Na batalha das rendas as pornofitas salvam cinema
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 24 de novembro de 1983
Jofre Rodrigues, primogênito do dramaturgo Nelson Rodrigues, chega hoje, ao entardecer, para catituar o filme "Perdoa-me Por Me Traíres" em exibição no cine Condor. Joffre, que tem muitos amigos na cidade, entre os quais o advogado e ex-secretário Ruy Ferraz de Carvalho tem participado como coprodutor dos filmes baseados na obra de seu pai, um dos autores brasileiros mais filmados nos últimos anos - já que apesar do moralismo e reacionarismo de seus textos, foi um autor "maldito" para a época devido suas obseções sexuais.
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A estória de "Perdoa-me Por Me Traíres" no Condor - uma das melhores salas de exibição da cidade só foi possível devido ao rompimento entre a United Internacional Pictures, proprietária do cínema, e a Embrafilme, ocorrido na semana passada. É que "como "Psicose II", de Richard Franklim, fracassou em rendas na sua primeira semana, a direção da UIP - que no Rio controla a programação de todas as salas que possui no Brasil decidiu antecipar em uma semana "O Bom Burguês", de Osvaldo Caldeira, que ali deveria estrear no dia 24. Acontece que o escritório local da Embrafilmes, ponderou que esta antecipação seria prejudicial, já que não havia sido feita a devida promoção e que como se trata de uma fita política (das mais medíocres, aliás), sem apelo erótico, corria o risco de fracassar nas bilheterias. Frente a isto, a UIP detrminou o cancelamento não só de "O Bom Burguês", mas de outras duas produções distribuídas pela Embrafilmes que estavam com data marcada para ali estrearem.
Quem ganhou foi o astuto Isídoro Lassalvia, da distribuidora Arco Íris, que distribuindo produções eróticas e pornográficas da Boca do Lixo de São Paulo, tem várias fitas à espera de datas para exibição. Na semana passada, já lançou o "Doce Delírio", agora ali estréia "Perdoa-me Por Me Traíres", que será seguida de outra pornoprodução - "Perdida em Sodoma".
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"Inocência", o belo e poético filme que Walter Lima Júnior realizou com base no romance de Visconde de Taunay - que recebeu quatro prêmios no festival de Brasília (direção, ator coadjuvante Sebastião Vasconcelos; fotografia Pedro Farkas; melhor filme segundo a imprensa), deveria ter permanecido 3 semanas no Condor, cumprindo a lei de obrigatoriedade. Entretanto, a renda na primeira semana foi fraca e a UIP preferiu substituí-lo por "Piscose II", a continuação de clássico de Hitchcock, mas que também não teve bom público (voltou agora a ser exibido no Cinema I). Em compensação, no Groff, "Inocencia" está tendo um ótimo público, pois além de seus méritos como filme um dos melhores do ano, com toda a certeza representa praticamente a única opção de censura livre, já que 90% das casas de exibição estão ocupadas com os filmes pornográficos, com cenas de sexo explícito.
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A voracidade com que os exibidores programaram os filmes hard core justifica-se: todos foram liberados por força de mandado judicial, sujeito a ser cassado de uma hora para outra. Assim, sua projeção é temporaria e como atrai grande público, com boas rendas, representa uma injeção de recursos nas combalidas finanças das empresas exibidoras, às voltas com salas vazias e praticamente sem filmes novos: as restrições legais oneraram tanto a importação que as grandes empresas reduziram em 70% os filmes lançados no Brasil. Com isto, só produções de sucesso garantido, tipo "Superman III", "O Retorno de Jedi", etc., é que estão chegando neste final de ano. Filmes de arte, como "Ensaio de Orquestra" e "La Nave Va", de Federico Fellini, dificilmente chegarão até à telas brasileiras, em lançamentos normais.
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