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Aramis

Os Fredericos e os seus documentários

Enquanto o cumprimento da resolução que obriga todas as sessões de filmes estrangeiros em cinemas das cidades com mais de 200 mil habitantes exibirem curta-metragens nacionais está ainda capengando em sua aplicação - os realizadores de curtas (e médias) não desistem de seus projetos. Reunida no Rio de Janeiro, uma comissão designada pela EMBRAFILME para analisar projetos examinou mais de 100 projetos em busca de patrocínios. Dos aprovados, apenas um cineasta do Paraná: Frederico Fullgraf. Alemão de nascimento, infância e adolescência em Curitiba, aqui retornando há alguns anos - quando realizou documentários como "Quarup, Adeus Sete Quedas", "Expropriado" e "DDA - Dose Diária Aceitável / O Veneno Nosso de Cada Dia", Frederico hoje reside no Rio, tentando há quase um ano viabilizar a produção de seu primeiro longa-metragem, "Alemão Batata", sobre a imigração alemã no Sul do Brasil. Enquanto não consegue levantar os milhares de dólares necessários a esta produção, Frederico não pára, e assim propõe fazer um documentário, abordando um tema que conhece em profundidade - e já desenvolvido em inúmeros artigos e dois livros, inéditos: a questão nuclear brasileira. xxx Entre os eventos paralelos da I Mostra Latino-Americana de Cinema (Curitiba, 4 a 10 de outubro de 1987), está previsto um ciclo de curtas (e talvez médias) metragens com blocos temáticos, trazendo filmes recentíssimos e que abordam várias questões relacionadas a realidade brasileira. Um deles, será "O Mundo a Seus Pés", de Carlos Frederico, levado ao recente III Rio-Cine Festival, no Rio de Janeiro - provocando polêmicas e debates pela temática abordada - a questão dos meios de comunicação - e que mesmo não tendo obtido premiações foi dos mais discutidos. Especialmente agora, quando a questão da obrigatoriedade (ou não) do diploma de jornalismo entra na ordem do dia com o debate Constitucional. O realizador de "O Mundo a Seus Pés", Carlos Frederico, diz que "o meu filme fala dos dias de hoje, dos meios de comunicação, do que exige aqui e agora - o que é, aliás, um "prato feito" para estudantes de comunicação e áreas afins, inclusive profissionais. Sendo uma comédia sarcástica é muitas vezes hilariante; ou seja, não é um filme chato, longe disto". Justamente por tocar em pontos que Carlos Frederico considera "bastante graves, como a televisão, a política do cinema, a política propriamente dita, a novela, os comerciais, a notícia, suas deformações, o público, etc.", o filme deveria, no entendimento de seu autor, ter merecido maior consideração por parte do júri, o que o fez distribuir uma carta aberta à imprensa - e da qual há alguns pontos interessantes a serem abordados, especialmente considerando sua próxima apresentação em Curitiba. - "Ao (fingir) ignorar o meu filme em meio ao acintoso festival de prêmios, o júri não apenas manifestou a sua opinião, mas, sobretudo, cometeu um ato de censura cultural contra uma obra ousada, instigante e provocadora, que os aturdiu por sua própria atualidade. De fato, o filme sofreu uma censura estética, política, ideológica, embrafílmica e televisiva, porque satiriza com mordacidade certos valores estabelecidos - a televisão, o cinemão, a cultura, a novela, a notícia - que dizem respeito, direta ou indiretamente, a todos os membros do júri, alguns até muito comprometidos". Produção independente, realizado basicamente em vídeo, com um nome conhecido no elenco - Isabella - "O Mundo a Seus Pés" foi prejudicado, segundo seu autor, "porque fere também os conceitos estéticos de muita gente, por ser um vídeo filmado. Mas o é propositada e assumidamente, além de realizado com um rigor cinematográfico que muito filme de grande produção não tem. E, o que é mais importante, sendo na sua forma de filme dentro do vídeo dentro do filme, perfeitamente lógico do ponto de vista dramático, já que a sua proposta é a de colocar o espectador de cinema criticamente diante daquilo que ele vê todo o dia: a televisão, o jornalismo, os comerciais, a novela nossa de cada dia, o Brasil, o mundo, e você via tevê". Uma das funções do realizador de curtas e média-metragens é justamente propor temas para novas discussões, e isto é o que Carlos Frederico faz neste seu "O Mundo a Seus Pés". Sem modéstia, afirma: - "Cometi um ovo de Colombo imperdoável! Pratiquei um filme novo, rigorosamente moderno, não catalogado e que pegou de surpresa as cabeças bem pensantes, acostumadas ao padrão fílmico habitual. Elas pretenderam negar o filme, ignorando-o. No entanto, desafio a que se esqueçam dele, se puderem. Daqui a dez anos ainda se lembrarão das cenas, e frases, e piadas, sempre que, por qualquer razão, vierem a ouvir falar em "O Mundo a Seus Pés". Gostaria de saber de quantos outros filmes ainda se lembrarão dentro de dois meses?"
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
8
20/09/1987

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