Login do usuário

Aramis

O belo som do trombone de Raul em dois álbuns

Das poucas gravadoras totalmente brasileiras, a Companhia Industrial de Discos tem um marketing especial de trabalho. Dispondo de parque próprio para prensagem de seus LPs (e que até há pouco era usado por outras etiquetas), a empresa da família Zuckermann mantém um catálogo quase que permanente de elepês nacionais e internacionais, comercializados a preços até 50% mais baratos do que os de suas concorrentes e colocados em supermercados e grandes lojas de departamentos. Com isso, oferece LPs a um público massificado que normalmente não frequenta as lojas de discos - onde os nacionais já estão sendo comercializados até a Cr$ 100 mil (atenção Sunab! que tal dar uma fiscalizada nas lojas da cidade?) E no amplo suplemento da CID é possível encontrar discos dos mais interessantes, produzidos com simplicidade mas valorizando talentos - muitos dos quais esquecidos - de nossa MPB: No ano passado, Severino Araújo e sua Orquestra Tabajara reapareceu com um ótimo LP - que, merecidamente, entrou na lista dos melhores discos instrumentais do ano. Raul (Machado) de Barros, (Rio de Janeiro, 25/11/1915), considerado o grande executante de trombone de vara do Brasil, tendo influenciado muitos músicos - inclusive o também carioca João José Pereira de Souza (RJ, 24/8/1934), que devido ao seu estilo e talento, ao se apresentar num programa de calouros de Ary Barroso, nos anos 50, foi por ele chamado de Raulzinho. E como Raulzinho, ficou conhecido no Brasil e a partir do final dos anos 60, também nos Estados Unidos, onde gravou vários LPs (no início do ano, Raulzinho voltou ao Brasil, fazendo temporada e gravando lp através da etiqueta do restaurante "Inverno & Verão", em São Paulo) (1). Mas voltemos ao Raul de Barros, que começou ainda garoto - nos anos 30, a tocar saxofone, substituído depois pelo trombone, que aprendeu com Eugênio Zanata. Há 50 anos integrava grupos que animavam bailes de bairros do Rio de Janeiro e trabalhava nos dancings Carioca e Eldorado, onde o maestro Carioca o levou para a Rádio Tupi. Em 1938 começou a acompanhar cantores em gravações e excursionou a Montevidéu. De volta ao Brasil, passou para a rádio Globo e formou sua própria orquestra, tocando no programa Trem da Alegria. Logo depois gravaria na Odeon o seu maior chorinho, o clássico "Na Glória". Em 1950, casado com a cantora Gilda de Barros, crooner de sua orquestra, transferiu-se para a Rádio Nacional, onde chegou a ter programa semanal. Em 1955, numa votação promovida pelo crítico Ari Vasconcelos, em sua coluna da revista "O Cruzeiro", foi escolhido o melhor trombonista do ano. Nos anos seguintes gravou quatro LPs na Odeon, acompanhou Gilberto Alves num de seus melhores discos na Copacabana e, em 1966, fez parte da delegação brasileira no Festival de Arte Negra de Dacar, no Senegal. Só em 1974 voltaria a gravar um esplêndido lp, na etiqueta Marcus Pereira. Como tantos outros grandes instrumentistas, Raul de Barros tem permanecido esquecido nos últimos anos. Por isto, a iniciativa de Harry Zuckermann de produzir dois álbuns com Raul de Barros, acompanhado por ótimos instrumentistas, com arranjos de Ivan Paulo, foi das mais saudáveis. "O Trombone de Ouro" (CID 4140) e "O Som da Gafieira (CID 4064), mostram que aos 70 anos - completados no final do ano passado - o veterano trombonista está em plena forma. Legítima expressão da época das big bands (sua orquestra, há 35 anos, procurava o modelo de Bemmy Goodman e Art Shaw) - Raul intercala clássicos do repertório nacional, com imortais hits americanos. Assim, em "O Trombone de Ouro", após a abertura com "Na Glória", temos "Pennsylvania 6-5000" - imortalizado por Glenn Miller e "Tea for Two", seguindo-se "Copacabana", "Doce de Côco", "Ave Maria" e "Pedacinhos do Céu". No lado dois, após "Ela Disse-me Assim" e "Canção de Amor", dois outros standards da época de ouro da música orquestral americana: "Chattanooga Choo-Choo" e "The Continental". O mesmo esquema se repete em "O Som da Gafieira", no qual acompanhado por uma fictícia "Orquestra Brasilian Serenade" (formada por músicos de estúdio), Raul vai desde "Moonlight Serenade" até suas próprias composições ("Tema de Gafieira Flor de Liz"), trazendo também crooners como Zé Carlos (Piston de Gafieira, "Passarinho"), e Zé Ventura ("Escurinho", "Estatuto de Gafieira", "Piston de Gafieira", "Casa de Bamba", e "Coração Leviano"). Dois esplêndidos discos de um grande músico. Nota (1) A "Inverno & Verão" é uma nova e original etiqueta alternativa. Edita LPs dos artistas que se apresentam naquele luxuoso restaurante de São Paulo. Até agora esses discos somente são vendidos na Capital paulista.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
27
09/03/1986

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br