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O Paraná no canto de Belarmino e Gabriela

Nhô Belarmino e Nhá Gabriela. Mais do que uma dupla de artistas sertanejos, uma verdadeira identificação com o Paraná dos anos 40 a 70. Donos de uma popularidade regional tão representativa quanto de outras duplas em outros Estados - Cascatinha e Inhaná, Jararaca e Ratinho, para só citar dois exemplos. Que em programas das pioneiras rádios dos anos 40, em pesadões 78 rpm e principalmente ao vivo, em shows de circos, pavilhões e auditórios das emissoras - levavam suas canções e humor cáustico e malicioso para os padrões da moral da época. Nhô Belarmino (Salvador Graciano), Rio Branco do Sul, 1920) e Nhá Gabriela (Júlia Alves Graciano, Curitiba, 1923), mostraram sempre um humor bem paranaense e os que têm acima dos 35 anos cresceram ouvindo os programas de auditório da Rádio Guairacá, "A Voz Nativa da Terra dos Pinheirais" acostumaram-se às canções da dupla, suas estórias de uma comicidade ingênua mas que deliciava as platéias humildes que aos domingos lotavam o auditório da ZYZ- 9, instalada num sobrado na Rua Barão do Rio Branco - vizinha à sua principal corrente - a Rádio Clube Paranaense - edifícios hoje incorporados a Hermes Macedo S/A, na época já existente, mas modestamente, apenas na loja da esquina da Barão com a José Loureiro. xxx Emocionante, portanto, a quem é paranaense e sabe do significado cultural dentro da nossa música popular, da história do rádio, dos espetáculos populares que durante mais de 30 anos levaram as mais distantes cidades do Estado, o retorno de Nhô Belarmino e Nhá Gabriela ao disco. Desde 1982, quando a convite da dupla de compositores Paulo Vitola e Marinho Galera participaram emocionados, da gravação de "Moçinhas da Cidade", incluída como faixa homenagem do belo álbum duplo "Cidade da Gente", que a dupla não entrava em estúdio. Em setembro último nos estúdios da BG, pertencente a Ivan Graciano, filho do casal Belarmino e Gabriela gravaram a ufanista "Salve, salve Paraná" (Agnelo Chaves/ Pedro Chaves) e "Mora Lá", de Belarmino e Ivan Graciano, canto de amor e admiração à cidade de Antonina, onde a família possui um pequeno sítio, no qual costumam passar os fins de semana e férias. Belarmino e Gabriela nos últimos anos, pouco a pouco afastando-se de um trabalho mais regular, passaram quase a morar em Antonina, cidade que cantam como "uma cidade pequena/ onde a vida é serena/ Onde a tristeza não vem". Nos últimos meses, entretanto, o casal tem permanecido mais em sua casa na Rua Floriano Essenfelder, no Alto da Glória. Salvador Graciano, aos 64 anos, sofreu três derrames que lhe tiraram muitos dos movimentos e, ainda recentemente numa queda, fraturou a perna esquerda. Apesar da doença, o amor a música é forte e assim participou intensamente na produção deste compacto, no qual os vocais principais são de Gabriela (Júlia Alves), que aos 61 anos, felizmente, conserva ainda aquela voz saborosamente forte e curitibana, que há tantos anos os paranaenses conhecem. Acompanhado pelo violão de 7 cordas de Nilo, pelo violão tenor de Adão, flauta de Alaor, cavaquinho de Janguito do Rosário, contrabaixo de Daniel, bateria de Arthur, o filho Ivan no acordeon, mais participação afetuosa de Marinho Gallera, paulista de nascimento mas paranaense de adoção que sempre admirou a dupla, Belarmino e Gabriela, cantando "Salve, salve o Paraná" e "Mora Lá" representam uma espécie de documento sonoro de um Paraná musical que desaparece. xxx Nhô Belarmino, em cadeiras de rodas, estará na próxima sexta-feira, num acontecimento muito especial: a inauguração do restaurante "Leite Quente", um ambiente 100% paranaense - "a partir do nome-sotaque escolhido", explica Ivan, que nesta semana está dando os últimos retoques na casa, instalada num espaço de 750 metros. Por alguns anos, Ivan fez do "Forró Belarmino & Gabriela", uma das casas mais movimentadas e simpáticas em Santa Felicidade. Entretanto a inveja, mediocridade e interesse de um ex-vereador daquele bairro, em proteger um parente, forçaram a cassação do álvara de funcionamento. xxx Agora, "Leite Quente" funcionará em outro esquema: embora com pista de dança e música ao vivo, será "um espaço 100% paranaense e nossas coisas". A começar pela decoração, com painéis fotográficos lembando personagens identificados com Curitiba - como o palhaço Chic Chic, o travesti Gilda, Maria da Cavaquinho, Esmaga e tantos outros que deram sempre o sentido humano a esta cidade sem portas. Um grande painel, é claro, está reservado a Belarmino e Gabriela, não apenas num amor de Ivan aos seus pais, mas pelo quanto representa esta dupla de artistas dentro de nosso vida artistíca. Desde aos 12 anos, Salvador já se apresentava como Nhô Belarmino, em dupla sertaneja com a irmã Pascoalina, então com 9 anos. Cantavam em festinhas nas redondezas de Rio Branco. A carreira foi interrompida pelo casamento de Pascoalina. Aos 16 anos, Salvador compôs sua primeira música, "Linda Serrana" e vindo para Curitiba, formou dupla com Chiquinho Montalto trabalhando na Clube Paranaense, então a única rádio do Estado - e a terceira do Brasil (fundado em 1924, completará agora 60 anos). Foi ali que Salvador conheceu Júlia Alves, com quem se casaria dois anos depois. Como dupla, estrearam em 1940 e durante pelo menos duas décadas e meia foram os artistas de maior popularidade do Estado. Gravaram dezenas de 78 rpm na RCA-Candem, Copacabana, Continental e CBS. Acordeonista seguro, bom compositor, Belarmino criou inúmeros sucessos - Um dos quais, "Passarinho Prisioneiro", se tornou um verdadeiro hino ecológico, cuja transformação em um filme já tentou, há 5 anos, o produtor e distribuidor Isidoro Lassalvia. Outro sucesso de Belarmino, "As Mocinhas da Cidade", foi gravado pelo cantor Roberto Leal, numa roupagem jovem. Ivan Graciano, 39 anos, também acordeonista e compositor, ao fundar a BG Discos, ao lado da produção de compactos e elepês de vários artistas rurais/ rurbanos do Paraná e Santa Catarina, preocupou-se em remixar as antigas gravações da dupla, reunidas em dois LPs - "Os Sucessos de Nhô Belarmino e Nhá Gabriela" (1980) e "Paixão de Caboclo" (1983). Da velha Rádio Guairacá, com seus programas de auditório, só ficou a saudade, mas Belarmino & Gabriela passaram pela televisão, com programas de boa audiência nas manhãs de domingo, apresentaram programas em outras rádios - Colombo e Clube Paranaense - e, até 3 anos passados, atendiam ainda uma impressionante agenda de compromissos artísticos no Interior, fazendo shows desde comícios políticosa, até festas de aniversário de prefeitos. Uma popularidade fiel, conquistada honestamente pela sinceridade com que sempre trabalharam. Assim, no pequeno compacto com Belarmino e Gabriela cantando "Salve, salve o Paraná" e "Mora Lá", está um retrato sonoro de uma época de nossa música paranaense.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
10/01/1984

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