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Aramis

De como se desperdiça uma mostra de filmes poloneses

No início dos anos 60, os festivais do cinema polonês que aconteciam em Curitiba se constituíam em grandes eventos culturais. O então atuante Departamento de Cultura, dirigido com eficiência por Ênnio Marques Ferreira, coordenava as promoções, com sessões no auditório do Colégio Estadual do Paraná. Catálogos com informações detalhadas sobre os filmes e seus realizadores, com cuidadosa programação gráfica de Fernando Velloso - então o braço-direito de Ênnio no Departamento de Cultura se constituíam em verdadeiras publicações informativas. O Cônsul-geral da República Popular da Polônia, Piotr Glowacki, um atencioso diplomata, elegantíssimo, com sua bem cultivada barba branca, sabia fazer um trabalho inteligente de relações públicas e a cobertura que cada Festival do Cinema Polonês recebia era imensa. Paralelamente aconteciam também exposições dos cartazes poloneses, técnica em que os polacos são mestres há décadas. xxx Estas lembranças vêm a propósito da pífia promoção iniciada, praticamente clandestinamente, no último domingo: um festival de filmes poloneses, que estão sendo exibidos na Cinemateca do Museu Guido Viaro sem qualquer promoção. Houve, é bem verdade, um "coquetel de inauguração", na noite de domingo, quando foi exibido "Agente nº 1" (filme de 1971, realizado por S. Woytewicz (?). Entretanto, os convites não chegaram sequer a serem distribuídos e não houve qualquer divulgação maior do evento. Na segunda-feira, menos de 30 pessoas assistiram o segundo filme da programação, "Va Banque", 1981, de J. Machulski - e cuja segunda parte, programado para terça-feira à noite, acabou sendo suspensa "por motivos técnicos" e substituído por um filme infantil - "Academia do Senhor Borrão", 1983, de K. Gradowski, que destinado às crianças deveria ser reservado para sessões vespertinas, no fim-de-semana. xxx Desde que Piotr Glowacki deixou o Consulado Geral da República da Polônia nunca mais houve um diplomata realmente preocupado em ter uma integração cultural e, especialmente, atento à imprensa - mal, aliás que atinge também outras representações diplomáticas aqui sediadas. Consta agora que os novos diplomatas poloneses, há poucos meses em Curitiba, estão preocupados em recuperar o espaço cultural perdido nestes anos e a pressa com que esta Mostra do Cinema Polonês foi programada faz parte, justamente, desta nova política. Isto é, ao menos, o que foi alegado para justificar a inexistência de qualquer material informativo sobre os filmes reunidos - produções antigas, de cineastas sem maiores referências e incluindo uma produção do único diretor da seleção mais conhecido, Andrzej Wajda, "Sem Anestesia" (Bez Snieczulenia, 1978), já lançado comercialmente no Brasil, dentro do pacote de filmes poloneses que a Carybe Produções trouxe há alguns anos. xxx É lamentável que mostras representativas de filmes realizados em diferentes países - e que raramente obtém distribuição comercial - continuem sendo confinados na incômoda e desconfortável sala da Cinemateca do Museu Guido Viaro. Afinal, a Fundação Cultural explora três excelentes salas que poderiam abrigar mostras internacionais, com várias sessões por dia, oferecendo alternativas a um público interessado. Também se deveria fazer um trabalho junto à comunidade polonesa, divulgando os filmes programados e atraindo maior número de espectadores. Infelizmente nada disto é feito. Os filmes são projetados em uma única sessão - 20h30min - numa sala desconfortável, que com o calor se torna uma verdadeira sauna. O velho aparelho de ar condicionado ali existente há muito precisa ser substituído, pois atualmente pouco refresca e faz um terrível barulho, interferindo na projeção. Desligado, torna a sala uma sucursal do Inferno - aliás, que parece ser característica de alguns espaços oficiais (veja-se o caso do asfixiante Teatro Universitário, que, no verão, deveria ser interditado). xxx É questionável que a Fundação Cultural se preocupe tanto em explorar comercialmente as salas de exibição que recebeu gratuitamente, concorrendo com a iniciativa privada, quando as mostras culturalmente justificáveis são confinadas à incômoda Cinemateca. Há muito que as atividades da Cinemateca, em termos de exibição, já deveriam ter sido transferidas para o Cine Groff. Entretanto, a ânsia de lucratividade, fazendo da exploração das salas de exibição uma das fontes de renda para a Fundação poder arcar com seu imenso quadro de funcionários, faz com que nem se considere a hipótese de destinar a sala Groff para exibições que não sejam de lucros.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
17
12/03/1987

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