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Aramis

Gaitas iluminadas de Borghetti e Gilberto

Os dois gaiteiros mais importantes do Rio Grande do Sul estão na praça: Renatinho Borghetti em seu terceiro elepê e Gilberto Monteiro, finalmente com seu primeiro disco-solo. Dois exímios virtuoses, um - Borghetti - conhecido hoje nacionalmente, com um público imenso. Gilberto Monteiro, respeitadíssimo no Rio Grande do Sul, mas desconhecido fora do roteiro dos festivais nativistas. Renato Borghetti, gaúcho de Porto Alegre (23/07/1963) é o primeiro instrumentista brasileiro a ganhar o Disco de Ouro. Seu elepê de estréia, gravado em 1984, com o custo de Cz$ 1.000,00 coberto pelo seu pai, Rudi Pedro Borghetti, foi editado pela Sigla/RBS, quando Ayrton dos Anjos ali produzia uma série de álbuns regionais. O disco vendeu mais de 100 mil cópias e tornou Borghetinho conhecido nacionalmente - e o fez um dos instrumentistas mais requisitados para shows. Em 1985, gravando o seu segundo disco, esbarrou próximo das 80 mil cópias, quando teve as prensagens interrompidas por falta de matéria-prima e algumas outras injunções. Agora, dois anos depois, Borghetinho volta com um novo elepê, em nova fábrica (RCA), produção dedicada a Juarez Fonseca, 42 anos, disc-review da "Zero Hora", autor de vários ensaios sobre a música nativista e que se dedicou por mais de três meses a esta realização. Juarez enfrentou muitos problemas e nos falava, há um mês, de que não pretende, tão logo, voltar a produção fonográfica. O que será pena, pois o seu trabalho para este disco foi excelente. De princípio, Borghetti está hoje muito mais seguro instrumentalmente. Em Tramandaí, Rio Grande do Sul, em novembro de 1986, durante o Acorde da Canção Brasileira, nos surpreendemos com Renato Borghetti atuando com músicos da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre. Um trabalho vigoroso e que revelava sua evolução como compositor e instrumentista. Afinal, tocando gaita-de-ponto desde os 16 anos (na 9ª Califórnia da Canção, em Uruguaiana, já era considerado a grande revelação), Borghetti ainda tem muito chão a trilhar. Vencendo a timidez - o que o faz ainda usar cabelos longos e chapéu que lhe escondem os olhos, bombacha e alpargatas - conquistou a simpatia da juventude. E isto explica o seu êxito comercial. Reverenciando a Tio Bilia, "mestre maior da gaita gaúcha", Borghetti abriu espaço em seu novo disco para quatro outros compositores: o próprio Tio Bilia, com "Bugio Extraviado", o grande folclorista Barbosa Lessa com sua já clássica adaptação de "Negrinho do Pastoreio" (em gravação duo, com Paulo Tomada no violão), o "Chote do Grito", de Albino Manique e Oscar Soares, e o belo "Los Cinco" (Betto Bollo), com toques bem tangueirosos e sua gaita-de-ponto lembrando um bandoneom. As demais faixas são de sua autoria - em parcerias com o violonista Paulo Tomada ("Belém Novo", "Carona Pro Norte"), o também violonista Veco Marques ("Sétima do Pontal", "Memória de Galpão" e "A Vontade"), e uma composição coletiva, com o seu grupo - Veco, Tomada, mais o percussionista Carlos Perez ("Segura Essa"). Sozinho, fez "Cambincho em Alegrete". Descontraído, mostrando intensa segurança no acordeom, Borghettinho comprova a riqueza da música gaúcha, na versão instrumental, neste seu terceiro elepê, com toda a certeza destinado a ter tão boa aceitação quanto os anteriores. Com o dobro da idade de Borghettinho, Gilberto Monteiro, gaúcho de Santiago do Boqueirão, é para muitos o melhor acordeonista gaúcho. Terra de milhares de acordeonistas, que se dividem, inclusive, em diferentes estilos - os da região da Serra e os Pampas, o Rio Grande tem muitos virtuoses deste instrumento. Monteiro, temperamento arredio mas muito talentoso e criativo, é presença segura nos principais festivais nativistas e, em participações especiais, tem feito muitas gravações - inclusive no recente álbum do argentino Antônio Tarrago Ros, seu grande amigo. Agora, finalmente, Ayrton dos Anjos conseguiu produzir um bom disco solo com Gilberto ("Pra Ti Guria", Continental), que, junto com o álbum de Borghettinho, se coloca como entre os melhores do ano. Todas as faixas são do próprio Gilberto, inventivo, harmonioso e sobretudo vibrante em seus temas - que vão da suavidade de "Prelúdio de um Beija-flor" às ironias de "Entrevero de Alpargata" (com a participação especial de Tarrago Ros), "Cabresteando" e "Alumiando as Maçanetas". O acordeom é um instrumento versátil e popular, confundido muitas vezes com o breguismo. Nas mãos de artistas como Borghettinho e Gilberto Monteiro adquire extrema dignidade e pode entrar com instrumento solo, em qualquer recital sinfônico. Estes dois discos são prova disto.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
7
05/07/1987

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