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Aramis

Paraná ainda procura o seu canto nacional

A etapa final do festival de MPB "Todos os Cantos" - a partir do dia 8, no Guairão - coloca em questão, mais uma vez, o problema da música popular em nosso Estado. Realizado em oito etapas, com eliminatórias em diversas regiões do Estado, esta promoção da Secretaria da Cultura e do Esporte, nasceu de uma indagação do governador Ney Braga: "por que o Paraná ainda está ausente do panorama musical nacional?" Na próxima semana, nomes famosos serão acrescentados a vários outros - já que durante seis dias, o Guaíra estará totalmente ocupado com a promoção: nos três primeiros, a classificação das três músicas dos compositores de Curitiba e, de sexta-feira a domingo, a grande final. xxx Seria oportuno fazer um levantamento de quantos festivais de música popular foram realizados em Curitiba nos últimos 16 anos, desde que a partir da vitória de "Arrastão" (Vinícius/Edu Lobo), defendida por Elis Regina no Festival de MPB da extinta TV-Excelsior, em Guarujá, SP, se criou o modismo dos festivais. Nestes 16 anos, paralelamente aos festivais nacionais - que continuam a serem realizados, haja vista as promoções da Globo e da extinta Tupi, se multiplicaram manifestações regionais - nos âmbitos estudantis, profissionais e mesmo nos mais distantes municípios. O festival é uma abertura, teoricamente, para novos compositores mostrarem suas músicas - as quais, pretensiosamente, já as apresentam como "trabalho" numa preocupação profissional - mas que poucos conseguem atingir. Infelizmente, num balanço rigoroso e sem paternalismo, o resultado dos múltiplos festivais aqui realizados é melancólico. Não passam de dois ou três compactos, de circulação fechada e sem menor repercussão, o que restou de tantos festivais promovidos amadorísticamente. Mesmo alguns dos compositores premiados nestas mostras pálidas e modestas, acabaram esquecendo das músicas que ali defenderam e raros foram, os que tentaram uma carreira profissional. Para a maioria, não passou de uma festa, um evento marcante de uma época - sem compromissos ou preocupações maiores. Enquanto isto, o Paraná continuou - e continua ausente dos circuitos nacionais de MPB, enquanto os grupos do Nordeste primeiro os baianos, depois os pernambucanos, cearenses e até do Piauí e do Pará, conseguiram seus espaços muitos hoje consagrados nacionalmente. Do Rio Grande do Sul, pouco a pouco um movimento foi crescendo e já há pelo menos, uma dezena de nomes escalando o competitivo mercado - mas tantos os do Norte como dos Pampas, se fixaram no eixo Rio São Paulo, brigaram pelo seu espaço e, pouco a pouco, vão tentando encontrar sua posição. Com maior ou menor voltagem, tentam uma permanência numa área das mais ingratas e difíceis onde os gerentes de marketing e técnicos de vendas das gravadoras, influem mais do que os diretores artísticos do passado. Hoje, a música popular é um produto como uma nova marca de cigarro, um creme de beleza ou um supérfluo qualquer para o modismo do momento. Ou seja, para um trabalho realmente criativo, artístico existe uma dezena de opções exclusivamente comerciais. xxx O festival "Todos os Cantos", cuja responsabilidade é do letrista Heitor Gurgel do Amaral Valente, parceiro de César Costa Filho em duas dezenas de músicas já gravadas e buscando fazer sua carreira profissional, foi elaborado com bons propósitos. De princípio, a idéia de descentralizar as fases classificatórias, dando a compositores das várias regiões, oportunidade de concorrerem com suas músicas. Em cada uma das sete etapas preliminares (Pato Branco, Ponta Grossa, Cascavel, Antonina, Maringá, União da Vitória e Londrina), os concorrentes que não ficaram entre a três selecionadas, puderam voltar a disputar na etapa seguinte. Isto depois de uma pequena comissão fazer uma análise prévia do imenso "balaio", com as centenas de músicas inscritas em disputa de premiações ao redor do milhão de cruzeiros, distribuídos em várias categorias. Por sua própria característica, qualquer festival de MPB oferece riscos e campo para polêmicas. Afinal, existem dezenas de exemplos de músicas antológicas que foram desclassificadas em festivais da TV Record ("Eu e a Brisa", de Johnny Alf, em 1967, que só posteriormente será reconhecida) ao passo que tantas canções premiadas "desapareceram" rapidamente. Por mais critérios que tenha, uma comissão julgadora e os nomes que integram o júri escolhido por Heitor Valente para "Todos os Cantos" são dignos do maior respeito - sempre ocorrem queixas e reclamações. Independente dos resultados finais a serem conhecidos dentro de 10 dias, um ponto é fundamental: não basta as torcidas que, invariavelmente, se formarão em torno das finalistas e nem da divulgação momentânea dada ao evento. Também não adiantam os simpáticos elogios que alguns membros do júri tem feito as músicas até agora selecionadas insistindo que elas são "de melhor nível do que as do último MPB-80". Igualmente, a simples edição de um ou dois elepês com as finalistas já sendo acertada através de uma fábrica nacional, capaz de garantir distribuição das cópias em outros Estados - não será suficiente. O que é preciso - é indispensável - é fazer com que esta promoção oficial do governo do Estado, que contou com bons recursos e uma estrutura profissional, tenha um acompanhamento amplo, capaz de permitir aos autores e intérpretes das músicas premiadas, um passo profissional mais adiante, junto aos centros competitivos. Até agora, em alguns festivais locais, houve revelações de compositores(as) de talento, como a menina Rosy Grecca, que vem sendo exaurida numa produção incessante para peças de teatro, algumas inclusive, bastante pretensiosa. Inteligente, talentosa, Rosy permanece entretanto inédita em disco e restrita a um âmbito local, sem chance de ter seu trabalho apreciado de forma mais ampla. Paulinho Vitola e Marinho Galera, dois dos maiores talentos musicais do Paraná, uma obra ampla e que foi sintetizada em "Onze Cantos" (o melhor elepê já realizado no Paraná, na área da MPB), apesar de toda a experiência de marketing e vigor que possuem, não conseguiram sair do Estado. Inúmeros outros exemplos, poderiam serem lembrados, mas basta ficar nestes. De nada adiantara premiar autores de músicas que façam o público presente no Guaíra, na próxima semana, vibrar - e que agradem o distinto júri, se os seus autores não tiverem apoio realmente profissional para tentarem uma carreira difícil mas importante. E nisto um último aspecto deve ser ressaltado: também de nada adianta o paternalismo, esperar que o governo, com suas sempre gordas e generosas tetas, garanta a presença na parada de sucessos. Afora o talento e a disposição de vencer, há necessidade de muito trabalho, coragem e vontade para conseguir fazer com que o Paraná entre, afinal, no mapa musical brasileiro. Onde até hoje tem tido tímidas manchas, quase imperceptíveis - e que constituem uma crônica nostálgica de frustrações e o ocasiões perdidas - papo para outra ocasião.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
10
04/12/1980

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