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Aramis

O discurso amoroso com o marketing de Fagundes

É uma pena que certas promoções culturais não aconteçam com maior planejamento: a temporada de "Fragmentos de um Discurso Amoroso" (Auditório Bento Munhoz da Rocha Neto, 27 a 31 de outubro, 21 horas, ingressos entre Cz$ 2.500,00 a Cz$ 1.500,00) poderia ser uma motivação para que fossem exibidos nesta semana dois interessantíssimos filmes realizados com base também no texto de Roland Barthes - "A Espera", de Maurício Farias e "Carlota / Amorosidade", de Adilson Ruiz - e, por que não! Palestras-debates com especialistas na obra de Barthes. A professora Cassiana Lícia de Lacerda Carolo, da Universidade Federal do Paraná, porque não! A maioria do público que deve lotar o grande auditório do Teatro Guaíra - pelo menos essa é a esperança da produtora local, a querida Verinha Walflor - vai atraída pelo carisma de Antônio Fagundes, o "Ivan" da telenovela "Vale Tudo" e intérprete de vários longa-metragens realizados nos últimos anos - inclusive "A Dama do Cine Shangai", de Guilherme de Almeida Prado, o mais premiado no último Festival de Gramado e agora em reprise na cidade (Cine Groff, 5 sessões). Entretanto, o nível de entendimento do texto de Roland Barthes (1915-1980), semiólogo francês que está entre os intelectuais mais importantes deste final de século, exige um "approach" cultural mínimo, que, evidentemente, não se pode exigir do público, especialmente o feminino, para quem o carisma da encenação repousa no "sex appeal" masculino de Antônio Fagundes, hoje, sem dúvida, um dos melhores atores brasileiros e capaz de lotar auditórios. xxx Possivelmente vai se repetir o mesmo que ocorreu há alguns anos, quando Paulo Autran e Tônia Carrero atingiam os mais altos índices de Ibope com uma telenovela na Globo e montaram a peça "A Amante Inglesa", da francesa Marguerite Duras (autora do roteiro de "Hiroshima, mon Amour", 1959, de Louis Malle), num texto dificílimo (e de cuja montagem participava também Jacqueline Lawrence). Fascinado pelo nome de Autran e Tônia, o público lotou o Guaíra mas ficou absolutamente sem entender o espetáculo - dos mais densos e profundos, dificílimo em seu conteúdo. Com "Fragmentos de um Discurso Amoroso", o huis clos intelectual talvez não chegue a tanto, pois para um profissional consciente como Antônio Fagundes, a adaptação do texto (ou parte dele) visou transformar a proposta do semiólogo francês numa linguagem acessível. E, para provar isto, há meses que vem usando seus fins de semana (quando não está gravando a telenovela de Gilberto Braga) para percorrer até pequenas cidades do Interior, sempre com sucesso de público. Uma coisa, entretanto, o espectador não poderá economizar: a compra da revista-programa, pois ali há um belo texto de três páginas, assinado pela professora Leyla Perrone Moisés ("O Semiólogo Apaixonado") que ajuda a compreender a importância de Roland Barthes, iniciando com a própria definição do que é semiologia. A questão é saber se o espectador chegando ao teatro terá tempo (e concentração) para absorver o texto central - e mesmo as outras teorizações a respeito desta produção - "Dialética", do diretor Ulysses Cruz; "Apaixonados do Mundo Inteiro, Uni-vos", de Teresa de Almeida - que fez a adaptação do texto - e "Palavras, Palavras, Palavras...", do próprio Fagundes. Produção da Companhia Estável de Repertório, um dos grupos mais bem estruturados do país, "Fragmentos de um Discurso Amoroso" estreou na sala Rubens Sverner (Teatro Cultura Artística, São Paulo), em 9 de março de 1988. Trata-se de uma montagem cuidadosa e avançada, para o grupo dirigido administrativamente por Lenine Tavares e que, anteriormente, já colheu sucessos (de público e de crítica) com outras montagens como "O Homem Elefante", "Morte Acidental de um Anarquista", "Xandu Quaresma", "Cyrano de Bergerac", "Carmen com Filtro" (esta também uma proposta avançada, direção de Gerald Thomas) e, por último, "Nostradamus", que devido ao custo de produção não tem condições de viajar. Antônio Fagundes é a estrela do espetáculo - garantia do público - e ao seu lado estão quatro intérpretes ainda pouco conhecidos: Roberto Moreno, Mara Carvalho, Luca Baldovino e Renato Orbite. A música foi criada por André Abujamra e a cenografia e figurinos por Ninette Van Buckelen. LEGENDA FOTO - Fagundes: em "Discurso Amoroso", o mergulho na obra de Roland Barthes.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
26/10/1988

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