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Aramis

O supershopping de Pinhais (I)

Dentro de vinte meses o município de Piraquara, até hoje uma espécie de filho enjeitado da região metropolitana de Curitiba, passará a ter uma injeção de alguns milhões de cruzeiros em seu orçamento municipal. No mínimo mais 5 mil empregos serão abertos e uma imensa área às margens da PR-415 (a chamada "Estrada do Encanamento") se transformará em movimentado espaço comercial. Um dos mais fortes grupos empresariais do mundo, o C&A, constituído por holandeses e americanos, construirá a 15 km do centro de Curitiba, na região de Pinhais, o maior shopping-center do Sul do Brasil - e um dos maiores da América do Sul. xxx Uma área de 30 alqueires, pertencente à família Santos, já foi adquirida - por uma soma total não revelada oficialmente mas que [tranqüilamente] passa dos Cr$ 50 milhões e as motoniveladoras da empreiteira Gusso começaram a trabalhar na terraplanagem da área onde será construída uma primeira etapa de 50 mil metros quadrados, para o supershopping - center. A firma Linderbergh - De Mari, já com contratos assinados, instala o canteiro de obras em menos de dois meses para, em ritmo intensivo, concluir até agosto de 1980 este [shopping]-center que, no mínimo, transformará a estrutura comunitária e de comportamento não só da região de Piraquara mas atingindo, violentamente, o comércio de Curitiba. xxx O projeto do grupo C&A em investir milhões de dólares na construção de uma rede de shopping-centers no Brasil não é novo. Já com empresas de porte médio em algumas capitais, a loja de departamentos que inaugurou há pouco mais de um ano na Rua 15 de Novembro, no edifício de 4 andares adquirido de Hussain Omairy, foi não só ponta-de-lança no mercado local, como confirmou as possibilidades de se fazer, na região de Curitiba, um investimento que chegará, em apenas dois anos, a Cr$ 500 milhões. Os resultados obtidos pela loja local de departamento da C&A, modesta considerando o poderio do grupo, foram suficientemente estimulantes e amparados em pesquisas de mercado, estudos e planejamento de marketing a decisão foi tomada nas mais altas esferas. xxx A intenção primeira do grupo era construir o supershopping-center, dentro do município de Curitiba. A primeira área considerada ideal foi a pertencente à família Glaser, no Atuba, próxima as oficinas da Empresa de Ônibus Nossa Senhora da Penha. O arquiteto-chefe da equipe da C&A, William Estefanskis, autor de mais de 40 projetos de shoppings semelhantes, em vários países do mundo, esteve várias vezes em Curitiba e, juntamente com a consultoria de engenheiros locais, principalmente Mário de Mari, chegou a fazer um anteprojeto. A operação de compra estava adiantada quando o Instituto de Pesquisas e Planejamento urbano de Curitiba, implacável em seu rígido zoneamento, acendeu as luzes vermelhas. Entre outras argumentações, a de que a construção de um centro comercial de proporções gigantescas na entrada da cidade congestionaria o trânsito. O grupo, pacientemente, aceitou o veto imposto pelo IPPUC e se voltou a outra área, nas margens da BR-116, próxima à Avenida das Torres - então ainda em fase de obras. Novo veto por parte do órgão que regula o planejamento e crescimento de Curitiba. Uma terceira área, no prolongamento da Avenida Iguaçu, teria o sinal verde do IPPUC, mas, neste caso, quem não se interessou foi o grupo: os proprietários exigiram um preço tão absurdamente alto que mesmo com todo o poderio econômico dos holandeses o negócio seria inviável. Além do mais, a área não possuía acesso pavimentado, inexiste canalização de água, saneamento e outros serviços públicos. xxx Descontentes com a falta de perspectivas de fazer o shopping-center em Curitiba, o grupo decidiu instalá-lo em município vizinho. Novas pesquisas até ser encontrada a área considerada ideal: 30 alqueires no município de Piraquara. O prefeito Luís Cassiano Fernandes (Arena) recebeu a idéia com a maior boa vontade, não impôs nenhuma restrição e facilitou ao máximo os entendimentos. Outro fato que contribuiu para a rápida compra da área foi da mesma pertencer aos membros de uma mesma família, liderados pelo sr. Odir Santos (hoje um dos novos ricos do Paraná), que acabou fazendo o negócio. A Prefeitura de Piraquara consultou a Coordenação da Região Metropolitana que se limitou a dar indicações de ordens técnicas, sobre exigências necessárias (8recursos hídricos, vias de acesso, etc.) de princípio aceitas pelo grupo multinacional. xxx Adquirida a área, contratada a firma Lindebergh/De Mari que fará a obra, o gigantismo do centro comercial começa, naturalmente, a provocar especulações, críticas e mesmo temor: inicialmente serão 50 mil metros, com lojas (grandes e pequenas), galerias, supermercados, três restaurantes (um dos quais de nível internacional), um grande cinema, play-grounds, estacionamento para 5 mil carros etc. Some-se a isso o poderio de um grupo multinacional, que fazendo compras maciças, diretamente junto às maiores fábricas, tem condições de impor preços abaixo da concorrência, uma multiplicidade de ofertas para se imaginar o natural susto do comércio estabelecido na cidade - e mesmo em toda a região. Outro aspecto: a exemplo do que ocorre na Europa e Estados Unidos, a construção de supercentros - comerciais fora dos centros das grandes cidades torna-se uma opção de programa-lazer, especialmente nos fins-de-semana. No Rio de Janeiro, o Carrefour, instalado na Barra da Tijuca, provou a validade desta estratégia, o mesmo repetindo-se em Salvador, com o grande centro shopping-center que, há 2 anos, é um programa a mais para a população - e que funciona já com dois cinemas e um movimento de milhões de cruzeiros diariamente. A estratégia de deslocar a população do centro da cidade à periferia, oferecendo possibilidades do consumo "do alfinete ao elefante" (como o grupo inglês Harrold's orgulha-se de anunciar) tem funcionado eficientemente em nossa sociedade de consumo. E o grupo C&A, ao se decidir a aplicar cerca de Cr$ 500 milhões no município de Piraquara, deve ter analisado, com os computadores da última geração, números que comprovam o retorno e rentabilidade de tal investimento no mínimo a médio prazo. xxx O grupo adquiriu 30 alqueires, dos quais uma área de 80 mil metros quadrados - em segunda etapa - estará construída e aproveitava. Paralelamente outros empreendimentos serão agilizados, inclusive um hotel de características internacionais - também destinado a suplantar todos os que existem em Curitiba. Empreendimentos de tal vulto provocarão, evidentemente um grande movimento na PR-415, que liga Curitiba a Piraquara, rodovia que somente foi asfaltada há poucos meses. Mas também neste aspecto houve previsão: a futura Contorno Leste, entre a BR-116/227, já em início de obras, com a contratação da firma Mendes Júnior (a segunda maior empreiteira do País) e que deverá ser concluída em 30 meses, passará a pequena distância da área adquirida pelo C&A . Um sistema de vias modernas, internas, asfaltadas e amplas, possibilitará nada menos que dois amplos caminhos para que a população chegue ao novo shopping center. xxx Ironicamente, este empreendimento imenso, de proporções difíceis de serem calculadas à primeira vista, se localizará em zona atualmente das mais pobres, terreno alagadiço em grande parte - e onde hoje se concentra população de baixíssima renda. Com exceção do autódromo - em situação nebulosa e há muito tempo paralisado, nada mais há na região que até hoje atraísse investidores. Há inclusive, próximo, o patrimônio da antiga companhia de cimento, falida nos anos 40 e até hoje abandonada - com muitas casas transformadas em semifavelas e fornos destruídos. De repente, tudo isto se transformará: a Contorno Leste vai dar acesso à região, proporcionado novos loteamentos, um empreendimento inicial de Cr$ 500 milhões criará uma verdadeira cidade comercial e Curitiba ganhará um novo eixo de desenvolvimento. Um tema não apenas para entusiasmo, mas para reflexões e mesmo preocupação dos homens que têm em suas mãos, a responsabilidade pelos destinos de nossa comunidade.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
4
18/10/1978

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