977

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