A criatividade dos curtas e médias
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 29 de abril de 1987
Enquanto dois documentários em longa-metragem disputam na bitola 35mm - "Nem Tudo É Verdade" e "História Do Brasil", dos cineastas catarinenses Rogério Sganzerla e S. Back - nas mostras de 16mm, este ano realizadas à tarde, no auditório do centro de convenções do Hotel Serrano, pode-se ter uma bela visão dos aspectos diferentes do Brasil.
A exemplo do Festival de Brasília, a mostra de curtas e médias metragens que Gramado proporciona é uma (rara) oportunidade de se conhecer trabalhos inquietos, criativos, e corajosos, abordando coisas, temas e pessoas de nosso País - em filmes interessantes mas que, infelizmente, não têm ainda distribuição comercial. Isto sem falar no Super 8, cuja mostra competitiva realiza-se, teimosamente, pelo 10º ano, apesar da redução da produção nesta bitola - hoje praticamente substituída pelo vídeo.
O Brasil realizou sete filmes em 16mm, que desde ontem estão em competição - e sendo analisados pelos jurados Alain Fresnot (diretor e montador, premiado no ano passado com seu filme curta "Amor Que Fica"), Luiz Fernando Carvalho, Ademar de Oliveira, Pilla Vares (jornalista e escritor), Marlise Sauerissig (atriz), David Quintans e Jesus Pfeil (cineastas gaúchos) e Alcino Leite Neto - três são documentários, todos fortemente voltados para as questões dramáticas do homem que trabalha a terra. "Quem Matou Elias Z", de Murilo Santos (MA, desenho animado), "Mulheres Da Terra" (SP) de Marlene França (programado para o próximo dia 15 de maio, Cinemateca do Museu Guido Viaro, com a presença da realizadora) e "Fibra", de Fernando Beléns (BA). Os três filmes partem da constatação de uma determinada realidade social quer seja o assassinato de um líder camponês, das mulheres bóias-frias e dos mutilados da indústria do Sisal (na Bahia, mas como os do rami na região de Uraí, norte do Paraná) para dar o seu recado e fazer o seu protesto.
Dois dos filmes de enredo-ficção - "Joilson Marcou", de Hilda Machado (RJ) e "A Cor Da Luz", de Mário Kuperman (SP) fundem a ficção com o documentário. No primeiro, garotos marginais lutam pelo dinheiro para adquirir tóxicos. No segundo, um tema atualíssimo, o fechamento de um cinema do interior. Só que Kuperman (que em 1972 realizou o longa "O Jogo Da Vida E Da Morte", adaptando "Hamlet" de Shakespeare para a atualidade brasileira) inclui no seu filme um dado otimista: o cinema fecha mas surge um cineclube local. Os outros concorrentes em 16mm são "Aurora", de Beto Brant e Renato Clasca (SP), inspirado na novela "O Céu Em Minhas Mãos", do argentino Mempho Giardeli ("Luna Callente"), sobre a primeira paixão de um adolescente, enquanto que "Impresso À Bala", de Ricardo Favilla (SP), narra a estranha relação que se estabelece entre um repórter policial e o autor de vários crimes que movimentam a opinião pública.
MÉDIAS-METRAGENS - Atendendo sugestões e reclamações de realizadores de médias metragens (com mais de 15 minutos e menos de 60 minutos), o festival criou este ano uma amostragem de filmes nesta dimensão. Com exceção de "Avesso Do Avesso", de Antônio Souza Filho (SP), os demais são documentários, "buscando estabelecer uma relação entre o cinema e o espectador", como acentua o crítico e historiador do cinema gaúcho Tuio Becker, num ótimo suplemento do jornal "Correio do Povo", com 8 páginas inteiramente dedicadas ao festival.
Em "Avesso Do Avesso", Souza Filho busca estabelecer uma relação entre o cinema e o espectador e constrói uma história curiosa, onde uma fábrica de placas e estátuas de gesso apaixona-se por uma estrela de filmes pornográficos. Imaginando-se um herói do faroeste, algo entre Clint Eastwood e Franco Nero em "Django", ele mergulha no universo de sonhos do qual torna-se difícil sair. Já os cariocas Patrícia Monte-Mor e José Inácio Parente em "Rio De Memórias" desenvolveram um filme sobre fotos do Rio de Janeiro no início do século.
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