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Aramis

Mingus, Evans, Herbie e Coleman em bons momentos

Ao lado da CBS, a WEA é a gravadora que tem investido mais maciçamente no jazz (e trazendo também blues e country), embora não se possa esquecer os bravos esforços de Jonas Silva, da Imagem - há 21 anos no mercado, a Bradisco (embora sem qualquer divulgação e critérios em suas produções e, finalmente, a BMG/Ariola, que dispondo ao acervo da RCA, começa a aproveitar melhor o tesouro sonoro que dispõe em seu arquivo. A WEA inicia a década com uma nova coleção - "Atlantic Jasslore" com quatro preciosos álbuns: "Somewhere Before" (Keith Jarret Trio), o clássico "Pithecanthropus Erectus" (Charles Mingus), "Twins" (Ornette Coleman) e "Nirvana" (Herbie Mann & The Bill Evans Trio). Três destes álbuns foram produzidos por Nosuchi Ertegun, o big boss da Atlantic Records, falecido no ano passado e o encontro do pianista Keith Jarret, baixista Charlie Haden e baterista Paul Motian, registrado nos dias 30 e 31 de agosto de 1968, foi produzido por George Avakian, outro dos grandes executivos da Atlantic. Este encontro de talentos jovens (na época), "Somewhere Before", aconteceu há 22 anos, quando Keith Jarret, então com apenas 23 anos não era tão individualista em sua música, integrando o quarteto de Charles Lloyd já tocava um piano "que a ouvidos menos atentos podia não parecer grande coisa", como disse o arguto João Máximo, do "Jornal do Brasil". Mas Jarret era muito amigo do baixista Haden e do baterista Paul Motian, o primeiro do grupo de Ornette Coleman e outro do trio de Bill Evans. E os três aproveitaram as férias de seus respectivos empregos para tocarem juntos e fazerem este elepê que, passadas duas décadas, soa como uma importante experiência, mostrando um lado menos huis clos, que desenvolveria em seus concertos e alguns solos a partir de 1974. Com exceção de duas faixas ("Dedicated to You", Cahan-Chaplin e "Myoback", Bob Dylan), as outras 7 são do próprio Jarret. Charles Mingus (22/04/1922-05/01/1979) - compositor, baixista, pianista e arranjador, utilizou tradições da música negra, formas latinas e européias para criar um elo firme e importante entre os primeiros estilos do jazz, a livre improvisação dos anos 60 e a fusão dos estilos dos anos 60. Ao longo de uma brilhante carreira, Mingus liderou grupos pequenos e orquestras, gravando mais de 50 álbuns. Entre 1956/67 - e, depois, em 1974 até sua morte, gravou na Atlantic. De sua obra, este "Pithecanthropus Erectus", gravado em 30 de janeiro de 1956, é um dos clássicos de seu repertório, já tendo sido editado, no Brasil, há mais de 15 anos pela Imagem. Como diz João Máximo, é recomendável antes (ou durante) de ouvi-lo ler as notas de contracapa, nas quais o próprio Mingus fala de seus workshops no tempo em que estudava música clássica e de como transferiu essa experiência para o jazz. Fala também das diferenças entre música escrita e música criada na hora, acentuando a importância dessa liberdade e explicando que suas composições, por exemplo, são escritas numa "partitura mental", a partir da qual oferece propostas para que seus "sidemen" toquem com ele, "entrem na sua". Participaram desta importantíssima gravação músicos como Jackie McLean (sax alto), J. R. Monterose (tenor), Mal Waldron (piano) e Willie Jones (bateria). Ornette Coleman (Fort Worth, Texas, 19/03/1930) - Saxofonista, violinista e compositor, é um dos pais do jazz de vanguarda. Levou às últimas conseqüências a tendência à politonalidade e a liberação do ritmo que havia na obra de Charlie Parker (1920-1955). Combinando as raízes populares do jazz com os ritmos e harmonias mais avançadas, Coleman foi um dos primeiros nomes do Free Jazz. Numa busca do verdadeiramente novo, resumiu sua ideologia numa frase: - "Eu toco a simples emoção". "Twins" reúne gravações feitas em diferentes sessões entre 1959/61, em Nova Iorque e Hollywood - mas que só foi editado em 1971. Contando com alguns dos melhores músicos da história do jazz (Eric Dolphy, Freddie Hubbard, Don Cherry, Scott LeFaro, Charlie Haden, Billie Higgins e Ed Blackwell), o álbum contém as características de improvisação total, a exasperação ou exacerbação da expressão individual, típicas do free. "Monk and the Nun" (uma homenagem a Thelonious), "First Take" e "Check Up" são preciosidades de interpretação e expressão jazzística. Bill Evans (1929-1979) - Foi um dos estilistas mais "cleans" da história do piano no jazz e um dos responsáveis por levar adiante a tradição de Bud Powell (1924-1966), somando-se um estilo inconfundivelmente original. Evans foi um músico que criou escola, influenciando tecladistas como Herbie Hancock, Chick Corea e Keith Jarret. Ao longo de sua bela carreira, "Nirvana", gravado entre dezembro de 1961 e maio de 1962, foi uma reunião única de seu talento ao flautista Herbie Mann (Herbert Joy Salomon, Nova Iorque, 16/04/1930), após seu grande sucesso com "Coming Home Baby" (1961) e Bill Evans passava uma fase traumática, causada pelo falecimento de seu excepcional baixista Scott LeFaro, morto aos 25 anos, num trágico acidente de carro em 1961. Com LeFaro e o percussionista Paul Motian, Evans havia reformulado o jazz em forma de trio e nunca o piano-baixo-bateria tinha estado em tamanha graça. Chuck Israel, substituiu consideravelmente bem LeFaro (mas seria Eddie Guitez o baixista ideal, que trabalharia com Bill Evans até a sua morte, em 15 de setembro de 1980, pouco após ter se apresentado no Guaíra). Do encontro com Herbie Mann - flautista que foi um dos primeiros jazzistas americanos a gravar Bossa Nova - resultou "Nirvana", um álbum excitante, sensitivo e de forte impacto emocional. Assim há recriações de "Gymnopedie" (Erik Satie) e "I Love You" (Cole Porter), entre duas músicas de Mann ("Nirvana" e "Cashmere"), aos quais se acrescentam "Lover Man" (Jimmy Davis / Roger "Rom" Ramirez / Jimmy Sherman) e "Willow Weep for Me" (Anny Ronel), Nirvana é, sem dúvida, uma das gravações mais importantes, tanto pela audácia melódica de Evans como os ataques líricos de Mann - registrados num momento histórico para se entender a excelência da contribuição de ambos para a música contemporânea.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Nenhum
5
04/03/1990

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