O barroco Telemann com grupos antigos do Brasil e Alemanha
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 01 de março de 1986
Compositor do período barroco, como J. S. Bach, mas também o grande precursor da música pré-clássica, Telemann (1681-1767) foi um dos músicos mais famosos e populares de sua época. Autor de cerca de 2.000 peças em que se utiliza de diversos estilos e tendências em voga, Telemann escreveu para todos os instrumentos conhecidos em seu tempo, explorando-os idiomaticamente como poucos.
Em dois lançamentos recentes, ambos da Polygram, podemos apreciar a multiplicidade do talento de Telemann. Com um conjunto de música antiga brasileiro, o Quatro Cervantes, formado em 1973 por quatro músicos, professores da Pró-Arte do Rio de Janeiro, temos uma bela amostragem da variedade de estilos de que Telemann é capaz. De princípio temos a cantata "Ibr volker hort" (uma das 72 compostas para voz solista e conjunto de câmera, que faz parte da coleção "Der Harmonische Gottesdient"), tem uma execução da soprano Clarice Szajnbrun, Myrna Herzog na viola de gamba, Rosana Lanzelotte no cravo e órgão e Helder Parente na flauta doce e flauta transversa. Duas obras, ambas da coleção "Essercizi Musici" (composta entre 1715/1720) ilustram o estilo camerístico barroco em que Telemann utiliza tão bem cada instrumento: o Trio-sonata, original para flauta doce, violino e baixo contínuo e a Sonata para viola de gamba e baixo contínuo. Já duas outras obras mostram o Telemann do estilo galante, que sucedeu o barroco: o Concerto em dó maior, original para flauta transversa e a "Fantasia", para cravo. Finalmente, um exemplo da produção operística de Telemann é a ária "Mich trostet die hoffunung mit schmeichelden Scherzen", que faz parte de sua primeira ópera ("Der Getuldige Socrates", 1721, composta para o Teatro do Mercado de Gansos em Hamburgo).
Um dos raros grupos que se dedica à música barroca no Brasil, o Quadro Cervantes (que já se apresentou várias vezes em Curitiba, gravou este belo disco no Salão Leopoldo Miguel, da Escola de Música da UFRJ, em outubro de 1984, valendo-se de um costume comum no período barroco: a utilização livremente de instrumentos alternativos. Assim, no Trio-sonata, o violino (instrumentação original) foi substituído pela viola de gamba e no Concerto, a flauta transversa pela doce.
Não para comparar - o que seria injusto, considerando-se o know-how do grupo estrangeiro, mas para mostrar a forma com que Telemann é interpretado por um conjunto alemão, temos simultaneamente à edição do Quadro Cervantes, também a produção da Archv Produktion, distribuída pela Polygram, com a chamada "Wassermusik" - a música aquática - trabalho dos mais populares de Telemann, que foi um brilhante representante do barroco alemão, sendo colocado por seus contemporâneos à frente dos outros compositores, incluindo Bach, que não podia rivalizar com ele em popularidade. Num registro do grupo Música Antigua Koln, da cidade de Colônia, RFA, sob regência de Reinhard Goebel, temos a belíssima abertura em Dó Maior da "Música Aquática" (Hamburger Ebb), que o musicólogo Ecikart Klessmann nos informa ter sido apresentado, pela primeira vez, a 6 de abril de 1723, quando a cidade de Hamburgo comemorou o centenário de fundação de seu Almirantado.
Nas flautas doces (Michael Schneider/Sabine Baur) e transversas (Michael Schneider/Karl Kaiser), somadas aos oboés, fagotes, violinos, violas, violoncelos, violões, dois cravos (Andreas Staier/Harald Hoeren), a música de Telemann flui suave, tranqüila e cristalina.
Hoje, como há 200 anos, uma obra-prima. Que permanecerá para sempre.
LEGENDA FOTO 1 - Georg Philipp Telemann: em dois novos LPs.
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