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Aramis

Os milhões de dólares de um projeto internacional

São bem mais profundos os interesses que envolvem a questão Chico Mendes do que uma aparente briga familiar, envolvendo duas mulheres que com ele viveram (e tiveram filhos). Também ao lado efervescente da questão política, no qual se cruzam acusações de líderes do PT, religiosos da Pastoral da Terra e UDR - há o envolvimento de milhões de dólares que poderão render a exploração da vida e morte do líder ambientalista que filmes, vídeos, livros e outros produtos de consumo da indústria cultural-ecológica. A vida da naturalista americana Dian Fossey (1940-1984) levou 3 anos para chegar as telas, resultando numa super produção, "Na Montanha dos Gorilas" (Gorilas in the Mist, 1988, de Michal Apted), que acabou valendo a atriz Sigourney Weaver indicação ao Oscar de melhor atriz neste ano. A saga de um idealista engenheiro florestal Búlgaro, Vassil Popov que como Chico e Dian Fossey, também morreu assassinado (em 1912), permanecendo até hoje o crime sem punição dos autores motivou um admirável curta-metragem do cineasta Andrei Kolev, apresentado no VI Fest Rio-Fortaleza, conforme aqui divulgamos (edição de ALMANAQUE, 3/12/89). Portanto é mais do que natural que se em vida, Chico Mendes já era uma personalidade fascinante - em sua luta ambientalista, vivendo no "umbigo ecológico do mundo" (na definição de seu amigo Edilson Martins jornalista e videomaker, que realizou o especial "O Povo da Floresta" apresentado no último dia 21 na Rede Manchete com exceção do Paraná), se transformasse, após seu assassinato às vésperas do Natal, num personagem capaz de justificar todo o empenho da poderosa indústria cinematográfica para explorá-lo em imagens vivas. Das 15 propostas nacionais e internacionais que chegaram em poucas semanas a Fundação Chico Mendes, seis foram as que mereceram análise final; representando interesses de produtoras (Warner), instituições ambientalistas (Better World Society), realizadores estrangeiros (Robert Redford e Costa Gravas) e brasileiros como Luis Carlos Barreto e I. N. Filmes, que, estranhamente, apesar de ter o curriculum menos expressivo, (até hoje nunca realizou nenhum filme importante) foi escolhido. Tão logo anunciado que Joffre Rodrigues, como presidente da J. N. Filmes, havia assinado o contrato com Ilzamara Mendes, a imprensa nacional - além de criticar duramente tal escolha - levantou também informações de que eu estaria associado a dois golden boys da indústria cinematográfica americana, Peter Guber, 47 anos e Jon Peters, 44, responsáveis como produtores de sucesso (público e crítica) por filmes como "Rain Man" (1988 de Barry Levinson ) e "Batman" (1989) - duas das maiores bilheterias dos últimos dois anos. Acontece que quando a multinacional Sony adquiriu a Colúmbia Pictures, há poucos meses, colocou como uma das exigências que a produtora de Guber/Peters, fosse incorporada nas transações para que eles assumissem a direção e vários projetos. Tendo, entretanto, contratos com a Warner, Peters Productions (que recebeu US$ 200 milhões de dólares para mudar de casa) motivou um processo da Warner contra a Sony, por ter aliado seus contratos e cujo valor atingiria a fantástica soma de US$ 3,4 bilhões de indenização. Em 22 de outubro a "The New York Times Magazine", revista dominical pelo maior jornal novaiorquino, dedicava matéria de capa aos produtores Peters e Guber, falando de seus projetos e relatando a pendência judicial em que estavam envolvidos. No dia 27 de novembro último, outra publicação americana, "Time", trouxe a informação sobre o acordo a que chegaram os super-tycoons da Sony e Warner: uma cifra entre US$ 400 a US$ 600 milhões de dólares (bem abaixo, portanto, do valor inicialmente pretendido) e os direitos de meia centena de projetos que os dois produtores desenvolviam permanecem na Warner, embora a dupla tenha se transferido para a Columbia. Entre os projetos, a filmagem de "Fogueira de Vaidades" de Tom Wolfe (possível direção de Brian De Palma), "Batman II" (que, independentemente, acredita-se seria o de maior lucratividade) e o filme sobre Chico Mendes, conforme registro do "New York Times" (que, consta, teria obtido um "advanced" de US$ 2,5 milhões). Projeto com orçamento ao redor de mais de US$ 40 milhões superstars (falou-se em Dustim Hoffman, Oscar por "Rain Man", para viver Chico Mendes), o filme em torno do seringalista brasileiro tornou-se assim um totem de bilhões de dólares. Mesmo que o projeto se arraste por anos - o que é muitas vezes normal na indústria do entretenimento - a questão tem muitas implicações. Dizendo-se confortável em sua posição de advogada de Eunice e Angela Mendes, "sem aquiescência das mesmas nada que envolva o nome e imagem de Chico Mendes poderá ser feito", a advogada Zelia Gianello Oliveira, afirma: "No final, eu quero ser apenas a advogada que derrotou os produtores Gubert &Peters. E também a Warner Communications...".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
27/12/1989

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