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Aramis

O colonialismo cultural destrói sotaque caipira

Até que ponto Fábio Ramos, líder (sic) do "Dragões do Heavy Metal", responsável pelo incidente ocorrido no CGT Gaudérios do Oeste, em Cascavel, pode ser responsabilizado sozinho? Talvez seja mais vítima do que algoz de um processo de lavagem cerebral que, a partir da globalização do Brasil em termos de "programação artística", leva a destruição dos valores locais e substituição pelo que de pior existe no lixo internacional. Este ano, durante a 14ª edição do Festival da Canção Regional Popular, promovido pelo Tuiuti EC, entre os concorrentes na primeira noite (17-07-86), apareceu um sub-grupo de rock, de Jacarezinho, defendendo (sic) uma não-música intitulada "Ironizados" (M. Albuquerque/Paulo Menezes), e cujo líder era um garoto de 17 anos, cabelos ao estilo punk. Conversando com a estranha figura do adolescente, deu para perceber seu nível de debilidade mental e falta de informação artística, que o levou a um festival com uma música (sic) tão primária e apresentada de forma roqueira - apesar de partir de uma idéia interessante - a contaminação da usina de Chernobyl, na URSS. Há 12 anos passados, num festival realizado em Pato Branco, havia nada menos do que 5 músicas concorrentes com letras em inglês. Em outras pequenas cidades do Interior - não só no Paraná, mas em todo o Brasil - multiplicam-se festivais municipais nos quais o que predomina é o sub-rock do pior nível, com desprezo à música regional. Em Londrina, há 9 anos, um grupo vindo de Teresina, trouxe um lamentável espetáculo no qual ao invés de raízes musicais do Nordeste, intercalava elementos pop. Ricardo Cravo Albim, fundador do MIS-RJ, pesquisador da MPB, chocado com a manifestação de macaquice cultural, procurou o responsável pelo grupo para saber o que poderia ter levado a que uma manifestação do mais pobre e atrasado Estado do Brasil, trouxesse uma péssima cópia do que, na época, era up to date em Londres. Explicação: interligada a rede nacional de televisão, a "juventude" piauiense estava desprezando a centenária cultura popular da região e adotando o comportamento que via em programas da rede Globo, especialmente um que Nelson Motta apresentava nas tardes de sábado. Sem comentários. xxx Só agora, graças ao esforço, garra e luta de alguns idealistas - como José Ernesto Tavares, secretário de Turismo de Campo Mourão, se tenta realizar no Paraná um festival de origens nativistas ("Cante Terra", 26/29 de setembro de 1986). No Rio Grande do Sul, se discute muito a abertura dos festivais mais tradicionais - a partir da própria Califórnia, em Uruguaiana - onde, em dezembro último, a premiação a uma música de Jerônimo Jardim, fugindo da linha nativista, levou o público, irado, a agredir artistas e promotores, no palco, com latas de cerveja e mesmo pedras. Por tudo isto, a idéia de Edson Otto, diretor do Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore, em promover na cidade de Tramandaí, entre 30 de outubro a 2 de novembro o I Acorde Brasileiro - Seminário Nacional em Defesa da Música Regional Brasileira - não poderia ser das mais felizes. E, a presença do heavy metal num CGT do Oeste do Paraná, será, por certo, tema para um acalorado debate. Que dirão os nativistas rigorosos, como Antonio Augusto Fagundes (produtor do "Galpão Crioulo", RBS) e Glenio Pires ("Teluríssomo"), sobre esta decadência tradicionalista? xxx Agora, em cidades como Ponta Grossa e mesmo Cascavel, há jovens já falando em "cultura" Dark. Começam a surgir ambientes para este novo modismo artificial que, em Curitiba, também já tem alguns macacos copiadores - em princípio aparencendo no Volts e outras bocas. Mas isto é tema para outro comentário...
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
13
12/08/1986

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