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Aramis

Horácio, o presidente

Comparando com eleições anteriores, pode-se até dizer que foi tranquila a escolha da nova mesa diretora da Câmara de Curitiba, na quente tarde de sábado, 2. Embora não faltassem protestos e acusações de parte a parte, a vitória de Horácio Rodrigues confirmou, antes de tudo, a felpudez desse vereador que há mais de 10 anos sonhava em chegar ao cargo que agora ocupará por dois anos. Quando de sua primeira legislatura, Horácio já pensava na presidência e, há dois anos, na última hora, perdeu o cargo que contava como certo. Assim, foi à luta e, enfrentando muitos vetos e obstáculos, acabou vencendo. Sintomaticamente, entre os muitos presentes na Câmara, sábado, suando bastante devido ao calor, o gordo e influente deputado Aníbal Curi, de longe a raposa mais felpuda que já surgiu no Paraná. Muitos diziam que o "bruxo" peemedebistas ali estava para observar, mais uma vez, os acertos das poções mágicas que colocou no caldeirão político, fervendo bastante nas horas que anteciparam a decisiva escolha. xxx Como entusiasta ex-locutor esportivo, o prefeito Maurício Fruet optou por um regime de concentração de sua equipe, reunindo os vereadores peemedebistas no confortável Novotel, na Cidade Industrial. Ali, em inflamadas reuniões, muita roupa suja foi lavada para que se chegasse a algum consenso, capaz de impedir uma virada-de-mesa na hora final. O vereador Ivan Ribas, sempre brabo e mal humorado, por exemplo, num discurso trovejante, queixou-se de estar sendo discriminado, "como se fosse um leproso político". A concentração política do Novotel não foi, entretanto, uma reunião de tempo integral, e, nas horas de folga, os peemedebistas dividiam-se entre escritórios militarmente distribuídos em dois endereços cívico-bélicos: na Rua Almirante Tamandaré, 496, com o deputado José Borges da Silveira (um dos mais fiéis integrantes do grupo Canet) e na Rua Almirante Barroso, 22, escritório do vereador Rafael Greca de Macedo (do PDS e líder do grupo Pró-Cidade), que, em certo momento, poderia ser o fiel da balança. xxx Como era normal, muitas fórmulas foram tentadas. Parecia até mais uma reunião de químicos, em busca da melhor solução para um explosivo, do que dos homens eleitos pela população para ajudar a administrar a cidade. Horácio Rodrigues, embora um empresário do setor de iluminação pública, deve ter aprendido muito de química, com o irmão caçula, Antônio, físico contratado, hoje, pelo Ippuc, para o setor de transportes e que, com apoio da Fundação Mauá, de São Paulo, sonha em ver a cidade servida por trolebus. Sorridente, engolindo muitos sapos para poder jantar, posteriormente, rãs finamente preparadas, Horácio ouvia, discutia e permutava cargos, apoio e influências, conseguindo, assim, até apoios inesperados. Por exemplo, o rico Luís Gil Leão, vereador de origens pepistas, sócio do senador Affonso Alves de Camargo Netto e do vice-governador João Elísio Ferraz de Campos, nas rádios Caiobá FM/Ouro Verde-AM/FM, foi surpreendente. Até há uma semana, Luís Gil garantia que não desistiria de sua candidatura e que preferia renunciar ao mandato de vereador do que apoiar Horácio. Na última hora, entretanto, retirou-se, em favor de Rodrigues. Também Moacir Tosin mudou de posição, em favor de Horácio, na noite de sexta-feira, ao longo de um político velório, em Cerro Azul, ao qual compareceu, em companhia de Maurício Fruet. Entre os abraços de condolência aos familiares do cabo político falecido, houve muitas conversas de pé-de-ouvido, de forma que, ao retornar a Curitiba, já de madrugada, Tosin havia concordado em garantir a eleição de Rodrigues. Em troca, obviamente, de um prometido apoio a sua campanha para deputado e manutenção de alguns correligionários, em cargos de confiança na Câmara. Entre eles, Cirilo Arco-Verde, diretor de Finanças do Legislativo Municipal. xxx Horácio Rodrigues, que consegue unir a felpudez política e a vivência empresarial, com uma veia artística (é poeta e pintor, nas horas vagas), não esconde que dinamizar a Câmara e fazer com que esse poder recupere prestígio e respeito, ocupará todas as próximas horas. Se até 1983 tinha tempo para fazer líricos poemas ao estilo de Lord Byron (publicados, inclusive, em luxuoso livro-álbum, com desenhos de Luís Carlos Andrade de Lima, capa de veludo, numa edição supervisionada pela Denebre, quando o hoje senador Enéas Faria dirigia aquela agência de publicidade do grupo Nasser), de agora em diante dificilmente o novo presidente da Câmara terá tempo para cuidar de atividades menos concretas. Até seu fiel amigo de devaneios cromáticos, o pintor Augusto Comte, está preocupado: Horácio, de agora em diante, não terá mais tempo para, nos fins de semana, sair pelos arredores da região metropolitana e capturar em brancas telas as bucólicas paisagens da área verde. xxx Quando Horácio Rodrigues chegar à Prefeitura, em substituição a Maurício Fruet, cuja desincompatibilização é tida como certa, já que irá disputar um outro cargo majoritário (no máximo o governo do Estado, no mínimo a Câmara Federal), quem assumirá a presidência da Câmara será um vereador que até hoje se conservava no maior anonimato: Sidney Claudino, homem simples, eleito pelo bairro do Pinheirinho, e que em dois anos nunca usou a tribuna para fazer qualquer discurso. Aliás, da nova mesa diretora da Câmara, excetuando-se Horácio e o primeiro secretário, Sady Ricardo dos Santos, os novos ocupantes são vereadores que raramente se arriscam a fazer pronunciamentos: o 2º vice, João Derosso, mais preocupado em atender os pedidos dos eleitores do que mostrar dons de oratória (mas sempre com um eleitorado fiel); 2º secretário, João Queiroz Maciel, o ex-empresário artístico Neivo Beraldin (reconduzido à 3ª secretaria) e Jairo Marcelino, este especialmente atento, sempre que se fala em assuntos ligados ao transporte coletivo, setor que garantiu sua eleição à Câmara Municipal. xxx Dinheiro não será problema para Horácio Rodrigues fazer uma boa administração. O orçamento da Câmara, em 1985, é generoso: nove bilhões e oitocentos milhões de cruzeiros. Só como verba de representação, para a presidência, há uma dotação de Cr$ 540 milhões, o que significa que a disputa do cargo não foi uma simples questão de vaidade. É poder - e muito poder - para quem se dispõe a fazer algo pela cidade. Um poder que chega a emocionar, como aconteceu, sábado, em certo momento, quando o vereador José Maria, sempre habilidoso e discreto, insinuou a Alípio Leal que ele poderia liderar um chapa de consenso à presidência e, assim, aos 27 anos, acabar prefeito da cidade em que nasceu. Político geralmente duro em seus pronunciamentos, líder do PMDB da Câmara (cargo a que pretende ser reconduzido, na reunião de amanhã), Alípio fraquejou: emocionou-se e chorou nos ombros do amigo José Maria. Só que, tal como Jesus, ao ser tentado pelo Demo, Leal fez jus ao sobrenome e resistiu: já havia empenhado a palavra com Horácio e assim foi até o final. Para ele, a liderança será uma compensação.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
05/02/1985

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