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Aramis

Enfim, um belo disco de canções para as crianças

No momento em que a iniciação musical passa a preocupar-se (seriamente?) as autoridades ligadas a educação, um assunto volta a merecer atenção: a necessidade de haver discos próprios para despertar nas crianças o entusiasmo pela (boa) música. Reconheça-se, de princípio, que a geração 1970 é essencialmente musical. A facilidade de comunicação (rádio/tv/cinema), a criação de mitos de fácil aceitação - dos Beatles aos secos & Molhados - colaboram para fazer com que as crianças, tão logo tenham percepção do mundo, passam a se interessar pela música. Acontece - e ai esta o X da questão - que o interesse é logo canalizado para a música estrangeira, de forma que a geração que está aí pelos 12 a 18 anos - potenciais compradores de discos - acaba optando pelos ídolos estrangeiros, por falta de uma iniciação, criteriosa e inteligente, a MÚSICA POPULAR BRASILEIRA. Temos, aliás, a este respeito, uma proposta audaciosa: a necessidade da boa MPB ser ensinada nas escolas do primeiro grau, a fim de que as crianças ao mesmo tempo que começam a aprender as primeiras letras também comecem a entender o que de melhor existe em nossa MPB. Como poucas famílias tem condiçòes intelectuais/financeiras de orientar as crianças um racional aprendizado musical, acontece o óbvio: os Beatles tornam-se mais importantes do que Chico Buarque ou Noel Rosa e só mesmo Caetano Veloso ou Raul Seixas, com suas concessões conseguem alguma comunicação com as jovens platéias. E o assunto torna-se ainda mais sério na primeira infância - na conquista das crianças de 2 a 5 anos, quando começam a aprender a falar - e logo também a se interessar pela música. São raros os discos capazes de auxiliarem os pais, nesta fase, a uma lúcida orientação para as crianças. Esquecendo os lps ou um compacto de historinhas infantis - que também são poucos, um dos raros lançamentos importantes neste setor foi feito há 4 anos pela Equipe, de Oswaldo Cadaxo e, infelizmente por falta de promoção, dificilmente é encontrado nas lojas: o lp "Escolha do Instrumento pela Criança", acompanhado de um livro de 65 páginas de José Kajuboviez, onde, numa forma de teste vocacional, procurou-se descobrir quais os instrumentos que mais agradam a cada criança. Agora, pela RGE, aparece um lançamento que justifica este comentário especial: "Cantigas de Roda Para O Seu Filho Aprender A Cantar". Amparado em discretas harmonizaçòes do maestro Hector Lagna Fietta - e como observou J. R. Tindorão (JB, 3/5/74), a descrição no caso conta a seu favor, pois se enfeitasse demais as melodias lhes roubaria a espontaneidade e frescor - o disco apresenta 12 cantigas de roda, historinhas e um acalanto - o "Dorme Nenê". E temuma novidade didática: após o coro que ensina letra e melodia, existe para as crianças cantarem sozinhas com a música tocando ao fundo. É uma forma inteligente de despertar nas crianças a partir dos 2 anos, o entusiasmo pela nossa música de roda, tão esquecida, que há 34 anos já preocupava a musicologia Marisa Lira, que num artigo na "Revista da Semana" (Rio de Janeiro), citado por Tinhorão, afirmava, em tom pessimista: - "As crianças de hoje não cantam nem ouvem cantar cantigas infantis. Não adormecem mais ao som dos ingênuos acalantos que foram a base de nossas tradições". Se há 3 décadas, Lira já se preocupava com isto, quer dizer agora, em nossa neurotizante sociedade de consumo em que as crianças aprendem antes a cantar o último sucesso dos Rolling Stones do que uma cantiga como O cravo brigou com a rosa Debaixo de uma sacada O cravo saiu ferido, a rosa despedaçada O cravo ficou doente A rosa foi visitar O cravo teve um desmaio, a rosa pôs-se a chorar. Só este aspecto já faz com que o lançamento da RGE seja saudado com o maior entusiasmo e é de se esperar que a gravadora se anime a lançar outros discos do gênero - talvez com temas folclóricos, tão desconhecidos não só das crianças, mas também dos adultos. Um lp categoria especial, merecedor da máxima atenção dos pais e educadores este "Cantigas de Roda Para O seu Filho Aprender A Cantar" (RGE/Fermata, 308.0001, maio/74).
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Música
19/05/1974

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