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Aramis

O romantismo de Laura, poeta negra da cidade

Se não fosse a memória de Helena Kolody talvez nunca mais fosse lembrado o nome de Laura Santos. A nossa maior poeta (que muitos insistem em chamar poetisa) em respeitadas entrevistas, sempre tem lembrado os méritos de Laura Santos, a única poeta que nasceu no Paraná e que morta há apenas nove anos, ficou totalmente esquecida dos "estudiosos" de nossa literatura, mesmo tendo três livros publicados em vida, todos em 1953. "Sangue Tropical" (que chegou a ser premiado pela Academia José de Alencar), "Poema da Noite" e "Desejo". Felizmente, a Secretaria da Cultura ouviu as sugestões de dona Helena e após algumas dificuldades localizaram-se seus textos e se conseguiu algumas informações a seu respeito. Resultado: numa econômica edição (reduzidíssima aliás, de apenas 500 exemplares) foram reunidos 48 de seus poemas, antecedidos de um breve prefácio/introdução. Rose Marye Bernardi informa que Laura Santos, filha de Manoel e Antônia Golçalves dos Santos nasceu em Curitiba em 30/11/1919. Admiradora do parnasiano Olavo Bilac, aos 13 anos escrevia seu primeiro soneto: "Aspiração". Cursou a Escola Normal Júlia da Costa e lecionou matemática e Língua Portuguesa no Grupo Escolar D. Pedro II, em Curitiba. Idealista, freqüentou o curso de enfermagem de guerra, pensando em alistar-se pela Cruz Vermelha e prestar serviços em campos europeus durante a II Guerra Mundial. Não chegou a entrar no batalhão médico da FEB mas ingressou, mediante concurso, no setor de saúde pública e se tornou visitadora sanitária, orientando a comunidade a respeito de noções de higiene, puericultura e prazos de imunizações. Aposentou-se como educadora sanitária. Sócia fundadora da sociedade José de Alencar - na qual ocupou a cadeira patrocinada por Júlia da Costa, Laura publicou poemas, esparsamente, nas páginas da "Gazeta do Povo" e no "Diário da Tarde", e mais os três livros. Faleceu em 21 de outubro de 1981, sem que qualquer jornal fizesse o menor registro. xxx Mulher e negra, há os que imaginaram a poesia de Laura Santos como social e feminista. Entretanto, Rose Marye Bernardi, após estudar todas as suas poesias chegou a uma conclusão que decepcionou quem assim imaginava Laura: "Não há nenhum salto em busca de vibrações temáticas ou técnicas vanguardistas e tampouco encontramos neles qualquer eco de negritude ou qualquer reivindicação feminista, como poderia fazer supor sua condição de mulher negra na Curitiba provinciana que foi cenário de sua existência". Laura foi, ainda no entendimento de Bernardi, uma "voz pungente de um ser humano delicado, incuravelmente romântica". Diz mais: - "Seus poemas, embora seja impossível resgatar a cronologia de sua composição, desvendam, num tênue fio biográfico, os sofrimentos de um corpo e de uma alma exasperadamente feminina. É através do corpo que lhes chegam as sensações do mundo trazidos como sentimentos. É através do corpo que ela tenta se comunicar com o exterior, com o outro. Mas o corpo, fremente de desejo, está sempre só, concretizando a "triste solidão de sua alma vazia". Assim, as imagens eróticas, tão freqüentes em seus poemas, são uma espécie de metáfora de sua relação básica com o mundo, de viver plenamente, de ser feliz". Da obra de Laura Santos, Rose Marye Bernardi pinçou uma estrofe para encerrar sua introdução, que define um pouco da lírica da poeta estudada. E se puder doar aos versos que componho O sentido ideal que encanta e harmoniza Eu sentirei orgulho e sentirei a glória - Glória de ter nascido poetisa!
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
20
15/11/1990

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