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Aramis

Falando (francamente) de sexo, o Canadá trouxe o melhor filme

Até agora, em termos de público, o cinema canadense é ainda sinônimo dos curtas de animação de Norman McLarem - que fez escola nos anos 50 e hoje tem uma legião de seguidores. Ainda recentemente a Cinemateca do Museu Guido Viaro apresentou uma amostragem do cinema de animação que é feito no Canadá. Entretanto, a partir de agora, ao menos um filme canadense deverá interessar ao grande público - e possivelmente repetir o êxito de outros filmes que participaram do FestRio em anos anteriores, mostrados "hour concours" obtiveram como "Ran", de Akira Kurosawa, e "Paris, Texas", de Win Wenders. Trata-se de "O Declínio do Império Americano", que desde sua exibição para a sessão da imprensa, na manhã de 23 de novembro, surgiu como o grande favorito do Festival. Premiado pela imprensa no Festival de Cannes este ano (mas não concorreu oficialmente, de forma que pôde vir para o FestRio), "Le Declin de L'Empire American" parece, nos seus primeiros 15 minutos, um filme apelativo em termos de sexo: quatro homens reunidos, ao mesmo tempo, se exercitam numa academia de ginástica. As mulheres falam, franca e claramente, de homens (e às vezes de mulheres). Os homens falam de mulheres (e às vezes de homens). Uma linguagem clara, franca, sem preconceitos. Confessa-se, de parte a parte de um dos personagens masculinos, dizendo inclusive que urinou sangue, numa alusão à Aids. Depois os dois grupos se reúnem num almoço numa bela mansão rodeada de jardins. A conversa continua e um novo elemento se acrescenta, um amante da anfitriã, que chega inesperadamente, amoral, cínico, escandaloso, "O Declínio do Império Americano" cresce em intensidade e emoção e conclui de forma extremamente humana. Um filme vigoroso, sério e adulto, "motivo pelo qual, desde o início, pintou como o grande favorito desta edição do FestRio, repetindo-se aqui o êxito que já havia obtido no Canadá e os elogios internacionais. A Alvorada, ex-Gaummont, comprou seus direitos para exibição no Brasil, e se não fizer o mesmo que ocorreu com "Tangos - Exílio de Gardel", do argentino Fernando Solinas (exibido no encerramento do FestRio-85 e até agora só lançado em São Paulo), é possível que o impacto da premiação deste FestRio-86 ajude a carreira de "O Declínio do Império Americano" em sua carreira comercial. O filme é corajoso, moderno - sem preconceitos na abordagem do sexo na sociedade contemporânea. Desnuda a hipocrisia que parece ser universal em termos de classe média - e isto é o seu grande mérito, além de como cinema ter uma direção seguríssima e ótimo elenco. Um filme pessoal Oitavo longa de Denys Arcand, 45 anos, que por 10 anos trabalhou no National Film Board of Canadá, "O Declínio" é o seu primeiro sucesso. Numa das entrevistas que deu no Hotel Nacional, durante o FestRio, contou das dificuldades para encontrar produtores para este projeto - embora já venha dirigindo seus próprios filmes desde 1972: "Há um ano eu só ouvia que esse filme não ia dar certo e agora estou aqui, vendo ele ser bem recebido", Denys Arcand confessa que procurou fazer um filme pessoal e barato e o mais barato seria filmar bons atores falando. Rodado em apenas 38 dias, com personagens que são todos professores de uma Universidade, "O Declínio do Império Americano" é irônico a partir do seu próprio título. São personagens que querem viver com conforto e sabem que fora da América do Norte há muitos problemas. Eles têm uma preocupação imediata com seu próprio bem-estar, não possuem o espírito de sacrifício das gerações anteriores, que pensavam em construir um mundo melhor para os filhos e não para si mesmo. "O Declínio do Império Americano" é daqueles filmes que surpreendem o espectador a cada seqüência. Numa época de liberação sexual, Arcand realizou um filme que parece ter elementos de uma tese universitária numa linguagem de Edward Albee ("Quem tem Medo de Virgínia Woolf") e uma agilidade notável - sem dispensar um humor corrosivo e de alta voltagem. Enfim, merecidamente um filme de alto astral, que, já na sexta-feira, 28 ganhava sua primeira premiação, ao ser escolhido o melhor filme do 3º FestRio na opinião dos 12 críticos que, a convite de Wilson Cunha, integraram o Júri B do "Jornal do Brasil", que também opinou por Arcand como melhor diretor (5 votos) e apontou Sabine Azema, de "Melo" (do francês Alain Resnais) como melhor atriz e Jack Lemmon, de "That's Life", como melhor ator - e "Frankenstein Punk" como melhor curta. LEGENDA FOTO - "O Declínio do Império Americano", partindo do sexo, foi o melhor do FestRio.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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02/12/1986

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