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Aramis

Os pensamentos azuis de um gaúcho criativo

Como Mário Quintana - por sinal, ao lado de Carlos Nejar, sua maior admiração na poesia gaúcha - Luís Coronel sabe extrair das pequenas frases, nas curtas linhas, o equilíbrio da poesia e do humor da vida. Em um de seus belos livros, "Os Pensamentos Azuis" (Editora Garatuja, 1978), ilustrado por Danubilio Vilamil Gonçalves, como ele um bageano de talento, reuniu algumas jóias do lirismo e da constatação dos homens, das coisas e da vida. Eis alguns exemplos. xxx De óculos escuros, você é um puro, mas a menina dos olhos brinca de amarelinhas só de ver passar essas lindas menininhas. xxx Eis duas contradições de verão que me abismam da cabeça aos pés: a miséria do homem que vende a sorte grande e o banho de suor do vendedor de sorvetes e picolés. xxx Quando as mulheres não querem, até o diabo fica louco. Mas quando as mulheres decidem, podem os deuses muito pouco. xxx As estrelas são órgãos de milho, disse a galinha laureada. Galo sol, glutão, comeu todas de madrugada. xxx As horas pulam que nem macacos. E os dias disparam feito lebres. Os relógios são bongôs onde um deus estrubulenga batuca, pra que a eternidade se requebre. xxx Os críticos vivem em situação crítica. Falta-lhes apoio poético que os faça ver o mundo mais rico. Se Deus desse aos críticos o encargo de fazer laranjas, as singelas laranjas teriam vinte e sete bicos. xxx Em "Invernadas", uma das partes dos "Pensamentos Azuis", algumas frases que se ajustam como uma luva para estes dias de frio. xxx A cidade está dormindo, não despertam sua atenção. A cidade está encoberta com as colchas da cerração (...) Cada um de nós é uma orquestra. De fato basta uma simples gripe e os espirros batem pratos. xxx Os mais velhos falam muito em geada e casamentos. Aliás, está definido: com o tempo, velho vira barômetro ou cupido. xxx Que as horas têm sessenta minutos e os minutos sessenta segundos é uma ficção exaurida, gasta. As horas felizes zarpam. As horas de infortúnio se arrastam. xxx O homem vestiu meias de lã, hora de chamar o táxi, em vez de gritar, baliu. xxx Dizendo que a leitura é uma questão de "organizar a memória", Luís Coronel parece ter um arquivo computadorizado na cabeça - com citações, versos - de autores que admira, ou suas próprias frases. Após sua palestra, jantando com alguns amigos no Baviera, entre chopes e uma pizza, juntou novas definições que poderia acrescer aos seus "Pensamentos Azuis" - disse, na hora, um improviso, que melhor do que qualquer outro texto, encerra estas anotações: SE VOCÊ DER INPS PARA A ALMA E O MONTEPIO PARA O CORAÇÃO, TU TENS QUE PROCURAR UMA CLÍNICA GERIÁTRICA.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
11/06/1988

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