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Aramis

Do Nativismo à vanguarda a gauchada em bom astral

Um levantamento realizado pelo Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore, há dois anos, indicava que somente nesta década, mais de 800 artistas gaúchos haviam chegado ao disco - enquanto a fonografia daquele Estado já ultrapassava 3 mil títulos. Números consideráveis e que mostram a força da indústria cultural - setor música - do Rio Grande do Sul, com atuantes etiquetas regionais (Isaec, Quero-Quero, Pialo, Discoteca, etc.), e principalmente, a atenção que gravadoras nacionais dão aos artistas locais. Dos artistas mais populares, acordeonistas, cantores, conjuntos regionais - a propostas avançadas, jovens como Victor Ramil, Nei Lisboa e Bebeto Alves, há todo um elenco de opções que fortalecem cada vez mais a música que vem do Sul. Só um produtor, o elétrico, ativo e querido Airton dos Anjos - o "Patinete", realizou, direta ou indiretamente, mais de 300 discos, revelando inúmeros talentos, registrando em discos dezenas de festivais nativistas. Nomes nacionais saíram do Rio Grande do Sul e todo mês há novos discos, que, na maior parte das vezes, se pagam somente com as vendas no Estado - de forma, inclusive, que faz etiquetas regionais como a Quero-Quero, de Gilberto Carvalho - especializado em produção de discos dos festivais regionais, ou a Discoteca, nem se preocuparem em manter representantes para vendas e divulgação em outros Estados. Por exemplo, gravações dos festivais nativistas - não só dos mais consagrados, como o pioneiro Califórnia, em Uruguaiana, ou o milionário Musicanto, em Santa Rosa - mas mesmo de cidades menores, vendem toda a tiragem, tornando o registro das finalistas um projeto perfeitamente autofinanciável. Ainda há pouco, a Continental - que com a competência regional de Airton tem uma liderança na produção musical gaúcha, lançou o elepê com as 12 finalistas do 5º Musicanto Sul Americano de nativismo, realizado em Santa Rosa - e que este ano teve a participação de concorrentes de vários Estados, inclusive do Paraná (Elecir de Antonina). O paulista (de raízes curitibanas) Paulo Garfunkel mesmo não ficando entre os finalistas, trouxe o prêmio de melhor instrumentista de sopro. O vencedor do Musicanto foi Elton Saldanha, compositor e intérprete com "Baguala", enquanto Talo Pereira - nome crescente do nativismo, dividiu com José Sarturi o segundo lugar ("Fogo Morto") e Gil Damata a terceira classificação com "Festa Morena". Mas se de um lado há a forte música nativista, existe também uma presença cada vez maior de compositores urbanos, com propostas avançadas. Caso curioso é de Bebeto Alves, nascido em Uruguaiana, tendo inclusive participado de algumas Califórnias, mas que optou por uma linguagem eletrônica. Lutador, decidido a ocupar seu espaço, vem fazendo shows, gravando e lutando há mais de 7 anos. No ano passado, passou uma temporada nos Estados Unidos e, voltando mais amadurecido, fez um elepê ("Pegadas", Continental), no qual desenvolve em canções de letras alongadas (e portanto de difícil comunicação), discursos políticos de sua visão do mundo, muitas vezes dramática - como na canção título, em "Beirute" ou "O Sobrevivente" e até numa atrevida música com letra em inglês "From the Other Side", de seu amigo e parceiro Cláudio Leviatan. Instrumentalmente há bons momentos, como o piano de Fernando Corona em "Beirute", e uma harmônica de boca no balançante "Depois da Chuva", uma das faixas mais comunicativas deste elepê. Nei Lisboa constitui, ao lado de Nelson Castro (que já residiu algum tempo em Curitiba) e Victor Ramil, o tripé dos compositores mais inquietos do Rio Grande do Sul. Há cinco anos, surgia com um elepê independente ("Pra Viajar no Cosmos não Precisa de Gasolina"), repleto de inovações. Cida Moreira, cantora de grande voz e bom gosto, se entusiasmou com as músicas de Nei e passou a divulgá-lo. Em 1984, Nei fazia novo disco, já então pela Polygram ("Noves Fora"), mas não teve o reconhecimento merecido. Entretanto, não desistiu e continuou na estrada ganhando, no ano passado, a chance de um novo elepê ("Carecas da Jamaica", EMI/Odeon), onde prossegue sua linha extremamente pessoal, com letras bem trabalhas e críticas como "Deixa o Bicho" (parceria com Humberto Gessinger), "Verão em Calcutá", "Junky" e "Schultznictsin is Down".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
17
28/02/1988

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