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Aramis

E os cubanos estão chegando com os seus curtas e longas

Desconhecido até agora no Brasil, o cinema cubano começa a chegar. Entre 6 a 11 de dezembro, a Cinemateca faz uma mostra de curtas e médias metragens - saboroso aperitivo para o lançamento do primeiro lote de longas-metragens previstos para 1987. Nos festivais de cinema de Gramado (RS) e Brasília, já foram exibidos, em mostras paralelas, alguns bons filmes cubanos. "Habanera", de Pastor Vega - diretor do ICAIC e do Festival de Havana, e um filme psicológico, que traz Daisy Granados num grande papel - diverso daquele que fez há 18 anos, em "Memórias do Subdesenvolvimento", de Thomas Gutierrez Allea - um momento hoje já clássico do cinema cubano. No I FestRio, um dos filmes mais elogiados foi a comédia "Se Permuta" e este ano Cuba concorre no III FestRio com "Plácido", de Sérgio Giral, apresentados na quarta-feira, dia 26 - num mesmo programa na qual participaram também os longas em competição de Portugal ("Duma Vez Por Todas", de Joaquim Leitão) e da URSS ("Com a Banda Pela Rua Central", de Pyptr Todorowsky). Uma das maiores preocupações de Nei Sroulevich, diretor-geral do Festival Internacional de Cinema, Televisão e Vídeo do Rio de Janeiro, desde sua primeira edição, há três anos, tem sido a do prestigiamento a produção cinematográfica do Terceiro Mundo. Só mesmo o festival de Havana - que por sinal inicia no próximo dia 3 de dezembro - é mais amplo no apoio a cinematografia dos países (ditos) subdesenvolvidos. Mas em compensação, o FestRio é uma mostra oficial - a sexta mais importante do mundo, enquanto o de Havana é (ainda) um festival livre, no qual as inscrições dos filmes participantes são autônomas. Se a maior parte dos filmes do terceiro mundo que participaram nas duas primeiras edições do FestRio não conseguiram entrar no mercado brasileiro, com os filmes cubanos está havendo uma tentativa de fazer com que a cinematografia da Ilha de Fidel não se restrinja ao estreito âmbito dos festivais internacionais. Após uma pequena amostragem já ter sido levada aos festivais de Gramado (em abril) e Brasília (novembro), onde foram exibidos três interessantes filmes cubanos - "Habanera", de Pastor Vega; "Os Pássaros Atiram de Espingarda" e "Memórias do Subdesenvolvimento", de Guilherme Allea - um ciclo de curtas e médias metragens chega a Curitiba na próxima semana (6 a 11 de dezembro), em promoção da Cinemateca. São três programas diferentes, cada um em dois dias de exibição, mostrando vários aspectos da realidade cubana, através da ótica de cineastas que se desenvolveram nos últimos 20 anos, graças a força que Fidel Castro deu ao cinema, ao ponto de a 24 de março de 1959, menos de três meses após ter assumido o poder, ter assinado seu primeiro decreto na área cultural [...] Cubano de Artes e Indústria Cinematográfica. OS PROGRAMAS O primeiro programa do ciclo do cinema cubano - nos dias 6 e 7, será formado por "Mow", 1965, 10 minutos de Santiago Alvares; "Pela Primeira Vez"; 1967, de Octavio Cortazar, 10'; "Sinparele", 1974, de Umberto Sollas, 30'; "Meu Irmão Fidel", 1977, de Santiago Alvares, 20' "Semeio Ventos em Minha Cidade", 1978, de Fernando Perez, 30'. O segundo programa (dias 8 e 9) será formado por "O Maior das Três bandeiras", 1968, de Santiago Alvares, 10'; "Uma Fotografia Percorre o Mundo", 1981, de Pedro Chaskel, 10'; "Omara", 1983, de Fernando Perez, 30'; "Quando Termina o Baile", 1984, de Geraldo Chijona, 10'; "Granada, O Declínio de Um Sonho", 1983, de Rogoberto Lopes, 20'. O terceiro programa (dias 10 e 11), será formado pelos seguintes filmes: "A História de Uma Batalha", 1983, de Octavio Gomes, 30'; "A Solidão dos Deuses", de Santiago Alvares, 40'; e "Mulher Diante do Espelho", 1985, de Marisol Trujilo, 20'. OS LONGAS O ciclo de curtas e médias metragens, que já chegam a Curitiba na próxima semana, é apenas um aperitivo para o lançamento dos longa-metragens, agrupados numa mostra que no Rio de Janeiro foi levada no cinema de arte Estação Botafogo, há alguns meses, com grande sucesso e a presença da maior atriz cubana, Daisy Granados, mulher do cineasta Pastor Vega, que dirige o Festival de Cinema de Havana. Até agora o único filme cubano exibido comercialmente em Curitiba foi "A Última Ceia", de Thomas Gutierrez Allea, 58 anos, a serem completados no próximo dia 11 (exibido no Groff, há quase 2 anos). Entretanto, o mais interessante dos filmes de Allea é "Memórias do Subdesenvolvimento", produzido em 1968 e que sintetiza, com força e paixão as influências que Allea recebeu do cinema documental e do cinema novo (especialmente Nelson Pereira dos Santos, Glauber e Ruy Guerra) e da Nouvelle Vague francesa. Um filme que aborda um intelectual pequeno-burguês que assiste, estupefato, ao triunfo da revolução castrista, em 1959, vê partir sua família - que prefere o exílio nos EUA - e passa entediado a analisar os acontecimentos que o cercam. Baseado na novela homônima de Edmundo Desnoes, com música de Leo Brower (um dos maiores violonistas do mundo), com um elenco em que se destaca Daisy Granados, "Memórias do Subdesenvolvimento" é um clássico do cinema cubano - e deverá ter lançamento comercial no Groff em 1987. Agora, simultaneamente a mostra de curtas e médias na Cinemateca, Francisco Alves dos Santos programou a reprise de "A Última Ceia" e está tentando trazer a Curitiba a crítica Silvia Oroz, autora de "Os Filmes Que Não Filmei", onde Allea dá um depoimento sobre sua obra (edição da Rocco, mesma coleção em que saiu outro livro-depoimento coordenado por Silvia: "Os Filmes Que Não Filmei - Cacá Diegues"). Se "Memórias do Subdesenvolvimento" é um filme dramático, com toques existencialistas - que inclusive entusiasmaram ao paulista Walter Hugo Khouri, 59 anos, ao assisti-lo em Brasília - grande parte da produção cinematográfica cubana é voltada ao humor, a crítica social, sempre, evidentemente, com uma visão otimista da nova sociedade socialista. Exemplo disto são "Se Permuta" - crônica leve sobre o problema habitacional em Cuba (e como uma mulher inteligente busca a solução), exibido no I FestRio e "Los Pájaros Tirandole a la Escopeta" crítica ao machismo, que com uma cópia cedida à Embrafilme, legendada em português, já foi levada nas mostras informativas do cinema latino-americano em Gramado e Brasília - e que, se espera, venham a ter exibições em Curitiba, juntamente com "Até Certo Ponto", outro filme dos mais elogiados. A comédia "Los Pájaros Tirandole a la Escopeta", foi o maior sucesso do cinema cubano, visto por 2,5 milhões de espectadores, ou seja, um quarto da população do país. UM POUCO DE HISTÓRIA Como escreveu Susana Schild, no "Jornal do Brasil", pode-se dizer que quando Fidel Castro criou o ICAIC, há 24 de março de 1959, nasceu o cinema cubano. A verdade é que antes ele não existia e tampouco uma cinemateca para arquivar eventuais e raríssimos registros em celulóide. Muitos filmes foram feitos em Cuba - mas eram produções argentinas, mexicanas, americanas que utilizavam a paisagem exótica para suas tramas. Involuntariamente, formaram técnicos em som, iluminação, fotografia, que passaram à linha de frente após a Revolução. De 1959 a 1984, Cuba produziu 122 longas, 12 médias, 816 documentários, 192 desenhos animados e 1.164 noticiários. Com raríssimas exceções - "A Última Ceia", de Thomas Gutierrez Allea é o único caso, em Curitiba - esses filmes jamais passaram nos cinemas brasileiros. A razão é óbvia! Outro aspecto da sétima arte em Cuba é a eficiente estrutura de cinema móvel, que transporta os filmes nos lugares mais remotos do país. Segundo dados oficiais, desde 1962 mais de 291 milhões de espectadores assistiram a mais de dois milhões e meio de projeções. Aliás, o curta-metragem "Pela Primeira Vez", de Octavio Cortazar - que faz parte do ciclo promovido pela Cinemateca (sessões dos dias 6 e 7), mostra este projeto - que, numa escala bem reduzida e dentro do âmbito municipal, vem sendo desenvolvida em Curitiba, pela própria Fundação Cultural, através do "Cinema nos Bairros" - que já levou mais de 100 filmes à periferia (circos, clubes, associações comunitárias etc.) nestes últimos dois anos. INFRA-ESTRUTURA Outras informações sobre o cinema cubano, trazidas por Lola Calvino, quando esteve no Rio, há alguns meses: desde o ano passado, o ICAIC deixou de ser o patrocinado pelo Estado, para buscar vida autônoma. Atualmente tem uma produção anual de 12 longas de ficção, 54 curtas, um noticiário semanal e de seis a oito desenhos animados. Só Havana tem cerca de 100 salas de exibição (ingresso ao preço máximo de um peso), nos quais a programação é diversificada. Cuba deve exibir uma média de 200 títulos por ano, divididos em cotas equivalentes, entre países capitalistas europeus, socialistas e da América Latina. No ano passado ali foram lançados "Pra Frente Brasil", "Memórias do Cárcere", "Inocência", "Sargento Getúlio" e "Patriamada". Os cubanos gostaram tanto de "Bar Esperança", que em homenagem a Hugo Carvana, deram o nome do filme ao restaurante do ICAIC. Há cerca de 30 diretores em Cuba - país sem escola de cinema, formados na prática. E esta diversificação faz com que surjam cineastas de várias tendências - desde o sofisticado Pastor Vega - que em seu último filme, "Habanera", mostra os conflitos de um psiquiatra ao identificar em sua cliente (interpretada pela brasileira Márcia Barreto, ex-esposa do diretor Bruno Barreto) a possível amante de seu marido. A abertura de relações oficiais entre o Brasil e Cuba vai intensificar o conhecimento do cinema deste país - desconhecido por 27 anos - e hoje cada vez mais próximo em termos econômicos e culturais. O cineastas Orlando Senna ("Iracema", "Os Muckers"), que integrou o júri do Festival de Cinema de Brasília, já há algum tempo vem trabalhando com o documentarista Santiago Alvarez (realizador da maioria dos filmes a serem apresentados na Cinemateca) no Projeto Brás-Cuba. Sena filmou sua visão de Cuba e Alvarez faz o mesmo no Brasil. Nei Sroulevich, diretor do Fest-Rio, através de sua distribuidora Caribe, está trazendo os principais longa-metragens para distribuição comercial enquanto que Walter Salles Jr., talvez adiando o projetado filme sobre o assassinato de Zuzu Angel, está em fase de planejamento de uma co-produção Brasil-Cuba, com o filme "El Acoso", com base em romance de Alejo Carpentier. LEGENDA FOTO 1 - "Los Pájaros Tirandole a la Escopeta" a comédia de maior sucesso em Cuba. LEGENDA FOTO 2 - Ely Meris, em "Habanera", o último filme de Pastor Vega.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
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11
29/11/1986

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