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Aramis

Karajan e Bernstein, estes velhos e admiráveis maestros

Após alguns meses de paralisação - em decorrência principalmente da redução industrial na prensagem de discos - a Polygram reativa o seu setor erudito. Ao lado da magnífica coleção Galleria, com vinte cassetes em dióxido de cromo, trazendo excelentes gravações do acervo da Deutsche Grammophon - projeto que, por sua importância, merecerá registro à parte, dentro de alguns dias, os elepês digitais voltam às lojas. No pacote de março, de nove excelentes álbuns, destacam-se dois - indispensáveis aos que acompanham a música dos grandes mestres. O primeiro é com a Orquestra Filarmônica de Berlim, regida por Herber Von Karajan, interpretando a célebre Sinfonia nº 4, Opus 29, de Carl Nielsen (1865-1931), chamada de "A Inextinguível" (Das Unausloschiliche). Como diz o musicólogo Thomas Walker, Nielsen é uma figura mais estranha do que possa à princípio parecer. Se o pai da música moderna da Dinamarca é freqüentemente descrito como um anti-romântico, é porque se opôs a tudo o que havia de suave e sentimental na cultura dinamarquesa na virada do século, declarando-se firmemente contra "refinamentos": - "Uma harpa na orquestra é como um cabelo na sopa". Ambivalente em relação às obras de Wagner e de Richard Strauss, ele, no entanto, tirou importantes lições harmônicas e formais da música de Brahms. O romantismo francês, de Berlioz e Franck, também deixou nele a sua marca. Filho de um pintor de paredes e músico de aldeia nas cercanias de Odense, na ilha de Fronta, teve suas primeiras experiências musicais (em si mesmas parcialmente primitivas: melodias tocadas nos galhos de uma árvore abatida), no contexto normal, modestamente rústicas. Ele passou os primeiros anos de sua adolescência numa banda militar em Odense, onde tinha que tocar vários instrumentos da família dos metais. Seu talento e curiosidade musical foram logo reconhecidos e aos 18 anos ingressou no recém-fundado Conservatório Real de Copenhague, com ajuda financeira local. A colisão entre um rude pano-de-fundo provinciano e a formação alemã "limpa" pode ser ouvida na maioria de suas obras de grandes proporções. A posição de Nielsen na vida musical dinamarquesa foi multifacetada. Ele compôs uma boa quantidade de música incidental e circunstancial, e a retomada de interesse por ele provocada para o simples canto popular, para uso na escola e no lar, teve um impacto forte e duradouro. Suas obras sinfônicas foram, no entanto, as mais difundidas, e foi na verdade a quarta sinfonia que lhe proporcionou, pela primeira vez, uma audiência internacional (postumamente) no início dos anos 50. Muitos observadores viram nessa sinfonia um retrato da sobrevivência pela luta do otimismo questionado, mas definitivamente vitorioso. Escrita durante a I Guerra Mundial, esta Quarta Sinfonia refletiu os efeitos da luta na sensibilidade de Nielsen, que, na época, escrevendo a um amigo, disse: "O sentimento nacional, que até aqui tinha sido considerado como algo de nobre e belo, transformou-se numa espécie de sífilis espiritual, que devora o cérebro e escarnece com um ódio demencial através das órbitas vazias". Esta obra de Nielsen, até hoje pouco conhecida no Brasil, está num registro perfeito da Filarmônica de Berlim, gravada há cinco anos - época em que se comemora o 750º aniversário da fundação de Berlim, também festeja-se o 50º aniversário do primeiro concerto do mais lendário maestro contemporâneo à frente da Ópera do Estado de Berlim. Infelizmente, às vésperas do 80 anos (nasceu em Salzburgo, 5 de abril de 1908), Karajan está gravemente doente e, segundo recente artigo do musicólogo e historiador, Karajan já não pode reger com a desenvoltura antiga. Vale, então, ouvir suas gravações - como esta feita em Hamburgo, em 1982, e na qual mostrava ainda estar em perfeita forma. xxx Tão lendário quanto Karajan, é Leonard Bernstein, 69 anos, que embora aposentado da Filarmônica de Nova Iorque - da qual foi titular por mais de 15 anos - continua requisitadíssimo para reger as maiores orquestras do mundo. Há dois anos, em Munique, regeu a Orquestra Sinfônica da Rádio Bávara, com a "Missa In Tempore Belli" ("Paukemmense"), de Joseph Haydn (1732-1809), numa gravação para a Philips, agora lançada no Brasil. Com a participação do Coro, regido por Wolfgang Seeliger e tendo como solistas Judith Blegen (soprano), Brigitte Fassbinder (contralto), Claes Ahnsjó (tenor) e Hans Sotin (baixo), este registro é belíssimo - indispensável para entender melhor a obra de Haydn, autor de treze missas das quais sete foram escritas no período de 1749 a 1782, e as seis obras-primas posteriores, entre 1796/1802. A "Missa In Tempore Belli em Dó - H, XXII, nº 9", comumente chamada de "Missa Do Rufar Dos Tambores", foi a segunda das seis, tendo sido escrita em 1796/1797, apesar de as datas não serem plenamente confiáveis. O título popular vem do uso pitoresco dos tímpanos do Agnus Dei.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
7
05/04/1987

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