Os pensamentos azuis de um gaúcho criativo
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 11 de junho de 1988
Como Mário Quintana - por sinal, ao lado de Carlos Nejar, sua maior admiração na poesia gaúcha - Luís Coronel sabe extrair das pequenas frases, nas curtas linhas, o equilíbrio da poesia e do humor da vida. Em um de seus belos livros, "Os Pensamentos Azuis" (Editora Garatuja, 1978), ilustrado por Danubilio Vilamil Gonçalves, como ele um bageano de talento, reuniu algumas jóias do lirismo e da constatação dos homens, das coisas e da vida. Eis alguns exemplos.
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De óculos escuros, você é um puro, mas a menina dos olhos brinca de amarelinhas só de ver passar essas lindas menininhas.
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Eis duas contradições de verão que me abismam da cabeça aos pés: a miséria do homem que vende a sorte grande e o banho de suor do vendedor de sorvetes e picolés.
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Quando as mulheres não querem, até o diabo fica louco. Mas quando as mulheres decidem, podem os deuses muito pouco.
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As estrelas são órgãos de milho, disse a galinha laureada. Galo sol, glutão, comeu todas de madrugada.
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As horas pulam que nem macacos. E os dias disparam feito lebres. Os relógios são bongôs onde um deus estrubulenga batuca, pra que a eternidade se requebre.
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Os críticos vivem em situação crítica. Falta-lhes apoio poético que os faça ver o mundo mais rico. Se Deus desse aos críticos o encargo de fazer laranjas, as singelas laranjas teriam vinte e sete bicos.
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Em "Invernadas", uma das partes dos "Pensamentos Azuis", algumas frases que se ajustam como uma luva para estes dias de frio.
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A cidade está dormindo, não despertam sua atenção. A cidade está encoberta com as colchas da cerração (...) Cada um de nós é uma orquestra. De fato basta uma simples gripe e os espirros batem pratos.
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Os mais velhos falam muito em geada e casamentos. Aliás, está definido: com o tempo, velho vira barômetro ou cupido.
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Que as horas têm sessenta minutos e os minutos sessenta segundos é uma ficção exaurida, gasta. As horas felizes zarpam. As horas de infortúnio se arrastam.
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O homem vestiu meias de lã, hora de chamar o táxi, em vez de gritar, baliu.
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Dizendo que a leitura é uma questão de "organizar a memória", Luís Coronel parece ter um arquivo computadorizado na cabeça - com citações, versos - de autores que admira, ou suas próprias frases. Após sua palestra, jantando com alguns amigos no Baviera, entre chopes e uma pizza, juntou novas definições que poderia acrescer aos seus "Pensamentos Azuis" - disse, na hora, um improviso, que melhor do que qualquer outro texto, encerra estas anotações:
SE VOCÊ DER INPS PARA A ALMA E O MONTEPIO PARA O CORAÇÃO, TU TENS QUE PROCURAR UMA CLÍNICA GERIÁTRICA.
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