Login do usuário

Aramis

Nordestinos Sem Sotaque

Houve época em que a música se dividia por regiões, de forma estanque - com gêneros bem definidos, hoje, na integração global via televisão em suas vária cadeias e na qual até o sotaque desapareceu, isto também inexiste na indústria musical / e / ou fonográfica. Prova disto é a audição de alguns discos de interpretes nordestinos - mas universais em termos brasileiros. O grande Luiz Gonzaga, pernambucano de Exu, anunciando sua aposentadoria e despedindo-se neste "Dando de Bom" (RCA), mesmo se mantendo fiel ao bailão - inclusive com parcerias com João Silva, Zé Dantas, Aguinaldo Batista etc., não deixa de gravar uma alegre canção do filho, Gonzaguinha ("Pense N' Eu") ou a emocionante "Lula, Meu Filho". Em outro oposto, o paraibano Zé Ramalho, 41 anos, após quedas de prestigio por plágio do poeta Yeats e sofisticadas preocupações ecológicas, assume sua porção roqueira em "Por aquelas que foram bem amadas.. ou Pra não Dizer Que Não Falei de rock"(CBS). Zé Ramalho é realmente um compositor - intérprete contraditório, capaz de fazer trabalhos de grande força como "o Perguntador ", com o cantador Oliveira de Panelas e, ao mesmo tempo, assumir todo o seu beatlemanismo ao fazer uma versão bem pessoal de "Tolo na Colina "(Lennon/McCartney ). Nesta geleia geral, os arranjos e regências de seu disco vão desde o brasileirinho Sivuca ("Paisagem da Flor Desesperada", de Israel Semente) até a datilografia cansativa e repetitiva de Lincoln Olivetti ("Dupla Fantasia", "Dogmática "). Irregular, confuso, Zé Ramalho é o próprio retrato do conflituado Norodeste desta década. Se Zé Ramalho passou estes últimos anos buscando um encontro de público e estilo, sua primeira, e esfuziante Élba - promovida hoje no Olimpo das superstars da MPB - pode se dar ao luxo de passar por um repertório também diversificado, mas com muito maior segurança. Assim do primeiro Celso Adolfo que no ano passado havia lhe proporcionado o maior sucesso ("Coração brasileiro"), escolheu "Azedo e Mascavo", como uma das faixas fortes do "Do Jeito Que A Gente Gosta "(Ariola/barclay). Do paraibano Tadeu Mathias - outras das revelações do ano passado - são duas faixas das mais interessantes: "Feitiço de Gafieira"(parceria com Jaguar, que não é o cartunista do "Pasquim") e "Amor Eterno", desenvolvido a partir de um soneto original de Shakespeare. Élba é a cantora-alegre, de fácil comunicação e por isto o astuto produtor Mazolla não deixaria de incluir faixas como o frevo "Moreno de Ouro" dos pernambucanos Carlos Fernando/Geraldo Amaral, o "Forró do poeirão" de Cecéu ou a própria e vibrante faixa-título, de Severo/Jaguar. Vetada para divulgação em rádios, o cordel "Nordeste independente"(Imagine o Brasil ) do poeta Braúlio Tavares e cantador Ivanildo Vila Nova é o discurso político deste elepê que em poucas semanas deverá estar entre os mais vendidos.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
1
01/07/1984

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br