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Aramis

O festival que o Paraná não pôde ver

O 1º Festival Internacional do Jazz; promoção da Secretaria da Cultura, Ciência e Tecnologia, que, apesar de alguns senões, foi plenamente justificável em termos culturais (São Paulo,11 a 18 de setembro) foi visto por milhões de pessoas: além de quase 60 mil pessoas que lotaram as sessões vespertinas e noturnas, no Palácio das Convenções, no Parque Anhembi (com ingressos variando de Cr$ 50,00 a Cr$ 300,00) chegou aos receptores de televisão em oito Estados, já que a copromotora do evento, Fundação Padre Anchieta/Televisão Cultura (Canal 2) gerou imagens de todos os espetáculos no horário da noite. O próprio Lenard Feather, autor [da] "Enciclopédia of Jazz" e, reconhecidamente, uma das maiores autoridades mundiais no assunto, surpreendeu-se com essa ampla difusão do Festival, inexistente mesmo nos Estados Unidos e Europa. Críticos de televisão, de quase todos os grandes jornais, elogiaram a qualidade da transmissão, com imagens belíssimas, som perfeito e comentários precisos, a maioria a cargo do jornalista Maurício Kubrusly, ex-Jornal da Tarde, intervenções do produtor Julio Lerner (não confundir com o engenheiro-empresário curitibano, mano do ex-prefeito Jaime) e apresentação de Fausto Canova. xxx E o fato das imagens dos espetáculos inesquecíveis do Festival Internacional do Jazz terem chegado até o Amazonas não deixa de provocar, nos curitibanos, um pouco de inveja. Pois justamente a TV-Cultura que há mais de 2 anos funciona em Manaus é aquela que poderia estar funcionando no Paraná, aqui apresentando uma programação do mais alto nível. Não custa recordar o que na época denunciamos nesta mesma coluna: o acomodamento, desinteresse e mesmo má vontade das "autoridades" de alguns setores do Estado provocou que o equipamento para a instalação da TV-Cultura, doada pelo governo da República Federal da Alemanha ao Brasil e que poderia ser aqui montada, fosse levado para a capital do Amazonas, onde o secretário de Educação e Cultuar mostrou maior agilidade e interesse. Na época (1976), o Professor Mousinho Coelho era o secretário-executivo do Prontel, órgão do Ministério da Educação e Cultura que cuidava do encaminhamento dos processos de instalações de canais de rádio e televisão destinados exclusivamente à difusão de programas culturais. Mousinho procurou de todas as formas sensibilizar o governo do Paraná para que mostrasse interesse em trazer ao Paraná um Canal de TV na faixa cultural, inclusive sem ter que fazer o investimento do equipamento, doado pela RFA. Entretanto apareceram os mais absurdos argumentos contrários: "o paranaense não tem interesse por este tipo de programação", "vai custar muito caro a manutenção", "não dispomos de gente preparada para desenvolver a programação"222 etc. xxx Mousinho Coelho - que viria posteriormente a se afastar do Prontel, desiludido com a politicagem e jogo de interesses, chegou a fazer sugestões de como se poderia montar uma programação local, utilizando elementos preparados para fazer produções culturais, mas que até hoje não tiveram oportunidade de aplicar os conhecimentos que dispõe citando o exemplo da professora Lúcia Gluck Camargo, do curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Paraná; uma dezena de cursos e estágios na área; mas a quem; ate hoje; não se deu a menor chance de mostrar o seu conhecimento. Infelizmente, prevaleceu a apatia, a má vontade e Mousinho Coelho se cansou de pregar no deserto. O equipamento foi destinado ao governo do Amazonas que montou um canal de difusão cultural, com uma boa linha de atuação e que tem levado a Amazônia uma programação que os paranaenses estão condenados a não assistir. O então secretário da Educação e Cultura, Francisco Borsari Neto - hoje tranqüilo com seu seguro cargo no Tribunal de Contas do Estado - alegava na época que "antes de pensarmos em montar a estação de televisão é preciso preparar o pessoal". Se falou em cursos de produção e técnicos, citou-se projetos mas nada de concreto foi feito. E hoje está mais difícil do Paraná ganhar uma TV Cultura, embora o futuro governador Ney Braga tenha alguns planos na área, utilizando recursos e know-how da Fundação TV Educativa, do Rio de Janeiro. xxx Além da TV-Cultura, o Festival Internacional do Jazz foi transmitido também pela Rádio Cultura, em AM e FM, com som de excelente qualidade, possibilitando que milhares de ouvintes gravassem os grandes momentos da promoção (a tal ponto que em algumas lojas de São Paulo desapareceram os estoques de fita virgem). Se a Rádio Estadual do Paraná não fosse a filha enfeitada, sem equipe e funcionando (ainda) precariamente, poderia ter se habilitado ao menos a transmitir parte dos concertos. Mas a nossa Rádio Estadual, como também não nos cansamos de denunciar, é outro exemplo da desatenção do governo para com os canais de difusão cultural. Embora, após a morte do inesquecível Aluísio Finzetto (1917-1976), graças a cujo idealismo foi criada (1960) e sobreviveu por 16 anos, tivesse se falado muito na aplicação de recursos maciços na emissora, até agora os resultados práticos foram mínimos. Foram providenciadas novas instalações da rádio, retirando-a da vizinhança a que estava relegada, nos fundos da delegacia de plantão, na Travessa da Lapa, anunciou-se compra de novos equipamentos e aumento de potência. A rádio está agora no 2º andar do edifício Caetano Munhoz da Rocha, em acarpetados gabinetes. Mas, até hoje, não se fez o menor esforço para dotá-la de uma equipe de produção competente, locutores eficientes, técnicos bem remunerados - sobrevivendo ainda graça são trabalho anônimo e entusiasta de poucos profissionais que recebem salários indignos. xxx A transmissão dos espetáculos do 1º Festival Internacional de Jazz por rádio e televisão, atingindo oito Estados, possibilitando que milhões de pessoas ouvissem (e vissem) músicos da dimensão de um Dizzy Gillespie, Ray Brown, Milt Jackson, Franck Rossolino, Astor Piazzolla, entre outros, justificou o alto investimento do evento - oficialmente declarado em Cr$ 8 milhões, mas que teria, segundo alguns, passado dos Cr$ 12 milhões. A realização de um ciclo de conferências e exibição de excelentes filmes sobre jazz (vindos diretamente de Washington, só para esta promoção), nos eventos paralelos coordenados por José Eduardo Homem de Mello, foram boas justificativas para o empreendimento - que deverá repetir-se em 1979, além de possivelmente estimular promoções semelhantes no Rio de Janeiro. E no caso do Paraná, tão orgulhoso de seu milionário Festival Internacional de Música, os concertos que são realizados durante todo o mês de janeiro poderiam ser transmitidos pela TV Cultura, se a mesma existisse. Mas nem mesmo os raros ouvintes da Rádio Estadual puderam ouvir, há 2 anos, quando do último festival, os concertos sequer em gravações. Não havia, simplesmente, dinheiro para comprar fitas. Nem em minicassetes.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
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21/09/1978

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