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Aramis

Nas imagens de "Michaud", a busca do paraíso ecológico

A raquítica filmografia sobre as artes plásticas no Paraná ganhou uma excelente contribuição graças ao talento de um cineasta paulista, Roberto H. D'Ávila: "Michaud", curta de 10 minutos, 16mm, rodado no Litoral faz com que um dos mais sensíveis pintores de paisagem paranaense seja praticamente redescoberto. Apesar de ter trabalhos belíssimos e ser reconhecido por estudiosos como um dos importantes pintores europeus que viveu no Paraná na segunda metade do século passado, a obra de Michaud é pouquíssimo conhecida entre nós justamente pelo fato de que a maior parte dela se encontra na Suíça, sua terra natal. O Museu de Arte do Paraná, graças aos esforços de seu ex-diretor, Ennio Marques Ferreira (e um dos críticos e estudiosos mais profundos das artes plásticas no Paraná) dispõe de 23 obras de Michaud - entre desenhos, aquarelas e trabalhos em lápis de cor que, além do valor artístico, compõe um retrato vivo de uma frustrada tentativa de colonização suíça no Litoral paranaense. Justamente agora, quando a secretária Gilda Poli, da Cultura, com apoio do Ibama, iniciou um projeto destinado a esclarecer melhor um aspecto pouquíssimo estudado da colonização - a presença dos suínos na ilha de Superagüi, no Litoral Norte do Paraná - a coincidência de Roberto H. D'Ávila, 27 anos, paulista, agrônomo e ecologista que se tornou cineasta, ter voltado seu olhar a personalidade de William Michaud (1892/1902) e do que resultou um documentário premiado no 19 Festival de Gramado do Cinema Brasileiro (melhor direção, categoria 16mm), torna das mais oportunas a sua próxima exibição em Curitiba. A secretária Gilda Poli, deverá conhecer o filme (através de uma cópia em vídeo) nos próximos dias, para acertar a vinda de seu realizador para uma sessão especial em Curitiba, com projeção de "Michaud" na Sala Brasílio Itiberê. xxx A exibição de "Michaud" se insere, perfeitamente, dentro do projeto iniciado no dia 16 de julho último, que levou uma equipe interdisciplinar da Secretaria da Cultura - incluindo historiadores, arquitetos, geógrafos, etc. - a Superagüi, para ali fazer prospecções, sondagens, mapeamentos e escavações nos sítios históricos, procurando as ruínas da antiga colonização suíça. Nesta primeira etapa, o objetivo é encontrar antigas construções - casas, olarias, serrarias dos imigrantes suíços, e principalmente, as ruínas da casa de Michaud, que chegou ao Brasil em 1850, foi um dos fundadores da colônia, e ali lecionou. Seus descendentes acaboclaram-se no Litoral - embora conservando os traços europeus. No filme de Roberto D'Ávila, uma das bisnetas oferece um curioso depoimento a respeito. O projeto prosseguirá com pesquisas que envolvem também a colonização de Guaraqueçaba - o mais antigo ponto da chegada dos portugueses ao Paraná, e ironicamente, o mais atrasado de nossos municípios - e o estudo do patrimônio natural da região, transformada em Parque Nacional em 1989, considerada o sítio da Mata Atlântica mais bem preservado do país. Isto porque a BR-101, felizmente, não chegou ao nosso Litoral e o acesso a região é difícil. O projeto se complementará em 1992 com uma grande exposição das obras de Michaud, trazendo, inclusive, a maioria de seus trabalhos que se encontram na Suíça. xxx Em seu filme, D'Ávila roteirizou a presença de Michaud através de um ator (Arthur Khol) que através de monólogos epistolares - nas cartas escritas a sua irmã Nancy - relata sua vida na colônia em que se estabeleceu, dirigida pelo cônsul suíço Pierre Gentil. Ali ele se casou, teve nove filhos (cinco mulheres) e exerceu múltiplas atividades: agricultor (sua intenção ao vir ao Brasil era desenvolver a criação do bicho-da-seda), professor, juiz de paz, agente dos correios e até entusiasta da revolução federalista. Paisagista, que utilizava todos os materiais disponíveis (papel de embrulho, carvão, tinta feita com seiva de árvores) documentou a vida dos habitantes, da colônia, que chegou a contar com 1.480 moradores e 150 casas de alvenaria em 1872. O Visconde de Taunay (Alfredo Maria Adriano d'Escaragnole Taunay, 1843/1899), quando presidente da Província do Paraná (1885) o apoiou, fornecendo material para seus desenhos. Em troca, vários de seus desenhos foram dados ao Visconde, cujos herdeiros doaram 23 dos mesmos ao Estado. Por iniciativa do professor Newton Carneiro - um dos raros paranaenses que possuía em sua fabulosa pinacoteca seus trabalhos - e da professora Cassiana Lacerda Carolo, algumas destas ilustrações figuraram no álbum "Pintores de Paisagem Paranaense", editado durante a gestão do primeiro secretário da Cultura do Paraná, Luís Roberto Soares, em 1980. xxx Através da jornalista Teresa Urban, atuante ecologista e defensora da Mata Atlântica, Roberto D'Ávila se interessou pelo tema e, entre abril/maio de 1991, filmou em Superagüi imagens belíssimas, com toda a paisagem - ainda existente - da época em que o pintor ali viveu. A fotografia de Marcelo Coutinho é de uma extrema sensibilidade, assim como a trilha sonora de Lincoln Barbosa. Para esta produção, D'Ávila teve uma pequena ajuda do Banestado e apoio de amigos locais - além de Teresa Urban, as videastas Fernanda Morini e Jussara Locatelli (que, aliás, também vem documentando a paisagem daquela zona do Estado). O roteiro do filme é de Ivan Marques, a montagem de Marco de Rossi e a edição de som de Miriam Biderman. Um documentário de primeira grandeza, que o governo do Paraná deve divulgar, em cópias em vídeo, de todas as formas. LEGENDA FOTO 1 - O autor Arthur Khol interpreta o pintor William Michaud, que retratou em aquarelas e desenhos a tentativa de colonização dos suíços em Superagüi, no Litoral paranaense. LEGENDA FOTO 2 - Roberto D'Ávila: realizador de "Michaud", um belíssimo documentário sobre o pintor suíço que viveu no século passado no Litoral paranaense.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
15/09/1991

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