Login do usuário

Aramis

Os tempos nucleares e Fred, Gabeira e Norton

Frederico Fullgraf, jornalista, cineasta, ecologista, finalmente lança nas próximas semanas o livro sobre a questão nuclear, examinando desde os princípios nas negociações entre a República Federal da Alemanha e o Brasil até os últimos acidentes ocorridos no Exterior e mesmo em Goiânia. Há muitos anos que Frederico se preocupa com o assunto e paralelamente ao livro (editora Brasiliense) preparou um roteiro para um média-metragem, já aprovado pela Embrafilme e que começa a rodar dentro de algumas semanas. Nascido na Alemanha, mas vindo ainda criança para Curitiba, Frederico voltou aos 18 anos para Berlim, ali permanecendo por mais de dez anos. Formando-se em jornalismo, trabalhou para grandes emissoras de rádio e televisão, colaborou com importantes publicações e, sendo poliglota (fala cinco idiomas, perfeitamente), fez coberturas em várias partes do mundo. Com acesso a importantes e fidedignas fontes, começou a recolher elementos ligados a questão nuclear, possibilitando-lhe, desenvolver um dos mais completos livros a respeito - e que também deverá transmitir em imagens de seu média-metragem. Desde que realizou os eu primeiro curta-metragem no Brasil - "Quarup, Adeus Sete Quedas", há seis anos, documentado o fim das Sete Quedas, em Guaíra - e usando como texto apenas o poema de Carlos Drummond de Andrade, Frederico optou por um cinema ecológico, atual, corajoso e independente. Assim com o apoio de uma instituição religiosa alemã, fez o contundente "Expropriado", mostrando o triste êxodo dos agricultores expulsos de uma das mais férteis regiões do Paraná devido ao lago de Itaipu. Em "DDD - Dose Diária Aceitável / O Veneno Nosso de Cada Dia", denunciou os agrotóxicos, com dados tão sérios que uma multinacional alemã, citada no filme, tentou impedir sua projeção pela televisão alemã. xxx Enquanto a Brasiliense programou o livro de Fullgraf para as primeiras semanas de 1988, a Editora Guanabara encerrou 1987 editando "Goiânia. Rua 57 - O Nuclear na Terra do Sol", de Fernando Gabeira (89 páginas). Fullgraf e Gabeira são amigos de longas datas e integram o Partido Verde, pelo qual o autor de "O que É Isto, Companheiro? "foi candidato a governador nas últimas eleições. E, sua linguagem clara, resultado de seus anos de atuante profissional do "Jornal do Brasil", Gabeira faz um relato up to date do incidente nuclear na capital de Goiás, que acompanhou pessoalmente, em contato com técnicos nucleares, médicos e habitantes da cidade, como repórter que busca a informação de primeira mão. O incidente de Goiânia - denunciado a partir do dia 28 de setembro acarretou mortes, desencadeou problemas econômicos, despertou preconceitos e tornou dramaticamente incerto o destino de várias pessoas afetadas pela radiação. Mas, como denuncia Gabeira, acima de tudo revelou o despreparo das autoridades para lidar com o problema. Assim, neste contundente e atual "Goiânia. Rua 57 - O Nuclear na Terra do Sol", Gabeira questiona incisivamente o programa nuclear brasileiro, mostrando suas falhas e amargas conseqüências. Segundo Gabeira, a situação de Goiânia apresenta ainda muitos pontos obscuros. Assim, raciocina, é necessário que todos se informem melhor sobre a questão nuclear. - "No mundo inteiro está sendo radicalmente repensada e o mesmo tem de ser feito no Brasil". xxx Um curitibano que acompanhou de perto a tragédia de Goiânia foi o flautista e maestro Norton Morozowicz. Diretor artístico do Encontro Nacional de Pequenos e Grandes Artistas, que há três anos a Musika - Centro de Estudos, de sua amiga, a pianista Glacy Antunes de Oliveira, vem promovendo, o evento iria acontecer entre 20 a 29 de outubro. Dezenas de grandes instrumentistas e professores de música já estavam contratados para esta promoção, cujo conceito vem crescendo a cada ano. Com o problema provocado pela abertura da cápsula radioativa do Césio 137, todos os convidados declinaram do compromisso, temendo a radiação. Norton, numa atitude das mais profissionais, viajou para Goiânia e ali permaneceu, deixando, entretanto, os convidados da promoção livres para optarem pela desistência, "já que era uma questão pessoal de cada um". A única artista que havia assumido compromisso de comparecer e que não desistiu foi a bailarina Ana Maria Botafogo, do Rio de Janeiro. Num exemplo admirável de profissionalismo, Ana Maria - que há alguns anos residiu em Curitiba, sendo primeira bailarina do Ballet Guaíra - fez questão de ir e com alunas de dança de Goiânia apresentar nas noites de 20 a 21 um belo espetáculo. Se artisticamente e pessoalmente Ana Maria Botafogo já merecia toda administração a partir de sua coragem pessoal de fazer com que ao menos dois espetáculos acontecessem em Goiânia - no momento mais dramático já vivido por aquela cidade, sofrendo um esvaziamento total e inclusive preconceitos que até agora prosseguem - a tornaram credora da maior gratidão da cidade. A concessão do título de cidadania honorária de Goiânia, é o mínimo que as autoridades locais podem fazer. Embora apolítico, Norton Morozowicz, 40 anos, fez questão de estar presente nos momentos difíceis que sua amiga Glacy Antunes (com quem fez uma excursão artística pelos Estados Unidos, há um ano) enfrentou. Diz a respeito: - "Havia tensão e medo, é claro! Mas o perigo de fato inexistia fora da área contaminada. E fiz o que deveria ter feito: estar presente, com pessoas a quem admiro e que apoiam nossos projetos culturais". LEGENDA FOTO 1 - Gabeira: reportagem. LEGENDA FOTO 2 - Norton: solidariedade.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
12/01/1988

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br