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Aramis

A estrela que renasce com brilho há 44 anos

Em busca dos filmes perdidos. Esta parece ter sido a palavra de ordem lançada há alguns anos, por apaixonados arqueólogos cinematográficos preocupados em recuperar longas seqüências que, nas salas de montagem, foram cortadas de filmes clássicos, para frustração de seus realizadores. Exigências do mercado exibidor refratário a longas-metragens acima do normal (o que prejudica a rentabilidade imediata do filme) tem sido carrasco de muitas obras-primas, levando a guilhotina nas salas de corte fundamentais seqüências concebidas pelos realizadores. Por uma feliz coincidência, nesta semana, dois filmes antológicos são devolvidos aos espectadores com remontagens aproximadas daquelas que seus realizadores haviam idealizado - mas que não puderam vê-los assim exibidos: "Metrópolis", 1926, de Fritz Lang (Luz, 5 sessões) e "Nasce Uma Estrela", 1954, de George Cukor (Groff, 15:15 e 20:30 horas). xxx Assim como aconteceu na Itália, onde há alguns anos foram feitas experiências de reconstituir dois filmes do mestre Luchino Visconti (1906-1976), criminosamente reduzidos, a sua revelia, na metragem final - o belíssimo "O Leopardo" (Il Gattopardo, 1963) e "Ludwig, a Paixão de um Rei" (Ludwig, 1973) - nos Estados Unidos, há cinco anos, encontrando-se algumas seqüências de "A Star Is Born", nos depósitos da Warner Bros., resultou uma reconstituição da montagem original deste clássico de George Cukor. Inicialmente, houve o aproveitamento de um número musical - "Lose That Long Face", apresentado em 1981, na festa de entrega dos Oscars, no momento da homenagem ao compositor Ira Gershwin (Nova Iorque, 6/12/1886-Los Angeles, 17/8/1983). O material inédito, incluindo dois outros números interpretados por Judy Garland ("Here's What I'm Here For" e "Shampoo Comercial"), além de seqüências num total de 27 minutos, levou a Robert Daly, chariman da Warner, a estimular a remontagem de uma cópia na metragem original - três horas - que teve inicialmente projeções especiais em algumas grandes cidades (Nova Iorque, Los Angeles, Washington, Oakland, Chicago, Dallas) em benefício de um programa de restauração de filmes apoiado pela própria Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollyood. Devido a repercussão positiva desta redescoberta de "A Star Is Born", a Warner animou-se a relançá-lo comercialmente, inclusive enviando uma cópia ao Brasil. Fracasso de público em São Paulo-Rio, mas bem recebido em algumas outras cidades, (como Belo Horizonte), "A Star Is Born" foi pessimamente lançado no Groff, na última quinta-feira e, como resultado, a renda está sendo mínima: menos de 200 pessoas foram até agora rever este belíssimo filme que, 32 anos depois, conserva a mesma força, emoção e sensibilidade da época em que estreou, no antigo cine Palácio, que, nos anos 50, exibia com exclusividade as produções da WB. George Cukor faleceu aos 88 anos, em 25 de janeiro de 1983, sem assistir o seu filme restaurado. Magoado com as imposições dos tycoons da Warner - aos quais o produtor Sidney Luft, marido (1953/65) de Judy na época, não conseguiu resistir, Cukor nunca mais havia revisto este filme, para ele uma obra extremamente significativa. Tanto para os que já conheciam "Nasce Uma Estrela", como para uma nova geração é extremamente estimulante/emocionante a oportunidade de (re)ver este filme absorvente, ambientado na própria Usina de Sonhos que era Hollywood e com um tema que, inspirado na vida do casal John Bowers e Margueritte De La Motte, consegue o equilíbrio perfeito entre o musical e o dramático. Cineasta dos mais ecléticos e que se caracterizava pela sua extrema competência em dirigir mulheres, Cukor aproveitou todo o potencial de Judy Garland que, na época atravessava um dos mais difíceis períodos de sua vida. Após 20 anos de musicais marcantes, desde que começou sua carreira (1936, quando ainda se chamava Frances Ethel Gumm), Judy permaneceu 12 anos sem fazer nenhum filme (sua última atuação havia sido em "Casa, Comida e Carinho/Summer Stock", 50, de Charles Walters), excepto "A Star Is Born", onde por sua emocionante criação de Esther Blodgett (depois Vicki Carr) ganhou a indicação ao Oscar de melhor atriz - mas perdendo, injustamente, para Grace Kelly (1928-1982) por "Amar é Sofrer" (The Country Girl, baseado na peça de Clifford Oddets). Judy Garland, que morreria em Londres, a 10 de julho de 1969, aos 47 anos, fez de sua interpretação em "Nasce uma Estrela" daqueles momentos mágicos de garra, energia e sensibilidade, Norman Maine (James Mason, 1909-1984) ajuda a transformar-se numa grande atriz, possibilita que mostre tanto o seu lado de cantora - e que nos anos 30/40 fizeram o grande nome da MGM (desde "O Mágico de Oz" até "O Pirata"), como da sensível atriz, entre a comediante ao dramático, responsável por seqüências marcantes. O Timming empregado por Cukor foi tão preciso, as canções criadas por Ira Gershwin e Harold Arlen (Buffalo, 15/2/1905 - N.Y., 24/4/1986) belas e eternas, que as três horas de "A Star Is Born" passam despercebidamente. É de se lamentar, que, mais uma vez, o público curitibano - mesmo aquela parcela que diz se interessar pelo musical e filmes de dança - deixe de rever, em tela ampla (este foi um dos primeiros filmes fotografados em cinemascope, com um magnífico resultado do câmera Sam Leavitt), um clássico indiscutível do cinema. E que, trazendo Judy, em um Tour-de-force dos mais marcantes, vale como momento inesquecível da magia do cinema.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
13
19/08/1986

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