Login do usuário

Aramis

Disco do Ano

Nara Leão e Simone são cantoras de estilos e formações diferentes. A ex-musa da Bossa Nova, que, em 1963, ao fazer o seu primeiro lp, surpreendeu seus admiradores, preferindo sambas do então desconhecidos Cartola ("O Sol Nascerá"), Nelson Cavaquinho, Zé Ketti, João do Valle e outros compositores humildes e, então marginalizados dos circuitos empresariais, nunca foi uma vocalista de grandes efeitos mas, em compensação, sempre foi a grande INTERPRETE, de rara sensibilidade, profunda consciência social e política, segura executante de violão e que, ao longo de 15 anos de carreira, tem uma discografia da maior dignidade. A baiana Simone, alta, vigorosa, é uma explosão vocal, desde que - caso raro, na vida musical - estreou já em elepe, há cinco anos passados. Bem orientada, por produtores de sensibilidade como Hermínio Bello de Carvalho, a cada novo elepe alcança novas etapas - em sua carreira e hoje, sem dúvida, divide com Nana Caymmi, e Elis Regina - o tripé das cantoras de maior força da atual MPB. "Os Meus Amigos São Um Barato" ((Phillips(, 6349338, agosto/77) e "Face A Face" (Odeon, SXMOFB 3931, agosto/77), com Nara e Simone, respectivamente, não são apenas dois dos discos mais importantes do ano, como registros daquilo que se faz hoje, em vários roteiros, na canção popular em nosso país. Nara, que tem rareado suas gravações, sempre com muita consciência, depois de um disco de canções de acalanto, dedicado aos seus filhos Isabel e Francisco ("Meus 15 anos", (Phillips(, 76) e a participação em "Os Saltibancos" ((Phillips(, maio/77), desenvolve agora uma nova e fascinante experiência: com 12 amigos - compositores, apresenta um repertório em grande parte diferente do estilo intimista, acolhedor - mas profundamente participante, que sempre a caracterizou. Lamentavelmente, amigos velhos foram esquecidos - como os já citados Cartola e Nelson Cavaquinho e em compensação Narinha surpreende com amizades que ninguém imaginava - como a do "tremendão" Erasmo Carlos, de quem Nara gravou, "Meu Ego" parceria com Roberto Carlos. As dançantes "Sarará Miolo" (Gil) e "Odara" (Caetano Veloso) abrem o lado A, onde temos o bom acordeonista Dominguinhos, dividindo com Nara a sua música "Chegando de Marsinha" (parceria com Anastácia) e "Repente", de Edu e Capinam, naturalmente com a participação de Edu. Mas se o primeiro lado é com estes "amigos", no segundo encontramos os melhores compositores: a abertura é com um amigo novo, apresentado pelo produtor do lp - Roberto Santana: o baiano Nelson Rufino, a grade revelação como compositor em 76, e que veio especialmente ao Rio para gravar com Narinha, o seu sincero samba "Nonô", quase uma meta-canção, falando justamente da música. O time que vem a seguir é, como diz Roberto Berro covardia - e contribui para equilibrar as presenças (negativas) de Erasmo, Gil e Caetano, no outro lado da "bolacha": Chico Buarque, com "João e Maria" (letra colocada num velho tema do acordeonista Sivuca, que participa, é claro, da gravação), João Donato com "Amazonas" (letras de seu irmão Lysias Enio), Roberto Menescal com "Flash Back" (letra de Ronaldo Boscoli), Carlos Lyra com "Cara Bonita" e Tom com "Fotografia". A voz sempre suave e camerística de Nara, seu jeito de mulher-irmã-amiga-amante, simplicidade e ternura, enternecem e encantam. E no encarte que acompanha o disco fala da escolha das musicas. Inclusive lembrando que sua primeira gravação foi num disco de Carlinhos ("Depois do Carnaval", (Phillips(, 1973), na faixa "Maria do Maranhão". Se Nara é (ainda) timidez-encanto, a baiana Simone é explosão, é como um potro selvagem, belo, indomável. Ela que teve a sorte de ter, no início de sua carreira, a orientação de amizade de Hermínio Belo de Carvalho, com que fez um dos mais belos discos de 1975 - depois de ter, ao lado do violinista João D'Aquino e Roberto Ribeiro, participado da Brasil Export, em Bruxelas, e apresentando-se em Paris, decidiu, agora, tentar um saldo sozinho. Se, fonograficamente, o resultado não a compromete - pois "Face A Face", é um disco vigoroso, adulto - no palco, na temporada que faz num teatro em São Paulo, é desastrosa, chegando a incluir autores menores, absolutamente indignos de sua voz, como Roberto-Erasmo Carlos. Mas fiquemos no disco, que tem, autores da maior voltagem como Sueli Costa-Cacaso ("Jura Secreta", "Face A Face"), - Milton Nascimento ("Primeiro de Maio", parceria com Chico; "Reis e Rainhas do Maracatu", parceria com Noveli, Nelson Angelo e Fran) Chico Buarque ("O Que Será", com uma terceira versão de Letra; "Valsa Rancho", parceria com Francis Hime); Fernando Brandt ("Céu de Brasília", parceria com Toninho Horta; "Paixão e Fé", parceria com Tavinho Moura e "Canôa, Canôa", parceria com Nelson Ângelo, esta uma das melhores faixas do disco) e, por último, uma regravação: o antológico bolero de Gonzaga Jr, "Começaria tudo Outra Vez". Simone merece muitos adjetivos, merece muito mais espaço e na falta deles, aqui fica apenas a recomendação: está excelente e seu disco(,( vale (tranqüilamente( o que custa. Ora se vale.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Música
30
21/08/1977

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br