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Aramis

Os melhores filmes a que ninguém assiste

Felizmente existem as excelentes surpresas. Pode-se dizer que a cada ano, quando menos se espera, aparece uma jóia cinematográfica. Geralmente, é um filme modesto, sem nomes famosos no elenco, quase sempre realizado por um diretor estreante ou desconhecido. Produções modestíssimas, muitas vezes independentes, chegam ao circuito comercial por verdadeiro milagre e suas exibições ocorrem por acaso, sem qualquer promoção. Muitas vezes, alías, são exibidas antes em Curitiba e outras cidade consideradas "do interior", antes de chegar ao eixo Rio/São Paulo. E lá mesmo, com uma ativíssima e profissionalmente competente crítica cinematográfica diária chegam a passar despercebidas, só sendo descobertas tempos depois. Algumas vezes estes filmes transformam-se em cult movies e passam a ser reprisados em cine-clubes, cinemas de arte, sessões da meia-noite, etc. Infelizmente, outros acabam tendo suas cópias incineradas após 5 anos em que o certificado da Censura valeu e nunca mais voltam às telas. (Talvez, em algum pacotão de filmes para a televisão reapareçam um dia no vídeo). Aliás, cópia em vídeo, muito raro: a imbecilidade dos locadores unida ao consumismo sem informação dos que procuram avidamente alugar fitas como quem vai buscar cerveja em supermercado, jamais faria com que um filme como "Sexy & Marginal" (Boxcar Bertha), 72, o segundo longa-metragem de Martin Scorcese (e, talvez o seu melhor filme até "Depois das Horas", 86) fosse encontrado numa locadora. Mas isto é outra questão! O comentário vem a propósito do filme em exibição (se é que continua, haja visto o fracasso de público) no Cinema I, "Deserto em Flor". Acho que nem a própria Columbia Pictures tem consciência da beleza, sensibilidade e importância desta produção b, dirigida por um diretor (estreante ou, ao menos, só agora tendo um filme no circuito) chamado Eugene Corr e que apesar de dois nomes relativamente famosos no elenco - Jon Voight (que o inglês John Schlesinger lançou há 18 anos em "Perdidos na Noite"/ "Midnight Cowboy") e Jobeth Williams (a mãe da família visitada pelo "E.T.", no filme de Spielberg) - foi lançado sem qualquer promoção. Mesmo nos Estados Unidos, há filmes excelentes, de longe melhores dos que os que acabam nominados ao Oscar ou levados a festivais, que ficam totalmente esquecidos. Aliás, é impressionante o que o marketing da premiação faz por um filme: o mesmo público que há semanas lota as sessões de "Pelotão" (agora no Ritz), por sinal um importante filme, seria incapaz de dar a mínima atenção a um documentário, tão corajoso e importante quanto o filme de Oliver Stone, realizado há 13 anos sobre o mesmo tema - "Corações e Mentes"("Hearts and Minds", de Bert Schroeder), por sinal também premiado com um Oscar (mas em sua categoria). E os intelectualizados de plantão, que se deslumbram com o hermetismo de "O Sacrifício", o frio e cerebral filme-testamento que o soviético Andrei Tarkoviczj realizou entre 1985/86, na Suécia, e que ganhou notoriedade por sua premiação em Cannes, no ano passado - (o diretor morreria em Paris, a 30 de dezembro último), será que terão sensibilidade e suficiente senso crítico para entenderem um outro tipo de visão do mundo - também partindo do núcleo familiar - como o que propõe Corr em "Desert Bloom"?
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
17
19/05/1987

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