Criança é o alvo no tiroteio do consumo
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 11 de outubro de 1987
O alvo é a criança. Não pode existir melhor consumidor - que mesmo sem renda própria influi poderosamente nas compras. Não há especialista em marketing que negue esta realidade. Exemplos não faltam. Xuxa, uma simples modelo, conseguiu se tornar a "cantora" (sic) de maior vendagem (quase 3 milhões de exemplares do segundo lp, Sigla/Som Livre) da história da fonografia brasileira - apenas um dos segmentos que vem explorando graças ao carisma que passa aos "baixinhos".
Anualmente, os gerentes de produtos das gravadoras tem que buscar intérpretes que cheguem a fatia jovem-mirim, dentro de um organizado plano de vendas. Altamente rotativo, a começar pelo próprio crescimento dos artistas (sic), o que foi sucesso em 1985/86, hoje já não funciona mais. A Turma do Balão Mágico já teve sua vez - e as tentativas de fazer de Simony e Jairzinho uma dupla adolescente musical até agora não emplacaram, em que pese toda a competência dos homens de marketing e promoção da CBS. A série "Disco Baby", que ajudou, há 4 ou 5 anos, a combalida Copacabana a sair do vermelho também já esgotou, assim como Gretchen, com toda sua sensualidade mas, curiosamente, chegando ao público infantil, também caiu das paradas de sucesso. O Trem da Alegria, que estava nos trilhos da RCA para disputar a mesma rota, também teve que renovar seus maquinistas-cantores.
Portanto, no mercado de música infantil - com versões ou composições de autores brasileiros, na linha mais ingênua e de consumo de modismos - a renovação e o senso de momento é o que mais conta. Portanto, não é sem razão que a RGE, hoje associada a Sigla, e reciclada em termos de marketing, depois de alçar vôos maiores nas batidas do pagode, aproveite a motivação da Semana da Criança neste mês de outubro para insistir em três produtos novos, lançados na praça com bom esquema promocional: os grupos Chocolate, Toca do Coelho e Meia Soquete.
Cláudio Fontana, cantor que tentou aparecer na época da Jovem Guarda, assumiu a chegada dos quarenta anos e inteligentemente soube ver nas crianças uma nova faixa de consumo. Assim, há dois anos, na euforia consumista que a passagem do Cometa Haley poderia provocar (e que foi o grande blefe, pois ninguém conseguiu ver o cometa) compôs uma música com este tema, gravando-o com seus filhos e nascendo assim o grupo Chocolate. O disco vendeu tanto que valeu um lp do conjunto, no qual foram incluídas outras musiquinhas de consumo ("Nega do Cabelo Duro", "Frikote do Saci" etc.). Agora, o grupo Chocolate faz o segundo elepê, no qual Cláudio Fontana continua a fazer aquilo que define como "repórter musical", justificando os "temas atuais" de suas músicas. A faixa que puxa o disco é "Superman", naturalmente com um marketing previamente garantido pelo lançamento do quarto filme da série e com a presença sempre segura do personagem criado por Joe Shuster nos quadrinhos.
Há 4 anos, Juldete Coelho de Carvalho, do bairro de Itaquera, SP, criava o grupo Toca do Coelho - reunindo crianças da família Coelho. O Toca do Coelho fez o roteiro dos programas de TV voltados às crianças e com uma formação de cinco meninos e uma menina - chega agora num elepê, no qual a RGE decidiu aproveitar o grupo para interpretar "Pagode" em tamanho-infantil (pois é!). O carro-chefe é "Bons Conselhos", já bastante divulgada nas FMs de Curitiba graças ao eficiente trabalho de Darcy do Espírito Santo.
Finalmente, para uma faixa um pouco mais crescida, a RGE traz o quarteto Meia Soquete, com roquinhos, doces baladas românticas e um certo clima de nostalgia, com arranjos de hits de décadas passadas. Anne Cinthya, Kalu, Adriene e Débora formam este conjunto de meninas simpáticas, que cantando composições como "Você é um Perigo", "Loucuras e Manias", "Miss Chicle de Bola" e até uma regravação de "Lacinhos Cor de Rosa" pretendem chegar a faixa dos 12/16 anos de uma geração de comportamento bem diferente daquela dos anos 70/60.
Enviar novo comentário