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Aramis

Pensando o Brasil, foram 13 anos de bons projetos

Numa certa carta afetuosa e poética - bem dentro de seu estilo belíssimo de se comunicar - Hermínio Bello de Carvalho comunicou aos amigos de todo o Brasil o seu desligamento da Funarte. Independente do relatório amplo que demonstra o quanto realizou naquela Fundação - por sinal, agora com novo presidente (o compositor catarinense Edino Kruger substituiu ao professor Evandro Corrêa Lima), a carta da HBC já é uma demonstração de como se pode fazer em favor da cultura, independente de limitações financeiras e os torniquetes da burocracia, quando há disposição, inteligência e, principalmente, afastamento do jogo sujo da política - que prejudica, infelizmente, a maioria das instituições da área cultural no Brasil. xxx Vamos a carta de Hermínio! "Costumo dizer que na Funarte investi num processo que era comum na minha vida de assalariado em empresa privada: passei a ganhar para fazer aquilo que antes pagava do meu bolso... Animador ou agitador cultural, como queiram, é chegada a hora de desvincular de uma Instituição que me deu a alegria de acolher projetos que nasceram, afinal, das lições que apreendi com discípulos / amigos / contemporâneos de Mário de Andrade, meu Guru; professor Mozart Araújo, Lúcio Rangel, Carlos Drummond de Andrade, professora Oneyda Alvarenga, Manuel Bandeira, Francisco Mignone - a lista definitivamente não é pequena. Estão aí os livros, discos e partituras dos projetos Lúcio Rangel, Almirante, Ayrton Barbosa, Radamés Gnatalli e programas de difusão que nasceram do Projeto Pixinguinha, tudo isso sob a ótica do binômio "Registro & Multiplicação", abordando vertentes das mais diversas de áreas geralmente desprotegidas como a pesquisa, a documentação, a formação de recursos humanos. A linha de eventos, que tangenciou as atividades das Salas Funarte de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, voltou-se toda ela para a memória nacional através da celebração de figuras e episódios importantes da nossa cultura. Dentro das restrições orçamentárias seríssimas, com um Ministério da Cultura que abocanha tão somente 0,18% do orçamento da União, fomos à iniciativa privada em busca de recursos. Nossos programas, desenvolvidos por equipes competentes e dedicadas, conseguiram sensibilizar boa parte de empresas de médio e grande porte, bem antes do advento da Lei Sarney. Quero agradecer parcerias que foram sedimentadas ao longo de todos esses 13 (treze) anos em que militei profissionalmente na área da animação cultural. O amor pela cultura é vício dos melhores, que a gente não perde ao fechar uma porta. Agradecer todas as deferências que sempre recebi é tarefa dificílima, que meu coração não saberá cumprir como deveria fazê-lo. Acertou-se aqui, errou-se um tantinho mais adiante, mas se trabalhou sempre com respeito ao dinheiro do contribuinte que é, afinal, o nosso empregador. Usamos e abusamos da palavra alternativa, porque buscamos atuar nas áreas onde o mercado se fez preguiçoso e desatento à causa cultural. Procuramos sempre valorizar as manifestações de um Brasil espoliado, massacrado e aviltado e agredido por todo um maniqueísta processo de aniquilamento de suas expressões mais legítimas - e não podemos nos queixar que tenhamos sido incompreendidos. Projetos assemelhados que criamos nasceram no rastro de nossas idéias e pensamentos. Agimos e interagimos de forma alternativa, com parcerias honrosas. Meu trabalho de animador cultural nasceu bem antes de ingressar nesta Casa que tanto respeito, e não se extinguirá com a minha saída. Apesar de muitos e tantos pesares e lutas e conflitos, só valeu a pena. Guardamos luminosa esperança por uma nação do que essa que aí esta pisoteada. Mãe Quelé e São Pixinguinha, afinal, são brasileiros!".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
09/07/1989

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