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Aramis

Instrumentistas em alta com o talento de Senise

Infelizmente, o projeto de trazer a Curitiba uma amostragem da melhor música instrumental dançou. Há alguns meses, uma produtora de shows do Rio de Janeiro chegou a reservar datas para, durante 10 dias, realizar no Teatro Guaíra, uma espécie de festival de música instrumental, que incluiria, inclusive o grupo Cama de Gato, quarteto tão criativo que por sua belíssima performance em São Paulo, no Free Jazz do ano passado, foi escolhido para a noite de encerramento do IV Free Jazz (dia 6, no Rio de Janeiro), antecedendo a cantora Nina Simone. Já com dois elepês (Som da Gente), lançados inclusive em CD e com distribuição na Europa, o Cama de Gato é formado por Mauro Senise no sax e flauta; Rique Pantoja nos teclados; Pascoal Meireles na bateria e Arthur Maia no baixo. Independente do sucesso do quarteto, cada um dos integrantes vai fazendo seus discos-solo - Meireles já tem dois (ambos independentes), enquanto Maia e Pantoja preparam os seus. O de Mauro Senise acaba de sair (Vison, uma nova etiqueta que vem dando a maior força à música instrumental). Roberto Muggiati, curitibano, jornalista, editor da "Manchete" e sobretudo, jazzófilo (foi o primeiro a escrever sobre esta música em Curitiba, na "Gazeta do Povo"), também toca sax e tem tido aulas com Senise. Portanto, é ele quem afiança, com seu conhecimento, a categoria de Senise, 38 anos, no registro civil Mauro Alceu Amoroso Lima Senise, que indica seu famoso avô. - "Um dos saxofonistas/flautistas mais requisitados de toda a MPB ao longo de quase duas décadas, Mauro costuma exigir tanto de si que só agora está lançando o seu primeiro álbum individual". Neste seu trabalho, envolvente e pessoal, Mauro confirma sua capacidade de arregimentar talentos. Já na faixa inicial - "Maria três filhos" (Milton Nascimento), sente-se o pulso vital do baixo de Luiz Alves e a marcação vibrante de Robertinho Silva, baterista presente em quatro faixas. No soprano, Mauro é brasileiríssimo e como diz o curitibano Muggiati, no sax alto, "ele se torna intensamente jazzístico". É o que se ouve na bela balada "Saguin" (Toninho Horta, atuando no Violão/Guitarra), com um clima que transparece em outra das melhores faixas, "Tristeza de nós dois", clássico da bossa-nova (Durval Ferreira/Maurício Einhorn/Bebeto), imortalizado pelo Tamba Trio, mas que tem uma releitura moderna de Mauro - provando que o que era bom e bonito nos anos 50 ainda pode ser bom e bonito nos anos 80, mas não do mesmo jeito - e o chega-de-saudade é dado pelo tom raivoso e urgente do sax alto, temperado pela cascata melódica de Luizinho Eça nos teclados - como um bom Beethoven da Bossa. Há duas composições de Hugo Fattoruso ("STC/PM") na qual Mauro mostra os sólidos ensinamentos da flauta clássica que lhe passou Odeth Ernest Dias (o curitibano Norton Morozowicz também lhe deu algumas aulas) enriquecidas por milhares de horas de vôo jazzístico. Um exemplo de improviso é "18 de maio", nascido espontaneamente, do sax alto de Senise e do cello de Jacques Morelembaum - um vôo livre, mas que cumpre uma lógica de rigor geométrico - coisa que só poderia acontecer com estes dois (nascidos no mesmo dia, daí a razão da data-título). Já em "Weekend", uma composição (e arranjo) de Luiz Eça, na qual Mauro explora o flautim, instrumento difícil e pouco (ou mal) usado na música brasileira. A última faixa foi reservada para o "campeão" Hermeto Paschoal (com quem Mauro já trabalhou inclusive participando do histórico LP "Zabumbê-bum-a"). Convidado especial, Hermeto desenvolveu em 20 minutos a faixa "Esta é nossa e ninguém tasca", que como bem diz Roberto, é um dos temas mais complexos saídos de sua mirabolante carreira. LEGENDA FOTO - Mauro Senise: 20 anos de estrada musical e agora o primeiro vôo solo.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
30/09/1988

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