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Aramis

O baita cinema que os gaúchos estão fazendo

O pré-trailler anuncia para breve a estréia de "Aqueles Dois", longa-metragem gaúcho, prêmio especial da Indústria Cinematográfica no I Festival de Cinema do Rio de Janeiro, em agosto do ano passado. Na retrospectiva do documentário brasileiro, que ontem se encerrou, dois dos mais interessantes curtas apresentados foram "Cinema Gaúcho, Anos 20", de Antônio de Jesus Pfeil e o político "Cone Sul", de Enio Staub e João Guilherme Regis e Silva. A produção cinematográfica gaúcha vem crescendo a cada ano. Depois de uma bem sucedida experiência na área do Super 8 - formando uma geração que hoje trilha os caminhos profissionais, em 35mm - houve experiências bem sucedidas, com longa-metragens como "Verdes Anos", "Me Beija", e, agora, "Aqueles Dois", que tiveram lançamento comercial. A cada ano, cresce o número de curtas de qualidade em disputa no Festival de Cinema de Gramado e, em abril último, o grande premiado foi um curta totalmente realizado em Porto Alegre - "O Dia Em Que Dorival Encarou a Guarda", baseado num conto de Tabajara Ruas, intelectual gaúcho que há pouco tempo era o principal assessor de Carlos Marés, na presidência da Fundação Cultural. UM CINEMA DE GARRA - Durante o XIV Festival do Cinema Brasileiro de Gramado, hoje a mostra competitiva de maior prestígio nacional, foi lançado "Cinema Gaúcho - Uma Breve História" do crítico e cineasta Tulio Becker (Editora Movimento, 112 páginas). Numa análise jornalística, Becker desenvolve senão uma história rigorosamente cronológica do cinema gaúcho, "O que seria enfadonho e sempre incompleto, em virtude das dificuldades quase intransponíveis de uma pesquisa de tal porte", como diz o crítico Goída, da "Zero Hora", na introdução, Becker oferece uma visão dinâmica das mais variadas etapas da produção gaúcha, especialmente dos últimos 25 anos. Outro sério pesquisador gaúcho, Antônio de Jesus Pfeil - há anos vem estudando as origens do cinema gaúcho, não só em artigos e ensaios mas principalmente, num esforço antropológico, localizando e recuperando filmes rodados nos anos 10, 20 e 30, por pioneiros do cinema gaúcho, os quais muitos já julgavam perdidos. Agora, com o sucesso de "Sonho Sem Fim", de Lauro Escorel, livre cinebiografia do pioneiro cineasta gaúcho Eduardo Abelim, o interesse pelo cinema gaúcho vai aumentar. O filme de Escorel é belíssimo, com uma cuidadosa reconstituição de época e ótimas interpretações - tendo inclusive valido a Ymara Reis (que passou algumas semanas em Curitiba, rodando "Romance" de Sérgio Bianchi), o Kikito de melhor atriz coadjuvante. A PRODUÇÃO 80 - Um catálogo editado pela Associação Profissional dos Técnicos Cinematográficos do Estado do Rio Grande do Sul relaciona nada menos que 75 filmes realizados nos últimos 6 anos, entre os quais 10 longas metragens, 17 médias metragens e os demais em curtas-metragens, nas bitolas de 35, 16 e super 8 - além de algumas bem sucedidas experiências em vídeo, como o premiado "Overdose - Beijo Ardente", "Verdes Anos", produção de 1984, prêmio revelação do 12º Festival de Gramado, foi a primeira realização da Z Produções, formada por um grupo de entusiastas cineastas que, praticamente na mesma época desenvolveu dois outros projetos também em 35mm e longa metragem: "Me Beija" e "Aqueles Dois". Infelizmente, antes de chegar ao quarto projeto - que teria artistas de prestígio nacional no elenco - a Z Produções (ligada a uma próspera agência de publicidade, em Porto Alegre), sofreu uma desativação, com a separação de seus sócios. Entretanto, a experiência valeu - assim como anteriormente o boom superoitista havia dado bons resultados, tanto é que em 1979, na I Mostra de Cinema Super 8 da Região Sul, promovida em Curitiba pelo Museu da Imagem e do Som (então dirigido por César Fonseca), o "Meu Primo", de Nelson Nadotti, Carlos Gerbasse e Helio Alvarez, foi o grande premiado. Nadotti, em 1981, associado a Giba Assis Brasil, realizaria "Deu Pra Ti Anos 70", em super 8, 108 minutos, prêmio de melhor filme no 5º Festival Nacional do Cinema Super 8 de Gramado, sucesso em várias cidades do Rio Grande do Sul - e cujo roteiro, basicamente, foi o mesmo de "Verdes Anos". Enquanto Nadotti escala vôos maiores - foi assistente de direção de Cacá Diegues em "Quilombo" (escreveu inclusive um livro sobre as filmagens), Giba Assis Brasil continua a fazer cinema no Rio Grande do Sul. Outro da mesma geração, Werner Schunemann, é o roteirista e diretor de "Me Beija", produção de 1984, que no 17º Festival do Cinema Brasileiro de Brasília, há 2 anos, obteve os prêmios de melhor ator (Rudi Lagemann) e no 2º Festival do Cinema Brasileiro, no Rio, também deu prêmios a Lagemann, ao fotógrafo Alberto Salvá, a mixagem e a atriz Nina de Pádua. Já exibido duas vezes em Curitiba, "Verdes Anos" (cines Astor e Groff, 1985), teve bom público. Agora, deve estrear em breve o longa "Aqueles Dois", de Sérgio Lerrer, baseado em conto de Caio Fernando Abreu, jornalista gaúcho, atualmente um dos editores do "Caderno 2" do "O Estado de São Paulo". Com elenco de artistas gaúchos - Pedro Wayne, Suzana Saldanha, Maria Ines Falcão, Oscar Simch, etc. - este filme sobre o relacionamento de dois amigos, ambos com sérios problemas existenciais, vem tendo boas críticas. OS BONS CURTAS - O fato de o Festival do Cinema Brasileiro de Gramado reservar, anualmente, uma premiação especial (oferecida pela Assembléia Legislativa) aos melhores curtas gaúchos têm estimulado a produção nesta metragem. De ano para ano aumenta a qualidade dos filmes em competição - assim como o Festival de Cinema em Super-8, também realizado em Gramado, na mesma época - atrái competidores de todo o País. Este ano, o grande premiado na área dos curtas foi "O Dia Em Que Dorival Enfrentou a Guarda", de José Pedro Goulart e Jorge Furtado. Ganhou todos os prêmios na categoria de filme gaúcho e ainda dividiu com "Mas Che Bambina", de Cecílio Neto e "A Espera" de Maurício Farias - o grande prêmio de melhor curta-metragem do festival. Pela torcida do público e entusiasmo da crítica em Gramado, "O Dia Em Que Dorival Enfrentou a Guarda" merecia ficar sozinho com o prêmio, mas razões políticas levaram a divisão do troféu principal. De um capítulo de "O Amor de Pedro Por João", de Tabajara Ruas, Giba Assis Brasil, Ana Luiza Azevedo, Jorge Furtado e José Pedro Goulart extraíram o roteiro preciso para este curta fascinante, que tem uma marcante atuação do ator negro João Acaiabe no personagem-título. Espera-se que "O Dia Em Que Dorival Enfrentou a Guarda" seja exibido, em breve, nos circuitos comerciais, pois se trata de um curta-metragem da maior qualidade, produção cuidadosa e em nível de ser levado a qualquer festival internacional. APOCALYPSE GENERAL - Outra surpreendente produção gaúca, exibida no Festival de Gramado - e até agora inédito em qualquer outro circuito - é "Adyos General", primeiro longa de Osmar de Barros Filho (Matico). Podendo ser considerado dentro do chamado cinema de invenção, este filme - rodado em 16 mm - consumiu três anos de trabalho, mobilizando mais de 300 pessoas. Ninguém recebeu um centavo e Matico fez pesados sacrifícios para conseguir concluir este filme de muitas cenas exteriores, seqüências de batalha e explosões. "Adyos General" parte de uma figura real, o general Medrano, organizador dos corpos pára-militares de El Salvador que são, segundo o diretor Matico, de "uma crueldade absoluta". Assim, o filme é uma desmistificação da guerra, vista através do olho de um sujeito de extrema-direita. O próprio Matico sentiu de perto a violência, pois foi correspondente em El Salvador, do jornal francês "Correspondence Internationale", seu último trabalho jornalístico, depois de atuar em vários veículos de Porto Alegre e São Paulo. Decidido a se tornar cineasta, ele diz que "Adyos General" é um filme marginal por várias razões. - "Primeiro, porque fala da guerra na América Central, uma guerra marginal, onde o imperialismo, mobilizado em outros frontes mais importantes, atua através de forças marginais, como os contra nicaraguenses. Marginal também porque o personagem principal do filme é um paramilitar, e sabe-se que os grupos paramilitares reúnem a escória da polícia e dos desclassificados no Exército. Marginal, por fim, porque um ex-jornalista, convicto, filmou esta história com atores marginais e equipamento de segunda categoria. Mais ainda, o filme é falado em espanhol dentro do Brasil". Com atores amadores - o general Medrano é vivido por Zeno Ribeiro, ex-radioator, hoje garçom da boite Madrigal, em Porto Alegre - e sem esquema de distribuição, "Adyos General" é, entretanto, um filme fascinante. LEGENDA FOTO 1 - Seqüências de filmagens de "O Dia Em Que Dorival Enfrentou a Guarda", um ótimo curta-metragem gaúcho, inédito ainda fora do Rio Grande do Sul.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Seção de Cinema
7
01/06/1986

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