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Aramis

Discos do ano

Desde 1973 a cantora Beth Carvalho tem uma responsabilidade muito grande: seu disco anual passou a ser aguardado por um público fiel como um acontecimento da maior importância, em termos da melhor emepebe. Depois de "Canto por um Novo Dia" - onde iniciou um reencontro com a melhor MPB, os sambas mais autênticos e puros de compositores como Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito, que passaram a se constituírem numa espécie de gurus musicais de seu repertório - Beth ganhou um lugar de maior destaque e importância dentre as vocalistas brasileiras. Seu "Prá Seu Governo", lançado no ano passado, ganhou lugar seguro na lista dos melhores lps do ano, de forma que agora se esperava, com a maior ansiedade, seu novo disco. - E, felizmente, "Pandeiro e Viola" (Tapecar, X-33, novembro/73), mostra que a comunicativa Beth não deixou a peteca cair. Embora não encontremos nenhuma faixa da dimensão de "Tesoura Chega" (Cesar Costa Filho/Walter Queiroz), a melhor faixa do lp de Beth no ano passado, o repertório que selecionou para "Pandeiro e Viola" é da melhor qualidade. Mesmo que não se queira, estabelece-se uma comparação entre os lps de Beth e Clara Nunes - hoje as duas mais importantes sambistas [brasileiras]. Uma comparação perigosa, pois cada uma tem seu próprio estilo, embora aproximadas no amor a música do povo e a valorização dos bons compositores. E se o lp de Clara ("Claridade", Odeon, setembro/75) já passou das 300 mil cópias vendidas, é possível que "Pandeiro e Viola" também atinja uma cifra igual, já que qualidade e comunicabilidade não lhe faltam. Pessoalmente - e fazemos questão de aqui salientar essa posição - preferimos a voz de Beth, mais acolhedora, terna e suave - embora reconheçamos imensos méritos em Clara, sem dúvida uma grande cantora. Beth Carvalho, é bom recordar, carioca da Gamboa, ligada a emepebe desde a infância, começou a aparecer para o público ao defender no III Fic, "Andanças" de Paulo Tapajós / Eduardo Souto. Mas só há dois anos é que encontrou, nas raízes do povo, o caminho que a consagraria. Beth tem toda a razão em dedicar os seus discos a Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito ("por toda emoção que me causam a cada instante a sua obra e o seu viver") pois eles, anualmente, lhe reservam trabalhos dos mais inspirados. Agora, temos este antológico "O Dia de Amanhã", uma letra "bom caráter", honesta e pura: "não é preciso me agradecer/ Pelo bem que eu fiz a você. Não sei o meu dia de amanhã / Também posse precisar de alguém me ajudar". Mas há outras jóias da música popular neste elepe excelente: "Eu Só queria Ser Feliz de Ruy Quaresma. "O Pior é Saber" de Walter Rosa", "Amor Sem Esperança" de Yvone Lara e Décio Carvalho, "De Novo Desamor" de Gisa Nogueira" e "Cansaço" de Edmundo Souto e Paulo Cesar Pinheiro. Há uma perfeita revisão de um dos mais irônicos sambas de Noel Rosa (1910-1937) - "Onde Está a Honestidade?", e também um novo os melhores do ano: "Gota d'água", Uma letra que é um achado de poesia: "Deixe em paz meu coração/ Que ele é um pote Até aqui de magoa / E qualquer desatenção Faça não / Pode ser a gota d'água". Há três sambas menores, descontraídos, que se não chegam a comprometer o elepe, são indignos da voz privilegiadíssima de Beth: "Pandeiro e Viola" de Garcia do Salgueiro (a faixa mais fraca); "Enamorada a o Sambão" de Martinho da Vila, e "Sente o Peso do Couro", de Norival Reis e Vicente Mattos. De Monarco, é um samba nostálgico e profundo: "Amor Fiel", com letra simples mais brasileiríssima. Independente do nível do repertório e da beleza da voz de Beth - uma cantora que sabe dizer as palavras de forma certa e precisa, este elepe vale também pelo excelente grupo de instrumentistas convocados pelo produtor Ed Lincoln para acompanhar nas diferentes faixas. Além de uma secção de cordas com mais de 10 violinistas, temos 7 violas, 4 contrabaixistas, 3 executantes de cavaquinho (incluindo Jonas e Canhoto), Luís Claudio e Neco no violão: Dino e Waldir no violão de 7 cordas; Menezes e Deo Ryan no bandolim (ambos com merecidos solos), Menezes no violão tenor, além de Altamiro Carrilho, Jorginho, Celso - Mauro e Alceu na flauta; Edmundo Maciel no trombone, entre outros instrumentistas notáveis. Ótima também a secção de ritmo e percussão, além de um excelente coral, integrando entre outros, por Cybelle do Quarteto em Cy. Os arranjos foram de Ed Lincoln, Orlando [Silveira] e Paulo Moura. Enfim, um disco belíssimo, que mostra, mais uma vez, que boa voz, bom gosto e inteligência são fundamentais para uma cantora manter seu público e fazer crescer cada vez mais sua carreira. Boa, Beth, continue assim ...
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Música
28
23/11/1975

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