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Aramis

Muriel e suas imagens do milagre de nascer

Na Clamart, em uma moderna e asséptica maternidade de Paris, há exatamente 14 anos, quando deu a luz ao seu primeiro filho, uma jovem francesa, aceitou a aplicação do método peridural, para evitar as dores do parto, mas que lhe trouxeram problemas posteriores. Indagou-se, então, se não seria mais prático a adoção de métodos naturais, como fazem, há milênios, mulheres das mais diversas partes do mundo. Naquele momento nascia em Muriel Bonnet a decisão de escrever um livro sobre o parto natural. Um projeto que acompanha há 15 anos - período em que teve um segundo filho, Pif, viajou pela América Latina, Central e Ásia - e a fez agora vir a Curitiba, acompanhar de perto o trabalho pioneiro que o ginecologista Moisés Paciornick desenvolveu trazendo para a chamada "sociedade civilizada" o parto de cócoras dos índios. Há 15 dias no Brasil - e desde a quarta-feira de cinzas em Curitiba, Muriel Bonnet, já tem pronto a metade de seu livro, provisoriamente intitulado de "Vida, Um Ato de Amor", que ao lado da parte teórica será um belo álbum de fotos. Fotógrafa com mais de 20 anos de experiência, tem imagens magníficas feitas em várias partes do mundo - e uma pequena amostragem de seu trabalho impressionou ao experiente Orlando Azevedo, um dos melhores fotógrafos do Paraná. *** Parisiense, canceriana do dia 9 de julho, aos 39 anos, Muriel Bonnet é uma mulher de garra, persistência, energia e muita disposição. Aos 19 anos, após ter trabalhado na redação do "Paris Match" - nas áreas de fotografia e diagramação, foi conhecer a África. Por dois anos viveu no Kenya, trabalhando em pesca submarina no Club Kilifi, próximo a Bambassa. Foi ali que teve de uma amiga, excelente fotógrafa, Mireilla Richardi, ensinamentos precisos sobre a arte de capturar as imagens de vida. Ao voltar a Paris, tinha a disposição de formar uma família. Conheceu um jovem cineasta, Jean Daniel Pollet e assim nasceria Boris - "o nome foi em homenagem a Boris Van", explica Muriel, referindo-se ao escritor e músico francês, tema da peça "Nenúfar" que Marcelo Marchioro escreveu e dirige com um novo grupo da cidade, o Encena (estréia dia 29 de março, Teatro da Esquina/Sesc). *** Com Jean Daniel Pollet, cineasta pouco conhecido fora da França mas que ali realizou filmes importantes (como o longa "L´Acrobatte"), Muriel teve seu início nos bastidores do cinema. A união acabou três anos depois e seu segundo marido, o cineasta e poeta peruano Ivo Barreto, a traria ao Brasil, em 1977, quando aqui realizou um documentário de 35 minutos sobre a macumba, encomendado pela televisão francesa. Duas passagens pelo Peru e uma longa estadia no México, período no qual dividiu o seu tempo: enquanto o marido Ivo realizava um novo documentário "México Mágico", ela pesquisava os métodos de maternidade das populações mais pobres daquele país. Com a parteira Donia Remilla, na distante aldeia de Tekom, permaneceria por mais de 3 meses, acompanhando dezenas de nascimentos - e fazendo fotos da maior emoção em preto e branco. Grávida, num Land Rover dirigido por Ivo Barreto, percorreu mais de 5 mil quilômetros em três países da África - Mali, Nigéria e Senegal. - Mas o nascimento de Pif foi pelo método natural, sem qualquer complicação. De volta a Paris, matriculou-se no curso de medicina da Universidade de Bobigny, que não pôde concluir por problemas familiares. Aprendeu, entretanto, o suficiente para ter maior embasamento para o grande projeto que vinha desenvolvendo e que a levaria, em 1986, a alugar seu apartamento em Montmartre e, com o advanced, viajar para a Índia - com o filho Pif, com então 6 anos. - A Índia foi uma experiência terrível. A miséria nas ruas, a falta de assistência e um quadro terrível, contradizem-se, entretanto, com a espiritualidade do povo, uma espiritualidade que parece nascer do lixo - embora não haja lixo nas ruas pois os cães, urubus, os porcos e os "intocáveis" - a mais baixa casta da população - disputam até as fezes. Foi difícil para Muriel fazer um trabalho de pesquisa junto às comunidades humildes em relação ao parto natural. No Estado de Keralla encontrou mulheres anêmicas, "que não se entende como conseguem reproduzir com tanta fertilidade". - Gostaria de ter aprofundado minhas pesquisas e fazer maior documentação na Índia mas as dificuldades eram imensas. Novamente em Paris, enquanto seu marido concluía seu aguardado livro - "Sarita entre los Bruxos" (sobre o tema que o fascina, o curandeirismo na América Latina), Muriel empenhava-se em preparar a primeira parte de seu livro. Um trabalho suficiente para conseguir editor e, numa viagem com seu pai, Gerard, a Nova Iorque, merecer aprovação da Organização das Nações Unidas, que adquiriu por US$ 2 mil algumas de suas fotos e recomendou o projeto. - Com esta ajuda e novamente alugando minha casa em Paris, pude voltar ao Brasil. Amiga do cineasta Noiltom Nunes (seu marido, Ivo Barreto, colaborou na elaboração do roteiro de "Fronteiras - A Saga de Euclides da Cunha", que está em produção há cinco anos), Muriel passou o carnaval em sua casa no Rio. Agora veio a Curitiba para conhecer melhor o trabalho que Moisés e Cláudio Paciornick desenvolvem - "e que é na minha opinião, o mais notável método de parto natural". No final da semana, pretende viajar ao Araguaia, para acompanhar o trabalho que uma velha missionária francesa, Renée Delorme, desenvolve há mais de 20 anos. Conheceu Renée em Paris, num programa de TV ("Aujourd´hui Madame", Antena II), mas havia perdido seu endereço. Por uma destas coincidências do destino, um dia antes de embarcar para o Brasil relacionou-se com uma organização que tinha como secretária justamente a irmã de Madame Delorme. *** Amiga pessoal de Jean Rouch, antropólogo e cineasta, criador do Cinéma Verité (ao lado de Pierre Kast, 1920-1984), hoje diretor da Cinematheque Française, Muriel Bonnet desenvolve seu trabalho com a objetividade jornalística - "mas sem desprezar os ensinamentos teóricos, da antropologia e medicina". De sua relação com o cineasta Ivo Barreto, ficaram amizades no meio intelectual latino-americano que sempre circularam em Paris - Manoel Scorsar, Vargas Llosa, Júlio Cortazar (1914-1984) e o poeta Juan Gonçalo José - (desconhecido no Brasil mas uma das grandes vozes da nova poesia peruana). Com sua sensibilidade de fotógrafa e pesquisadora, documentando em imagens precisas o nascimento de crianças pelos métodos naturais, após o acompanhamento na Casa de Saúde Paciornick, Muriel vai conhecer o trabalho que sua conterrânea, a religiosa Renée Delorme, realiza no Araguaia, o método do parto n´água - desenvolvido por um ex-discípulo de Moisés Paciornick, o ginecologista Francisco Vargas, no Rio de Janeiro e, "dependendo da disponibilidade e ajuda", mergulhar também na Amazônia. Otimista, no vigor de uma intensa criatividade, garante: - "meu livro não tem apenas a "vida" no título. Ele é o reflexo de minha forma de encarar a vida e o nascimento do ser humano - como é o nascer do sol a cada manhã". LEGENDA FOTO 1 - Muriel e o filho Pif, 8 anos, que a tem acompanhado em duas viagens internacionais (Foto: Orlando Azevedo) LEGENDA FOTO 2 - Imagem pós-parto de uma camponesa mexicana, captada pela objetiva de Muriel Bonnet - foto que está selecionada para o livro "Vida, Um Ato de Amor".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
15/02/1989
No final da semana, pretende viajar ao Araguaia, para acompanhar o trabalho que uma velha missionária francesa, Renée Delorme, desenvolve há mais de 20 anos. Conheceu Renée em Paris, num programa de TV ("Aujourd´hui Madame", Antena II), mas havia perdido seu endereço. Por uma destas coincidências do destino, um dia antes de embarcar para o Brasil relacionou-se com uma organização que tinha como secretária justamente a irmã de Madame Delorme. Estou precisando de informações sobre a missionária francesa RENÉE DELORME para um tabalho que realiza na comunidade de Chapéu Mangueira no Leme, Rio de Janeiro.Vamos prestar uma homenagem a ela e precisamos de mais informações.

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