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Aramis

O canto da esperança contra o medo do AI-5

Chico (Buarque de Holanda), Gonzaguinha (Luiz Gonzaga Jr.), Ivan Lins, Aldir Blanc, Maurício Tapajós, Hermínio Bello de Carvalho e muitos outros já disseram em várias entrevistas: fizeram as músicas que achavam necessárias de serem feitas mas nem por isto poderiam ficar na condição de permanentes contestadores do regime. Narinha Leão, que sempre se disse apenas uma intérprete, quando a situação estava bem tensa, em setembro de 1972,, na qualidade de presidente do júri do VII (e último), Festival Internacional da Canção, foi ameaçada de ser presa por ter "falado mal" dos generais, que exigiram da Globo a sua retirada do júri. Antes de sair, Nara fez a cabeça dos seus colegas e conseguiu uma premiação especial para a mais irreverente música que participava da parte nacional do FIC, a vanguardista "Cabeça" do paulista Walter Franco, filho do deputado comunista Cid Franco. Politicamente consciente desde seus tempos de musa da Bossa Nova - e que quando estreou como cantora já o fez cantando "Maria do Maranhão" (Carlos Lyra / Nelson Lins de Barros, do musical "Um Americano em Brasília" nunca encenado, 1962), Nara foi, durante muitos anos, tida como a musa não mais da BN, ou a cantora dos joelhos charmosos - mas como a contestadora do regime. - "O pessoal passou a querer de mim posições que eles não tomam" - comentava conosco, há muitos (e muitos) anos, numa de suas primeiras vindas a Curitiba. Geraldo Vandré, 53 anos, é hoje uma distante sombra do contestador de 20 anos passados, quando fez o Maracanãzinho cantar "Prá Não Dizer Que Não Falei de Flores" que se transformaria num hino espontâneo da resistência - enquanto ele, a exemplo de outros artistas brasileiros - amargava o exílio. Mas se Vandré sofreu o exílio - como os baianos Caetano e Gil, entre os nomes mais famosos (aos quais também se pode acrescentar o de Taiguara), os que aqui ficaram, com toda a energia e através de mil formas, fizeram a música de resistência. Chico Buarque não foi o único - embora tenha sido um dos mais talentosos e, por isto mesmo, o mais visado pela censura. No dia 2 de março de 1975 no encerramento do grande festival de MPB que havia sido organizado para as comemorações de inauguração do auditório Bento Munhoz da Rocha Neto, a sua apresentação - ao lado do MPB-4 - só foi permitida depois que até o então superintendente da FTG, Sale Wolokita (hoje coordenador de Ação Cultural do Estado), se comprometeu junto aos censores de que Chico não cantaria as música que estavam proibidas. Mas qual o quê! Na hora do show, o público que lotava o Guairão (como voltou a acontecer agora no dia 8, quinta-feira, na apresentação de "Francisco"), os pedidos foram tantos que Chico, embalado por generosas doses de Dimple's tomadas no camarim, não teve dúvidas e disse para a platéia: -"Seja o que Deus quiser e vamos cantar tudo". Cantou. O público vibrou e a comemoração foi no bar Palácio, numa mesa enorme, que estava tão alegre, que o empresário Cecílio Rêgo Almeida, ao lado de sua esposa Rosarita, ali presente, acabou se entusiasmando e pagando a conta. Coisa que até hoje o Chico e o MPB não souberam. Entre os temas para o projeto Lúcio Rangel de Monografias, que a FUNARTE promove há 11anos, através de sua divisão de Música Popular, está o da repressão dos anos 60/70 na MPB. Pois só através de demoradas pesquisas - e centenas de páginas - se poderá fazer justiça a todos que souberam resistir a estupidez, a ignorância, a idiótica e sobretudo a violência dos eventuais donos do poder que tanto se assustavam, especialmente a partir daquele fatídico 13 de dezembro de 1968, com a voz dos poetas de nossa música. Os violões contra os canhões, a poesia contra os atos institucionais, numa batalha em que a inteligência acabou ganhando - pois destes anos de repressão ficaram momentos antológicos de nossa nação. Em compensação, alguém é capaz de lembrar o nome dos infelizes que passaram pela chefia da divisão de Censura de Polícia Federal? A não ser daquele tragicômico Romero Lago, um vigarista gaúcho que durante tantos anos conseguiu ficar por dentro dos federais e enganar os homens de segurança. LEGENDA FOTO - Vandré: autor do hino da resistência
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Nenhum
10
11/12/1988

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