Login do usuário

Aramis

Cinemateca mutilada com a intolerância cultural

Implantada na administração do engenheiro Saul Raiz e inaugurada há dezesseis anos - exatamente em 15 de março de 1975 - a Cinemateca do Museu Guido Viaro vive a maior crise de sua existência. Coroando um processo de descalabro administrativo-político cultural que atinge hoje vários setores da onerosa Fundação Cultural de Curitiba, a demissão arbitrária, ilegal e violenta de cinco dos funcionários ligados àquela unidade trouxe não só as justas e naturais reclamações de ordem trabalhistas dos servidores atingidos como ampliou, nacionalmente, a rejeição às senhoras Lucia Camargo e, especialmente, a assistente social Celise Niero, que em suas funções de presidente e diretora de ação cultural da Fucucu - ex-Secretaria Municipal de Cultura, conseguiram cristalizar uma oposição à politicagem e sucessivas trapalhadas na área que o prefeito Jaime Lerner sempre considerou como a menina-de-seus-olhos. Embora informado há muitos meses de falhas gravíssimas, irregularidades e atitudes altamente discutíveis tomadas pelas duas diretoras da Fundação Culturas, o prefeito Jaime Lerner - em sua filosofia de prestigiamento dos auxiliares que nomeia - vinha procurando a política de panos-quentes, tentando diplomaticamente - como é de seu feitio - evitar crises maiores. Entretanto o atropelamento dos fatos nos últimos 10 dias, com uma cobertura intensa da imprensa curitibana - e reflexos nacionais - a levaram a rever seus pontos de vista, exigindo explicações e, espera a comunidade, tomar medidas urgentes, necessárias e inadiáveis nas próximas horas. xxx Ausente de Curitiba entre os dias 24 e 28 do corrente, participando de uma reunião preparatória ao Eco-92, evento internacional a acontecer no Rio de Janeiro e do qual espera tirar um aproveitamento que possa beneficiar, mais uma vez, a marketing de "Capital Ecológica" para Curitiba, Jaime Lerner chocou-se ao tomar conhecimento, ainda no domingo à noite, dia 28, ao retornar a Curitiba, do verdadeiro caos ocorrido, sem seu conhecimento - diga-se a bem da verdade - nos últimos dias: a violência sofrida pela Associação de Pesquisadores da Música Popular Brasileira no sábado, dia 20, no Teatro do Paiol; a demissão já na segunda-feira, injusta e arbitrária, do fotógrafo Roberto Pitella, que vinha desenvolvendo um competente trabalho no Centro Cultural do Portão e, especialmente, a demissão em bloco de Francisco Alves dos Santos e mais quatro funcionários da Cinemateca. Se, de um lado, o setor de cinema da Fundação Cultural estava a exigir há tempos uma reestruturação e dinamização - e isto sempre escrevemos, franca e corajosamente em nossos espaços, a fórmula adotada por Lúcia Gluck Camargo e Celise Niero foi a mais desastrosa possível. Desrespeitando a legislação que já garantia aos funcionários da Fucucu o direito de terem optado pelo sistema estatuário, desconsiderando a própria Constituição que trouxe estabilidade aos servidores públicos com mais de 5 anos de serviço e - O que é mais grave - tratando os funcionários demitidos como desonestos, sem lhes dar a mínima chance de explicações, a atitude provocou revolta generalizada de todos que tomaram conhecimento. O grave fato das próprias diretoras terem, na calada da noite, supervisionado a substituição das fechaduras das salas da Cinemateca, para que na manhã de quinta-feira, os três novos funcionários - contratados sem concurso público e por "critérios" que ninguém (a não ser as próprias diretoras) sabem quais sejam - já dá uma idéia da sordidez e covardia com que os fatos se sucederam. No sábado, os principais jornais de Curitiba denunciaram as demissões e a jornalista Rosirene Gemael, editora de arte e cultura do "Correio de Notícias" dedicou meia página para, de forma brilhante, analisar a trama ("Em cartaz na Cinemateca do MGV, o curto-circuito administrativo"). xxx Os três contratados para a Cinemateca, ao que se saiba, sem prestarem concurso - o que contraria a própria legislação - foram os srs. Francisco Carlos Nogueira, Paulo Roberto Rego Barros Biscaia Filho e Paulo Roberto Camargo. Francisco Nogueira, ex-bancário (Bamerindus), é professor do curso de artes cênicas da Fundação Teatro Guaíra, fotógrafo amador e dirigiu no ano passado uma peça que teve repercussão negativa junto ao público. Dos outros dois contratados não se conhecem maiores dados - a não ser que não são "cinéfilos apaixonados". (sic) xxx Através do advogado trabalhista Wilson Ramos, Francisco Alves dos Santos (15 anos de casa), Sandra Borne, Clara Satiko Kano (10 anos de casa), Willi Schulmann e Geraldo Piole deram entrada a reclamação trabalhista. Amparados pela Constituição - e considerando a forma com que foram demitidos, têm grandes chances de obterem a vitória na Justiça do Trabalho. Geraldo Piole e Sandra Borne são também protegidos porque ocupam cargos na diretoria do Sindicato dos Servidores Municipais. Miriam Lau, que era funcionária da Cinemateca, em solidariedade também se afastou, passando desde a última quinta-feira para o setor de literatura. Anteriormente, o cinegrafista e operador Cido Marques tinha sido removido para o Centro de Criatividades. LEGENDA FOTO - Francisco Alves dos Santos, crítico e pesquisador, 15 anos de Cinemateca, humilhado e demitido devido a prepotência de pessoas insensíveis ao seu trabalho cultural.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
05/05/1991

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br