Nomes ou palavrões (III)
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 19 de setembro de 1974
Ao mesmo tempo em que aparece o seu livro "Nomes Próprios Pouco Comuns" (Livraria São José, GB, agosto/74), o escritor Mário Souto Maior, chefe do setor de intercâmbio cultural do Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais, em Recife, está enviando a todos os deputados federais - e também se dirigindo aos prováveis futuros parlamentares - uma carta aberta, onde faz uma importante sugestão: seja apresentado um projeto de lei ou uma emenda ao Código Civil proibindo o registro civil de cidadãos brasileiros com nomes de grande homens nacionais e estrangeiros. O senador Rui Santos já apresentou um projeto visando a proibição de registro civil de nomes estapafúrdios, mas o que, na opinião de Souto Maior, não solucionará a questão no seu todo. Explica: "Uma outra face continuará ainda a merecer uma [legislação] especial: trata-se da existência de registro de milhares de cidadãos brasileiros com nomes de grandes homens estaduais, nacionais e universais". Em sua longa pesquisa encontrou brasileiros registrados como Washington Luiz, Getúlio Vargas, John Kennedy, Abraham Lincoln, Graham Bell, Rui Barbosa, Jesus Cristo, Cristovão Colombo etc. Assim, raciocina o escritor, "o certo é cada pessoa dispor de seu nome para poder tranqüilamente, sem o vislumbre da menor influência, construir a sua vida. Acredito que registrar uma criança com o nome de um grande homem significa, nada mais, nada menos, do que lhe dar o encargo de começar sua vida com um peso de uma terrível responsabilidade, implicando tal ato praticado por seus pais na sua despersonalização. Sua infância, sua vida escolar, sua adolescência, sua vida profissional e sentimental serão construídas à sombra de um nome que nunca foi seu, pelo simples fato de haver pertencido ao seu legítimo dono". Mesmo reconhecendo as boas intenções dos pais ao darem a seus filhos nomes de pessoas famosas, Souto Maior lembra o lado negativo de tal homenagem, contando o fato de que votou em Piracicaba, São Paulo, nas eleições de 1945, um eleitor chamado Jesus Cristo Segundo. E indaga: "Se o paulista Jesus Cristo Segundo tivesse a infelicidade de se tornar um [delinqüente], um assassino, como a imprensa noticiaria seu comportamento? Teríamos, então, a homenagem transformada num insulto, num palavrão, numa punhalada". A admiração às vezes chega ao exagero: um mineiro da Zona da Mota era tão partidário do Presidente Vargas que quando Getúlio deixou o poder ele batizou o filho como Getúlio Subirá, o que realmente aconteceu.
A sugestão de Souto Maior aos parlamentares, "depois de ouvida a opinião do Conselho Federal de Psicologia", da Ordem dos Advogados do Brasil e também depois de estabelecido o conceito de grande homem", como prudentemente lembra, merece atenção. Pois registrar um filho com o nome de um grande homem é a mesma coisa que colocar uma montanha na cabeça de um pigmeu.
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